UOL


São Paulo, quinta-feira, 15 de maio de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OPINIÃO ECONÔMICA

Hora de reduzir os juros

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

Nas últimas semanas, configurou-se um quadro que permite iniciar a redução da taxa básica de juros.
A queda da inflação está sendo registrada em todos os principais índices de preços. Se a taxa nominal de juro for mantida em 26,5%, haverá aumento dos juros reais, algo que não é aconselhável para uma economia estagnada, com desemprego elevado e submetida a um política fiscal restritiva. Além disso, a valorização cambial já foi longe demais, em grande medida por causa da política de juros, e ameaça solapar o recém-iniciado ajustamento das contas externas.
As taxas de juro brasileiras são, por qualquer parâmetro, cronicamente anormais. Estamos tão acostumados aos juros altos que às vezes perdemos de vista o quanto o Brasil se distancia das práticas internacionais nesse terreno. Relativamente aos países desenvolvidos, o nosso diferencial de juros é monumental. Nas três principais economias do mundo, as taxas de curto prazo são hoje negativas (Estados Unidos) ou levemente positivas (área do euro e Japão). As demais economias desenvolvidas também trabalham com juros modestos.
Nos países em desenvolvimento, os juros tendem a ser mais altos. Mas poucos praticam taxas de juro extravagantes como as do Brasil. Em vários países "emergentes", as taxas reais de curto prazo são negativas (Argentina e Chile, por exemplo) ou moderadas (Índia, Malásia, Coréia do Sul, Taiwan, Rússia e México, por exemplo). Considerados os principais "mercados emergentes", só a Turquia registra atualmente juros nominais superiores aos nossos.
Compreende-se perfeitamente a preocupação do novo governo brasileiro com a inflação. O risco de descontrole inflacionário era inegavelmente muito grande em fins de 2002 e no início de 2003. Não há dúvida também de que a combinação atual de juros altos e dólar em queda favorece a redução mais rápida das taxas de inflação.
Mas, em matéria de inflação, o pior já passou. Por outro lado, a insistência em manter a taxa de juro no nível atual cobrará um preço cada vez maior em termos de efeitos negativos sobre o PIB, o nível de emprego e o balanço de pagamentos em conta corrente.
A valorização cambial induzida pelo enorme diferencial entre os juros internos e externos prejudica o crescimento econômico e o nível de emprego de duas maneiras. De forma direta, ao deprimir a atividade e o emprego nos setores exportadores e nos setores que concorrem com importações de bens e serviços. De forma indireta, ao desfazer, pelo menos em parte, o ótimo resultado alcançado em termos de geração de saldos comerciais e diminuição do desequilíbrio do balanço de pagamentos em conta corrente desde meados de 2002.
Evidentemente, a diminuição dos juros terá que ser gradativa. Para colocá-los em níveis mais civilizados, de forma sustentada, será preciso mudar o foco da política econômica e orientá-la sistematicamente para a remoção da principal restrição macroeconômica: a vulnerabilidade das contas externas.
Remover a restrição externa significa não apenas completar o ajustamento do balanço de pagamentos em conta corrente mas também introduzir controles seletivos sobre os movimentos de capital e reforçar as reservas internacionais do país.
Tarefa para uma "fase dois" da política econômica do novo governo.


Paulo Nogueira Batista Jr., 48, economista, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP e professor da FGV- EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail - pnbjr@attglobal.net


Texto Anterior: Lula pedirá avanço nas propostas
Próximo Texto: Comunicações: EUA devem flexibilizar regra da mídia
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.