São Paulo, Domingo, 15 de Agosto de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VIRADA DO ANO
Bancos admitem que temor pode gerar retiradas do país
Investimento pode sair do Brasil por causa do bug

da Reportagem Local

Agências e bancos de investimentos nos Estados Unidos e Canadá prevêem que pode haver uma forte retirada de dinheiro alocado em cerca de 120 países emergentes a partir de outubro, para evitar problemas com o bug do milênio.
O Brasil aparece em dois paradoxos. Para alguns analistas, vai sofrer com a "crise de confiança" que passará a assolar os mercados emergentes e vivenciará uma onda de saques.
Para outros, o país está bem preparado para enfrentar a passagem do ano e pode se aproveitar disso, recebendo dinheiro transferido de outros países menos preparados.
Há cerca de US$ 200 bilhões circulando entre os mercados emergentes. Cerca de 70% do dinheiro está colocado num conjunto de 63 países.
"O problema do bug com um banco de país emergente tem potencial de causar falhas em todo o sistema nos EUA", diz Michael Mayo, analista do Credit Suisse Fisrt Boston.
Jean-Guy Desjardins, presidente da empresa canadense TAL Global Asset Management (especialista em investimentos em mercados emergentes), prevê uma retirada gradual de dinheiro do Brasil a partir de outubro.
"Se for deixado para dezembro, pode haver uma sobrecarga do sistema e ocorrer um "minibug'", afirma. Segundo ele, os preços de ações de empresas que possam ser afetadas pelo bug já serão afetados em Bolsas do mundo todo.
O dinheiro deve ser colocado em fundos de renda fixa.
"Ninguém sabe a extensão dos problemas e as inconveniências que vão gerar", afirmou o analista Paul Merriman, da Fund Advice.
"O mais prudente, nessa situação, é eliminar ou diminuir sua exposição em investimentos nessa área. Isso não tem nada a ver com o nervosismo que alguns desses países, como o Brasil, enfrentam neste momento", disse.
Para ele, a retirada de investimentos da América Latina deve ser da ordem de 43%.
Parte deste dinheiro deve correr para os T-Bonds, os títulos do Tesouro norte-americano, com 30 anos de vencimento e que pagavam juros anuais de 6,098% na sexta-feira.
"É um rendimento menor do que alguns fundos que temos em países emergentes", afirmou.
Relatório divulgado pela Morgan Stanley Dean Witter na semana passada indicava que pode haver retirada de dinheiro do Brasil ao final do ano.

Bolsa
Para Ed Yardeni, economista-chefe do Deutsche Bank Securities em Nova York, a Bolsa nova-iorquina pode registrar um recuo de até 30% devido aos riscos do bug do milênio.
"Uma recessão global pode começar com uma falha de computador", afirmou.
Ele diz que os investidores têm procurado informações sobre companhias que estejam mais bem preparadas para enfrentar a passagem de 1999 para 2000.
"O preço das ações dessas empresas já levará em conta sua capacidade de enfrentar os problemas operacionais", afirmou.
Segundo ele, empresas como a Telebrás (sistema de telecomunicações) terão seus preços em ações afetados.
"Há muita preocupação com a Telebrás. Seus equipamentos são muito velhos. Alguém já pensou nas consequências de não se conseguir fazer uma ligação para o Brasil? E se você não conseguir mandar um fax para lá? É um país muito importante", afirmou.
Peter Coolidge, analista-sênior da Brian, Murray & Co, qualifica o Brasil como bem preparado para a eventualidade do bug. E que pode ter benefícios com isso. "O dinheiro pode correr de lugares como a Índia para o Brasil."

Auditoria
O brasileiro Arnaldo Carrera é especialista em tecnologia e trabalha no sistema de prevenção do bug para um banco canadense.
Ele diz que 99% dos bancos norte-americanos já foram auditados pelo Federal Reserve (o banco central dos EUA) e estão em boas condições.
"Bancos brasileiros que estão atuando nos EUA também foram supervisionados pelo Fed", disse.
Segundo ele, a retirada de dinheiro dos países emergentes é "uma possibilidade", mas que "o mercado não deu indicações de que isso venha a ocorrer".
Carrera afirma que instituições como o Chase Manhattan e o Citibank gastaram mais de US$ 400 milhões em sistemas de prevenção contra o bug.
Robert Harrell é o homem responsável por tomar conta de um portfólio de US$ 1,7 bilhão distribuído em países emergentes.
Ele criou um fundo específico para ser gerido durante a passagem do ano, o "Year 2000 Risk Management" (algo como "gerência do risco do ano 2000").
Ele prevê que as Bolsas de todo mundo serão afetadas. No caso de Nova York, diz, os preços já estão muito altos e irão se adequar a um patamar mais próximo da realidade.
"As Bolsas cairão pela incerteza que dominará as economias", afirmou. Além disso, muitas empresas sofrerão ações indenizatórias que podem chegar a bilhões de dólares, por problemas com produtos e serviços decorrentes do bug. Elas passarão a valer menos e suas ações refletirão isso.
O novo "crash" da Bolsa de Nova York terá reflexos em todos os países do mundo. "Não há necessidade de tirar dinheiro de um país para gerar instabilidade", afirmou. (MARCELO DIEGO)


Texto Anterior: Falha em sistema é o temor em 2000
Próximo Texto: Rubens Ricupero - Opinião Econômica: Quem vai pagar a conta?
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.