São Paulo, sábado, 16 de janeiro de 1999

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ARTIGO

Quanto custam as moratórias

DAGOBERTO LIMA GODOY

O administrador experiente sabe bem que a moratória é um recurso extremo e oneroso, por isso mesmo para ser usado somente na falta absoluta de saída das dificuldades pela negociação. É bem verdade que esse, como tantos outros, foi um conceito distorcido nos tempos da inflação desbragada, quando empresas concordatárias beneficiavam-se da ausência de correção monetária sobre os seus débitos, descarregando o problema nos credores incautos. Mas, mesmo antes do Plano Real ter sofreado a inflação, a justa atualização das dívidas da concordata já mudara o quadro, obrigando os empresários a ser mais consequentes no uso desse instituto. Hoje, a concordata voltou a ser compreendida como uma tentativa quase desesperada para salvar a empresa, que, mesmo quando consegue, debilita o negócio e exige uma longa e penosa convalescença.
Com as finanças públicas não é diferente, embora o responsável pelos negócios do Estado possa ser tentado pela possibilidade de, quando a coisa dá errado, poder "pegar o seu chapéu" e deixar a situação, agravada por seu erro, para ser resolvida pelo seu sucessor no governo.
Lições concretas não faltam, tanto próprias quanto alheias:
1) Há tão pouco tempo que não dá para desculpar esquecimentos, o ministro Dilson Funaro (de saudosa lembrança como figura humana, por suas muitas qualidades e boas intenções), por não querer ou por acreditar impossível a negociação, decretou a moratória, que até hoje está na "memória de elefante" do mercado internacional, elevando o "risco Brasil" e acrescendo amargos pontos às brutais taxas de juros que nos cobram;
2) A recente moratória russa, além de piorar dramaticamente a situação daquele país e as condições de vida de seu povo, travou o fluxo de capitais para as demais economias ditas emergentes, até mesmo o Brasil. Ainda mais, exacerbou a conhecida "covardia" dos investidores, provocando um movimento de "corrida para a segurança", que nos custou uma perda de reservas da ordem de US$ 30 bilhões, em pouco mais de três meses.
Tomara que a moratória anunciada pelo governador Itamar Franco não venha a somar-se a esses casos de triste memória, pelas sequelas que venha a causar -além do mal já feito- não somente ao povo de Minas, mas a toda a sociedade brasileira. O rompante do governante mineiro encontra o país ainda às voltas com quase todas as vulnerabilidades que nos colocaram no "olho do furacão" e nos obrigaram a -uma vez mais utilizando a competência e o prestígio internacional do ministro Pedro Malan- recorrer ao pacote de ajuda externa de US$ 41,5 bilhões: déficit público elevado e crescente, endividamento estatal explosivo e uma enorme demanda por financiamento externo. Recém tínhamos descontado o risco político associado à eleição presidencial e nos vem esse novo sobressalto!
Em vez de, à moda antiga, pensar no governo federal como "saco sem fundo", sempre disponível para cobrir os rombos dos cofres estaduais e municipais, o governador de Minas e, de certa forma, todos os outros que clamam por renegociação de suas dívidas deverão lançar-se a um inadiável ajuste fiscal e às reformas estruturais, único caminho eficaz para pôr fim à crise e relançar o desenvolvimento nacional.
Respeitamos o governador Itamar Franco, eleito democraticamente para reger um dos mais importantes Estados brasileiros. Mas, diante de dificuldades amplamente conhecidas antes das eleições, foi para resolvê-las que o povo mineiro respondeu a sua candidatura. E não para criar mais problemas para Minas e para o Brasil inteiro.


Dagoberto Lima Godoy, 60, engenheiro, é presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul.



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