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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
China pode ser a grande vitoriosa da crise
GILSON SCHWARTZ
da Equipe de Articulistas
Estamos em plena temporada de
apostas contra a economia chinesa. Nos últimos dias, as autoridades de Pequim vieram novamente
a público afirmar que não vão desvalorizar o câmbio, apesar da forte
piora nos indicadores de crescimento econômico e do saldo no
comércio exterior.
Se os chineses conseguirem escapar à especulação, podem ser os
grandes vitoriosos na crise financeira do final do século 20. Praticamente todos os outros grandes
mercados emergentes estão saindo
"de joelhos" da crise (supondo que
o pior, se já não passou, está perto
do fim).
Acordos com o FMI, recessões
profundas, quebra de bancos, situações que se fazem acompanhar
de abertura ainda maior das economias e perda de soberania são
comuns agora na Rússia, no Brasil
ou no México. Mas os gigantes da
Ásia (além da China, também a Índia e, no grupo dos ricos, o Japão)
por enquanto estão reafirmando
suas vocações de maior independência e liderança.
A China, sem muito alarde, está
promovendo uma ampla reforma
em seu sistema financeiro doméstico, que inclui até moratória sobre
débitos externos, fechamento de
mercados e limitações cada vez
mais fortes a operações com capital estrangeiro no país.
Os jornais têm publicado essas
notícias, mas praticamente sem
destaque. Parece incômodo, para
dizer o menos, constatar que uma
das economias mais importantes
do mundo está enfrentando a crise
sem adotar o modelo do FMI, sem
abrir mais a economia, sem desvalorizar o câmbio e, pecado dos pecados, suspendendo pagamentos a
credores externos ou impondo
restrições aos capitais estrangeiros.
Aliás, a China também está dando curiosos exemplos de administração "clássica" de crises: admite
que grandes empresas quebrem.
Na semana passada, por exemplo,
quebrou uma das maiores empresas produtoras de açúcar do país.
Foi a maior falência da história
chinesa (US$ 85 milhões em dívidas não pagas). Nem por isso os
mercados globais tremeram ou a
China colocou os juros nas alturas
para atrair capitais externos.
Parece que há um bloqueio mental ou ideológico geral diante do
ajuste chinês. Entre os grandes
emergentes, a China é hoje o menos vulnerável e com maior potencial no longo prazo.
Aliás, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) acaba de publicar
um estudo original sobre a evolução histórica da China ("Chinese
Economic Performance in the
Long Run", escrito por Angus
Maddison). O trabalho examina o
desenvolvimento chinês desde os
primórdios.
Entre as conclusões relativas ao
período mais recente e ao futuro
menos distante, Maddison estima
que mesmo caindo a uma taxa de
5,5% ao ano, o crescimento econômico da China vai colocá-la em pé
de igualdade com os Estados Unidos em 2015. Neste momento, o
PIB chinês seria o equivalente a
17% do PIB mundial. Mesmo com
uma renda per capita inferior à dos
EUA, o país teria um poder respeitável na geopolítica global.
Outro dado relevante do estudo é
uma reavaliação da abertura econômica chinesa, que seria muito
menor do que se imagina: apenas
5% do PIB. E as restrições a importações continuam muito importantes, já que a China nem sequer é
filiada à Organização Mundial do
Comércio (OMC).
Apec
Neste final de semana começa
em Kuala Lumpur, na Malásia, a
cúpula do Fórum de Cooperação
Econômica da Ásia e Pacífico
(Apec). Os conflitos de bastidor
nos últimos dias são outro bom
exemplo de como a Ásia, apesar
dos US$ 144 bilhões que o FMI já
comprometeu com a região, continua avessa ao modelo ocidental.
O Japão continua tentando montar seu próprio pacote de ajuda regional, de US$ 30 bilhões. Os EUA
têm outra proposta de ajuda financeira, que inclui o perdão de dívidas (em boa medida, com bancos
japoneses), mas exige maior abertura comercial.
Aparentemente, a ajuda financeira dos EUA não sairá sem compromissos maiores com a liberalização comercial. Mas é exatamente esse compromisso que os asiáticos, a começar pelo Japão, estão
querendo evitar.
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