São Paulo, quarta-feira, 14 de dezembro de 2005

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Temperatura na OMC sobe com batalha agrícola

DO ENVIADO ESPECIAL A HONG KONG

A holandesa Mariann Fischer Boel, a comissária agrícola da União Européia (espécie de ministra), reclama: "É monótono e desapontador ouvir continuamente críticas à proposta européia [para a redução do protecionismo agrícola]".
De fato, não passa um dia sem que a grande maioria dos países-membros da OMC (agora, são 150) ataque os europeus pelas barreiras que impõem aos produtos agrícolas de seus parceiros.
Críticas, aliás, que surgem na própria Europa. "A Política Agrícola Comum da União Européia permanece como emblema da ineficiência e da iniqüidade, apesar de substanciais reformas já feitas", afirma, por exemplo, o Centro para a Reforma Européia, instituição de pesquisa com sede em Londres, em documento para a reunião de Hong Kong.
Reforça, no lado em desenvolvimento do mundo, o texto aprovado ontem pelo G20, o grupo de países liderado por Brasil e Índia que cobra a abertura agrícola do lado rico do planeta: "Uma rodada de desenvolvimento [nome oficial das negociações em curso] requer a remoção das distorções nas regras agrícolas internacionais. A maior distorção estrutural no comércio internacional ocorre na agricultura, por meio da combinação de altas tarifas [de importação], subsídios domésticos e para a exportação, que protegem produtores ineficientes nos países desenvolvidos".
A comissária reage: "A proposta européia é ousada e, ao contrário do que dizem, permite real acesso ao mercado europeu".
Cita até o exemplo da carne: se implementada a proposta de corte tarifário (39% na média), haverá aumento para 1,3 milhão de toneladas, contra as 500 mil hoje compradas no exterior.
Flávio Damico, o especialista brasileiro na negociação agrícola, contesta. Ele diz que os europeus se comprometeram, na rodada anterior de liberalização, a importar o equivalente a 5% de seu consumo doméstico, mas estão comprando apenas de 2% a 3%. Mesmo com a nova oferta, o aumento seria insuficiente para respeitar o compromisso anterior, quanto mais para assumir nova abertura.
A batalha agrícola é a origem da paralisia na chamada Rodada Doha de Desenvolvimento.
Já se sabe que, em Hong Kong, ao contrário da expectativa inicial, não se estabelecerão as chamadas modalidades. Trata-se, na área agrícola, de definições essenciais, como a fórmula de redução tarifária; tratamento para os produtos sensíveis; funcionamento das salvaguardas e produtos especiais para os países em desenvolvimento; definições claras sobre o corte global no teto dos subsídios domésticos distorcivos; fixação de data para eliminação dos subsídios à exportação; práticas distorcivas usadas por empresas estatais de comércio; e o abuso dos programas de ajuda alimentar.
O Brasil, o grande beneficiário de uma liberalização do comércio agrícola, já se conformou em obter, em Hong Kong, apenas uma data para o fim dos subsídios à exportação.
Graças a eles, europeus e norte-americanos competem deslealmente com a produção brasileira em terceiros mercados. (CR)


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