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OPINIÃO ECONÔMICA
Plano 2020: ataque e defesa
PAULO RABELLO DE CASTRO
Os cidadãos eleitores estão
visivelmente preocupados. O
Brasil, nosso destino, nossa felicidade estão em jogo. Nunca foi tão
importante acertar. Contudo a
demonização recíproca dos candidatos que ficaram para o segundo turno acentua os naturais
receios da sociedade. Em parte, o
susto do câmbio a R$ 4,00 reflete
isso.
Mas está refletido, também, do
ponto de vista "dos mercados",
um outro receio velado: o Plano
Real acabou, enquanto programa
de estabilização; deveríamos estar ingressando na era do crescimento -bônus pelo bom comportamento dos preços-, mas
enveredamos pelo escuro caminho de uma estagnação com nova
ameaça inflacionária. Portanto é
grave.
Muita gente tem me perguntado se tem saída (que não seja a fuga pela porta dos fundos!). A resposta é um sonoro "tem!". Sim, há
saída se houver uma conjugação
de emoção com razão, na liderança política do país. Mas os interlocutores aprofundam a dúvida:
"Mas tem saída com esse candidato?!... e com aquele??". Reconheço que é algo difícil explicar
que a escolha do candidato tem
importância, sim, mas precisa ser
relativizada pelas condições objetivas que o Brasil enfrentará nos
próximos meses e anos. A escolha
do jogo que o Brasil fará com o
resto do mundo e aqui, nesta região em particular, é que parece
ser determinante do nosso futuro
sucesso ou insucesso.
Explico.
A primeira coisa que o Brasil
precisa ter -e não tem ainda,
nem adianta procurar, tampouco
nos sites dos candidatos- é uma
"visão longa". Óbvio que, se questionados, Serra ou Lula responderão algo inteligente. São pessoas
preparadas para oferecer boas alternativas verbais a questões
complexas. Mas indo mais fundo
há evidentes lacunas nesse planejamento político para o Brasil a
longo prazo.
Precisamos de um Plano 2020.
Precisamos avançar duas vezes 20
anos em menos de 20 anos, ou seja, nos 18 anos que nos separam
de 2020 devemos crescer e melhorar a condição de vida da grandíssima maioria, com efeito multiplicador pelo dobro do que seria
normal esperar nos próximos
anos.
Muito pouco tem sido tratado
pelos candidatos a respeito de um
Plano 2020 que deveria estar povoando a cabeça e o discurso de
ambos.
Falar de 2020 é fundamental
para a geração dos empregos prometidos por esses candidatos.
Também é evidente que uma "visão longa" atiça a discussão de
onde se sacarão os recursos para
investimentos necessários ao salto
à frente. A educação tem e terá
prioridade, mas, além dela, o que
mais? E como?
Falar e discutir 2020, resolver as
prementes questões de governo
com uma visão de 2020 será uma
pedagogia fundamental para
qualquer das equipes de governo
que se sentar à mesa oval do Poder Executivo. O exemplo mais
gritante é a administração da
moeda, do crédito e da dívida pública, que abarca, é claro, a política cambial. Um Plano 2020 tem
que apresentar uma estrutura de
ataque e defesa, como no bom futebol. Só ataque ou só defesa nos
conduzirão ao desastre ou, no
máximo, a um melancólico empate.
Se alguma crítica merece o governo FHC, é que sua equipe jogou na retranca e, agora, está tomando gols inesperados, justo no
final do segundo tempo (aliás, segundo mandato). É preciso planejar o ataque. FHC terá sempre
uma desculpa aceitável, e só a ele
aplicável, de ter sido quem fez a
limpeza da sujeirada financeira
acumulada em dez anos da
maior zorra inflacionária de todos os tempos. FHC foi um homem que também arrumou a cena externa para o próximo presidente jogar bem. Mas esse, que virá agora, não terá a desculpa de
ficar na retranca.
Mas aí é que, por coincidência,
mora o perigo. Ataque, sim, mas
só após reagrupar e reforçar a defesa. Isto é, a defesa financeira externa do país. Não existe ataque
sem boa defesa. Essa precede
àquela. O país está vulnerável
porque o mundo está péssimo.
Enxergar e lidar com isso é vital.
Parte da defesa, felizmente, este
Brasilzão maravilhoso já está
propiciando a si mesmo. A balança comercial brasileira tem batido todas as previsões mais otimistas. Em parte, pelo recuo da produção interna, o que é menos
bom. Mas a defesa financeira surge quase automaticamente, empurrada pelas exportações. Mas
esse mecanismo tem limite. Recessão nunca foi remédio para
pagar as nossas contas. O "custo
Brasil" tem que ser derrubado. As
reservas brasileiras livres precisam caminhar gradualmente para um patamar de US$ 40 bilhões,
US$ 60 bilhões e, depois, US$ 70
bilhões ao longo dos próximos
anos. País moreninho e emergente não pode ficar sem caixa, sem
grana no bolso. Senão a moçada
lá fora perde o respeito, como
agora, em que os bancos provedores de créditos externos brincam
com a nossa sorte (e com a deles!),
passando para nós a ficha de
maus pagadores, quando são eles
os maus emprestadores. Uma inversão de culpa, típica de quem
está por cima da carniça. Não poderíamos entrar nesse jogo. Entramos. Precisamos pular fora.
Com jeito. Com visão de 2020.
Retornando à mirada longa,
vou terminar com duas perguntas
de "ataque" aos candidatos (que
eles não precisam se incomodar
de responder):
1) Como chegar a 2020 com
uma renda, por habitante, de US$
9.000 ao ano (não valendo como
resposta aquelas tolices do tipo
"tiro dos ricos pra dá pros pobres"
e similares)?
2) Que papel estratégico o candidato reserva ao Brasil na América do Sul e como ativar essa
eventual potência, não a despeito,
mas em consórcio com outros interesses continentais (também
não vale a tolice de "abaixo a Alca e fim de papo")?
Se nossos candidatos, no poder
e na oposição -porque essa será
também fundamental, para a
saúde da nossa florida democracia-, puderem enfrentar o desafio do Plano 2020, tanto no ataque como na defesa, confirmar-se-á a suspeita de alguns -poucos, é verdade- investidores nacionais e externos, que insistem
mesmo em plena crise atual em
perceber este espaço do mundo
como uma região que alcançará
grande progresso nas próximas
décadas. É esperar para ver.
Paulo Rabello de Castro, 53, doutor em
economia pela Universidade de Chicago
(EUA), é vice-presidente do Instituto
Atlântico (RJ). Escreve às quartas-feiras,
a cada 15 dias, nesta coluna.
E-mail -
paulo@rcconsultores.com.br
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