São Paulo, quinta-feira, 15 de agosto de 2002

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ANÁLISE

Brasil fica no fio da navalha, e FMI também

DO "FINANCIAL TIMES"

A julgar pela reação dos mercados financeiros, o jogo está quente no Brasil. O risco-país aumentou, mesmo depois do acordo com o FMI, para cerca de 2.200 pontos. Se esse nível persistir, o Brasil ficará insolvente e fará uma moratória.
A razão de ser do FMI seria destruída: seu apoio à economia brasileira se mostraria inútil. Os que afirmam que os pacotes do FMI levam a empréstimos desenfreados ficariam desacreditados. Mais importante, o Brasil sofreria terrivelmente. Ninguém deve se importar muito em Wall Street ou na City de Londres, mas a idéia de que o Brasil poderia reestruturar sua dívida de modo relativamente indolor é coisa de malucos.
De sua dívida total de mais de US$ 250 bilhões, o setor público brasileiro deve apenas cerca de US$ 75 bilhões a credores estrangeiros do setor privado. Se essa dívida fosse reduzida aos valores atuais de mercado (aproximadamente US$ 40 bilhões), a economia em juros não mudaria muito a dinâmica da dívida.
Se o Brasil reestruturasse sua dívida interna, esmagaria o sistema bancário, que detém 30% de seus ativos em títulos do governo. Uma ajuda aos bancos seria necessária. Para recuperar a credibilidade depois do calote, os juros teriam de continuar altos, prejudicando ainda mais a solvência, porque mais de um terço da dívida está ligada às taxas de juros.
Embora a possibilidade de moratória e desastre esteja se tornando mais provável, ainda existe uma alternativa. Como disse John Williamson, do IIE (Institute for International Economics), com taxas de juros menores e uma moeda se apreciando gradativamente, a dinâmica da dívida brasileira, embora delicada, não é irremediável. O empréstimo de US$ 30 bilhões do FMI deveria aumentar a confiança dos mercados financeiros e colocar o Brasil no caminho da redução das taxas.
Ninguém deve esquecer que o Brasil não é a Argentina. Os políticos ainda têm o apoio interno e da comunidade internacional. O país recolhe impostos; o sistema bancário ainda está saudável; e os governos estaduais não podem estourar o Orçamento. Mas se a crise de confiança continuar, o Brasil irá no caminho de seu vizinho.
Reverter a confiança é difícil, mas duas coisas ajudariam. Primeiro, os candidatos de oposição devem dizer publicamente que a moratória não é do interesse do Brasil e se comprometer com o programa do FMI. Segundo, o FMI deve produzir uma argumentação detalhada para suportar sua afirmação de que o Brasil "está numa tendência de políticas sólidas de longo prazo que merecem todo o apoio da comunidade internacional". A única certeza é que fazer nada condenaria o Brasil a um colapso desnecessário.


Tradução de Luiz Roberto Gonçalves


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