São Paulo, quarta-feira, 16 de outubro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF

A (i)lógica pendular do país

A expressão "jogar fora o bebê com a água de banho" é a que melhor define os movimentos pendulares da política econômica brasileira. Para que não se repitam na próxima transição do poder, é fundamental que se separe claramente o que foi erro e o que foi acerto no governo Fernando Henrique Cardoso.
Nos últimos 30 anos, a discussão sobre o país foi dominada por grupos acadêmicos de diversas linhas de pensamento -tendo em comum o fato de jamais saírem da vã economia- e de usar as idéias como ferramenta de influência política, e não para a solução de problemas.
Nos últimos anos renasceram métodos muito mais objetivos e pragmáticos de trabalhar a realidade do país e das empresas. Consistem em definir, primeiro, o objetivo final -no caso do país, a busca do bem-estar da população. Depois, os meios -crescimento econômico, geração de emprego, políticas sociais eficazes. Finalmente, ir analisando cada medida sob essa ótica. Com isso, desideologiza-se o debate, vai-se buscar o melhor, independentemente das escolas de pensamento econômico, porque o eixo a ser seguido é o objetivo final, antecipadamente definido.
O período anterior a 1990 -que vai do segundo governo Vargas ao governo Geisel- deixou vantagens e desvantagens para o país. A vantagem foi ter permitido a industrialização brasileira, contra todos os discursos dos livre-cambistas. Criaram-se grandes estatais, que foram importantes para o salto inicial de industrialização e de serviços públicos, e surgiram os primeiros grupos econômicos nacionais modernos.
As desvantagens foram que, depois de ter cumprido seu papel, o modelo estatal foi superado pelos novos tempos -mostrando-se ineficaz em ambiente democrático e de profundas transformações tecnológicas- e o excessivo protecionismo às indústrias inibiu sua competitividade. Tudo isso agravado pelos interesses políticos dos governantes, que utilizavam ferramentas de política industrial como instrumento de barganha política ou financeira.
O governo Fernando Henrique Cardoso tinha duas propostas para corrigir os erros do período anterior. Uma, mais pragmática -assumida pelo grupo paulista de Motta, Serra, Clóvis, os irmãos Mendonça de Barros-, que consistia em monitorar a abertura econômica de maneira a implantar a competição, sem matar a indústria local (o objetivo não era a abertura em si, mas ela como indutora de maior competitividade e internacionalização dos nossos produtos); a criação de ambiente macroeconômico favorável, com instrumentos de crédito e modernização institucional; o avanço conceitual importante de pensar a economia em termos de cadeias produtivas, em contraposição ao fortalecimento individual ou setorial de empresas. Em suma, não jogar a criança com a água.
Prevaleceu o pensamento do segundo grupo, os Fritsch, Bacha, Malan, Lara Rezende e Franco, mencionados na entrevista do presidente. Sua análise -aceita por Fernando Henrique- era que haveria oferta infinita e ilimitada de capital no mundo. Portanto bastaria abrir a economia, produzir déficits comerciais a fim de permitir espaço para a entrada do capital estrangeiro, que, por si, promoveria a modernização da economia. Um erro capital!
Agora voltemos ao terceiro tempo do jogo. Há um questionamento amplo sobre os erros do governo Fernando Henrique Cardoso e tenta-se colocar todas as decisões do período no balaio do tal "modelo neoliberal". Ora, a criação de agências reguladoras, a privatização de grandes empresas estatais, a profissionalização das que permaneceram públicas, o modelo embrionário de planejamento, com o Plano Plurianual, nada têm a ver com o arcabouço ideológico que levou à quebra do país. São medidas de modernização, de melhoria da competitividade, de fortalecimento da economia que independem de escolas econômicas.
O que se tem a fazer é corrigir os erros cometidos, mas sem repetir o mesmo erro que se critica agora: o de jogar fora a criança com a água do banho.

E-mail -
LNassif@uol.com.br


Texto Anterior: Eventos: Feiras se segmentam para crescer
Próximo Texto: Mercado financeiro: Bolsa inicia mês com fluxo externo positivo
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.