São Paulo, sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

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Lula cede, e Brasil pagará mais à Bolívia

Presidente fecha acordo com Morales para reajustar o gás da Bolívia, que estima ganho extra de US$ 100 mi por ano

Brasileiro fala em "generosidade" com o país vizinho, e colega boliviano promete que não faltará gás para o Brasil


HUMBERTO MEDINA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva cedeu à intensa pressão do colega boliviano, Evo Morales, e avalizou ontem o aumento do preço do gás da Bolívia vendido à Petrobras.
Lula falou que a concessão foi uma "generosidade", negando que o Brasil seja "imperialista". Já Morales, que havia ameaçado não vir ao encontro se não saísse com um aumento nas mãos, prometeu que "nunca faltará gás ao Brasil" e que irá "cumprir contratos" com a Petrobras.
Pelo acordo, a Petrobras passará a pagar um valor adicional pela mesma quantidade de gás comprado hoje. A justificativa é o fato de o gás fornecido pelo país vizinho, por conta de sua composição química, produzir uma quantidade de energia maior do que a necessária para o uso industrial feito no Brasil.
Na previsão do governo boliviano, o aumento será de cerca de US$ 100 milhões por ano, o equivalente a um reajuste de 8% no valor total que foi pago no ano passado. Cálculos do Ministério de Minas e Energia do Brasil indicam aumento de custo menor, entre 3% e 6%.
Pelo acordo, o preço do gás não será reajustado, mas a Bolívia receberá mais pelo gás que o Brasil não usa e não pagava até agora. É como se o preço estivesse subindo de US$ 4,20 por milhão de BTU (British Termal Unit, medida de energia) para entre US$ 4,33 e US$ 4,54, dependendo da estimativa. A Bolívia queria receber o mesmo pago pela Argentina: US$ 5.
A divulgação das perdas do Brasil causou constrangimento na entrevista coletiva dos ministros Silas Rondeau (Minas e Energia) e Carlos Villegas (Hidrocarbonetos, Bolívia) e por José Sérgio Gabrielli, presidente da Petrobras.
O Brasil insistia que não era possível quantificar o aumento de custos. Após várias perguntas dos jornalistas, o ministro boliviano finalmente informou um número -US$ 100 milhões por ano- e foi aplaudido por membros da delegação da Bolívia. Quando Villegas fez menção de sair da mesa, Rondeau disse, pegando em seu braço, que daria uma resposta que gostaria que ele ouvisse. E repetiu que não era possível determinar o aumento de custos.
As mudanças promovidas por Morales já produziram queda abrupta do lucro da Petrobras na Bolívia. A alta dos impostos, implantada em maio, provocou redução no lucro de R$ 250 milhões, em 2005, para R$ 57 milhões, no ano passado.
Em outro item do acordo, menos complicado, o preço do gás comprado pela usina termelétrica de Cuiabá (MT) foi reajustado em 253%. Com isso, a usina vai gerar energia mais cara, e o consumidor brasileiro pagará a conta, com um reajuste extra de, em média, 0,2% na tarifa de energia. O reajuste dá uma receita adicional de US$ 44 milhões por ano à Bolívia.
Com o reajuste do preço do gás e a assinatura de novos contratos de exploração, em outubro, resta agora negociar a transferência do controle acionário das duas refinarias da Petrobras para o Estado boliviano, conforme previsto no decreto de nacionalização. Villegas já disse que esse processo estará concluído até maio.
Para esclarecer os impactos da negociação, Rondeau convocou nova entrevista, sem a presença do colega boliviano, para a sede do ministério. Explicou que os acertos foram feitos durante todo o dia de ontem. A exigência da Bolívia era um reajuste do preço do gás para US$ 5 por milhão de BTU, preço pago pela Argentina.
"Nós argumentamos que a Argentina não fez os mesmo investimentos que o Brasil fez na Bolívia", disse Rondeau. Segundo ele, com o acerto, ficou garantido que o suprimento de gás para o mercado brasileiro não será afetado pelas recentes medidas tomadas pelo governo boliviano para dar prioridade ao seu mercado interno.
Ainda segundo Rondeau, o acordo se justifica por questões "geopolíticas": "Não queremos ter uma país ao lado com problemas".


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