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ARTIGO
Crescimento sustentado: sem horizonte?
Nossos maiores problemas são o "custo Brasil", o custo do trabalho, a elevada carga tributária e a nossa dificuldade em fechar acordos comerciais favoráveis
MARIA CRISTINA MENDONÇA DE BARROS
TEREZA MARIA FERNANDEZ
DIAS DA SILVA
O DESEMPENHO positivo da economia mundial vem surpreendendo a maioria dos analistas. As
revisões de crescimento, quando acontecem, dão-se para cima. Os Estados Unidos acabaram de divulgar o resultado do
PIB (Produto Interno Bruto)
do primeiro trimestre, apontando para o crescimento próximo de 5% ao ano. A maioria
dos países asiáticos cresce fortemente, liderados pela economia chinesa, que deve superar
mais uma vez os 10% ao ano. Na
América Latina, o crescimento
esperado para 2006 é da ordem
de 4,3%. O Brasil é um dos países de menor crescimento esperado, de 3,5% no ano, confirmando a tendência recente de
crescermos abaixo da média
mundial.
Por que isso? Muito se tem
falado sobre a superação de
nossa restrição externa ao crescimento, pelo desempenho da
balança comercial e pela importante diminuição do nosso
endividamento. De fato, a dependência brasileira de financiamento internacional diminuiu expressivamente, permitindo a valorização de "rating"
e a diminuição do "spread" de
captação de papéis brasileiros
-públicos e privados. No entanto todo esse avanço no setor
externo brasileiro não tem sido
suficiente para atrair investimentos que nos garantam o tão
desejado crescimento sustentado.
Na verdade, a melhoria do setor externo, somada à atração
dos juros praticados domesticamente, teve como conseqüência uma mudança no valor
relativo do nosso câmbio que
tem provocado alterações importantes na gestão da maioria
das empresas e afetado as decisões de investimento. Dito de
outra forma: além de mudar,
por si só, as condições de competitividade da nossa economia, a valorização do real desnuda os problemas estruturais
que impedem o crescimento
sustentado e que, somados à
competição chinesa, obriga
nossas indústrias a um ajuste
profundo.
Quais são esses problemas
estruturais? São o chamado
"custo Brasil", que começa nas
nossas estradas e portos, passando pelo custo do trabalho e
pela elevadíssima carga tributária e que são aprofundados
pela nossa dificuldade em fechar acordos comerciais favoráveis. Todos esse fatores, associados à valorização da moeda,
têm dificultado a vida de muitas indústrias e transformado a
vida de outras tantas.
Alguns setores foram afetados mais rapidamente e já sofrem as conseqüências da mudança no patamar do câmbio, a
exemplo do agribusiness, um
dos mais importantes da economia brasileira. Reconhecidamente uma das mais competitivas do mundo, a agropecuária
brasileira está atravessando
uma crise de liquidez e inadimplência decorrente da queda de
rentabilidade.
Não é sem motivo que a Bunge, uma das maiores empresas
atuantes no complexo de soja
no Brasil, suspendeu investimentos próximos a US$ 1 bilhão (cerca de R$ 2,28 bilhões)
no país, além de estar diminuindo o tamanho da sua operação (foram fechadas nove fábricas). A ADM, sua concorrente, reduziu em 30% sua capacidade de processamento.
Outros setores da economia
estão buscando soluções diferentes. Algumas de nossas indústrias estão investindo fora
do país, o que é positivo do ponto de vista da sua internacionalização, mas que, no curto prazo, traduz-se num desestímulo
a mais para o crescimento doméstico. Essa lista não é pequena, e estamos vendo as notícias
diariamente nos jornais.
Na área têxtil, duas fusões
importantes aconteceram: a
Santista com a Tavex e a Coteminas com a Springs, ambas
fundamentais para a sobrevivência dessas empresas, mas
que estão levando para a América Central e para a Ásia os investimentos em novas unidades. A Motores WEG está ampliando sua atuação na China e
no México. A Ford do Brasil está investindo em quatro novas
unidades na Ásia e não tem nenhum plano de novos investimentos no Brasil. A Marco Polo
já se prepara para investir na
sua sexta subsidiária externa.
Na área química, a Unigel acabou de anunciar a compra de
uma fábrica no México para,
por meio daquele país, participar de maneira mais ativa nos
mercados americano e mexicano. Esses são alguns exemplos
conhecidos de redirecionamento de investimentos.
Outra parte da indústria está
substituindo insumos e componentes nacionais por importações de intermediários, como
alternativa para a manutenção
da competitividade. O setor de
autopeças tem utilizado as importações de maneira importante, diminuindo o grau de nacionalização dos nossos automóveis, o mesmo acontecendo
com setores como o moveleiro,
o calçadista e o de partes e peças de motores industriais,
sem, contudo, ampliar de maneira importante a sua capacidade produtiva.
O setor siderúrgico também
está preocupado. As importações chinesas de produtos com
aço contidos em carros, máquinas e equipamentos e autopeças poderá implicar, em futuro
próximo, a redução da produção de aço brasileira. E, finalmente, as mais afetadas estão
encerrando suas atividades industriais e passando a comercializar produtos de outros países -aconteceu recentemente
com uma empresa do setor de
acessórios para móveis, no Paraná.
Enquanto comemoramos o
resultado positivo do setor externo, que em parte tem respaldo no forte crescimento mundial e na elevada liquidez presente no mercado internacional -fatores não definitivos-,
estamos mais uma vez perdendo a oportunidade de encaminhar uma solução de longo prazo. Estamos distantes de termos uma solução satisfatória
para o problema fiscal que nos
faz campeões mundiais de arrecadação, obriga-nos à manutenção de uma política monetária agressiva e afasta investimentos produtivos de porte.
Não demos conta de solucionar
os gargalos da infra-estrutura,
que tiram competitividade de
forma importante. Não avançamos na modernização da legislação trabalhista. E, finalmente, a política externa brasileira
não tem conseguido resultados
comerciais que permitam uma
inserção mais competitiva no
comércio internacional. O conjunto da obra diminui a atratividade relativa do Brasil no fluxo mundial de investimento.
Por enquanto, vamos surfando na onda do crescimento
mundial que tem elevado o preço das nossas commodities e
possibilitado algum repasse de
preço em bens manufaturados.
Mas essa não é definitivamente
a solução para os nossos problemas.
MARIA CRISTINA MENDONÇA DE BARROS e
TEREZA MARIA FERNANDEZ DIAS DA SILVA
são sócias da MB Associados
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