UOL


São Paulo, segunda-feira, 17 de março de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ARTIGO

McDonald's tenta reconquistar terreno

SHERRI DAY
DO "THE NEW YORK TIMES"

De vez em quando, Daniel Ibrahim se reabastece no McDonald's. Mas ele prefere que seus amigos não fiquem sabendo.
"Quando eu era adolescente, era muito mais aceitável dentro do meu grupo de amigos comer lá", diz Ibrahim, 26, desenhista, que está desfrutando de um sanduíche em um McDonald's no distrito de Mission, San Francisco.
"Mas agora, freqüentar um deles soa inculto, reprovável, uma falta de estilo. Ninguém se vangloria de ir ao McDonald's para uma refeição, com certeza."
Ele acrescenta que, "se você deseja ser elegante, você come sushi. Comida indiana é algo que está ainda mais na vanguarda. O McDonald's é como pão de forma", diz.
A cadeia de restaurantes, que por muito tempo simbolizou para algumas pessoas o modo de comer norte-americano (mais ou menos como acontecia com a General Motors no que tange às estradas), está enfrentando séria crise de identidade.
Embora continua a ser a cadeia de restaurantes fast food mais freqüentada dos Estados Unidos -mais de 20 milhões de pessoas por dia comem em algum dos restaurantes McDonald's norte-americanos-, a empresa está enfrentando o declínio de sua participação no mercado de fast food e vem perdendo o afeto de muitos consumidores, de acordo com múltiplas pesquisas.

Perda de mercado
Desde 1997, a parcela do McDonald's no mercado de fast food caiu em mais de 3%, de acordo com a Technomic, uma empresa de pesquisa de mercado -a rede agora domina 15,2% do mercado. A cadeia Subway, que oferece sanduíches montados ao gosto do freguês e com pão fresco, suplantou o McDonald's como maior cadeia de fast food norte-americana.
Entre as cadeias de hambúrgueres, o McDonald's vem perdendo a batalha do almoço para a Wendy's, que começou a oferecer um cardápio alternativo com batatas assadas e um bufê de saladas. As vendas das populares "Happy Meals" (refeições felizes) despencaram, porque o acordo de licenciamento de 10 anos que a cadeia fechou com a Walt Disney não conseguiu tirar vantagem de brinquedos baseados em filmes de imenso sucesso desde "Toy Story 2", de 1999. E se, no passado, ser proprietário de uma franquia do McDonald's era uma maneira garantida de ganhar dinheiro, muitos dos franqueados da empresa vêm expressando decepção com os lucros reduzidos, com os dispendiosos sistemas de cozinha que vêm sendo adotados e com o relacionamento desgastado com o comando da empresa.
O que pode prejudicar mais o grupo é a percepção de que, em uma era de processos judiciais por obesidade e de cafés sofisticados custando US$ 5 (cerca de R$ 17,50), o McDonald's parece atender ao sopé do mercado.
No ano passado, em pesquisa publicada pela "Restaurants and Institutions Magazine", os entrevistados classificaram o McDonald's em 15º lugar em termos de qualidade, entre as cadeias de hambúrgueres, atrás de restaurantes como o Steak N'Shake, In & Out Burger, Burger King e White Castle.
Ray Kroc, que fundou a cadeia em 1955, era um grande proponente da eficiência (antes de abrir os primeiros restaurantes, ele era um distribuidor bem sucedido de máquinas para mistura automática de milk shakes) e, sob sua orientação, os restaurantes da cadeia McDonald's eram maravilhas de padronização.
Com seus funcionários uniformizados, linha de montagem de comida e decoração instantaneamente familiar, os restaurantes ofereciam o nível de serviço que os clientes vieram a esperar, e vendiam pratos como o mitológico Big Mac ("dois hambúrgueres, alface, queijo, molho especial, cebola, picles em um pão com gergelim"), com o mesmo sabor de Albany, interior da Geórgia, à cidade de Nova York.
"Foi o começo da comida sem gosto e feita de maneira sempre igual", disse Barbara Haber, historiadora da alimentação e autora de "From Hardtack to Home Fries: An Uncommon History of American Cooks and Meals" ["Do Biscoito Duro às Batatas Fritas: Uma História Incomum dos Cozinheiros e Pratos Norte-Americanos"].
"A mágica era que os pratos se mantinham sempre consistentes", disse. "Isso era novidade. Hoje, temos saudades dos velhos tempos dos restaurantes individuais, como se tivessem sido parte de uma era dourada. Mas a qualidade deles era irregular, e as cadeias de fast food realmente prestaram um bom serviço."

Horário
A empresa apelou com sucesso para as famílias em constante corrida contra o relógio, especialmente as mães trabalhadoras -a audiência básica de sua campanha "hoje você merece uma folga"-, que tentavam equilibrar tarefas domésticas e as responsabilidades profissionais que começavam a adquirir.
O McDonald's rapidamente se transformou no maior comprador de carne bovina e batatas congeladas dos Estados Unidos. E é também um dos maiores proprietários de imóveis e, por meio das "Happy Meals", um dos maiores distribuidores de brinquedos do país.
Para combater a queda da satisfação de seus clientes com a comida do grupo, o McDonald's fez o impensável: alterou o venerado sistema de cozinha criado por Kroc. Em 1992, a empresa abandonou o processo de cozimento prévio de seus hambúrgueres, que recebiam molhos e eram armazenados sob luzes de aquecimento. O novo sistema desenvolvido requeria um passo adicional: esquentar os hambúrgueres em um forno de microondas antes que fossem servidos.
Em 1999, a empresa lançou um sistema de pratos personalizados conhecido como "Made for You" (feito para você), para combater os lanches personalizados oferecidos por concorrentes como o Wendy's e o Burger King, que vinham roubando parte da clientela de almoço dos restaurantes McDonald's.
Segundo muitos relatos, ambos os sistemas foram um fiasco, retardando de maneira significativa o tempo de serviço e oferecendo comida que os consumidores não viam como superior à dos concorrentes do McDonald's.
Os custos das renovações de cozinhas para o sistema "Made for You", entre US$ 25 mil e US$ 85 mil por unidade, com cobertura parcial pela rede McDonald's, e dos cardápios especiais de almoço foram cobertos em larga medida pelos franqueados, que controlam 85% das unidades da cadeia nos Estados Unidos.
O McDonald's não foi a primeira cadeia de restaurantes a adotar o sistema de franquia, mas desenvolveu um modelo próprio e lucrativo para o setor. O contrato entre o McDonald's e os franqueados era que a cadeia lhes alugaria as instalações e exigiria padrões elevados de serviço; em troca, os franqueados sairiam muito ricos.
Mas muitos dos franqueados dizem que ter um restaurante McDonald's não é mais a confiável máquina de dinheiro do passado. As margens de lucros se reduziram, os custos aumentaram e a administração do grupo em larga medida excluiu os proprietários de unidades franqueadas do processo decisório, dizem alguns deles.
"O negócio não é mais tão lucrativo", disse Richard Steinig, 30, franqueado do McDonald's em Miami. "Os operadores inteligentes saíram no final dos anos 80 e começo dos 90. Há unidades que basicamente não valem nada".
Abrir uma franquia do McDonald's custa entre US$ 500 mil e US$ 800 mil, segundo a empresa. "Não creio que o grupo tenha a lista de espera do passado, e parte do motivo é que o retorno sobre o investimento agora não é mais o que era", disse Steinig.


Tradução de Paulo Migliacci


Texto Anterior: Energia: Petrobras desiste de construir termelétricas
Próximo Texto: Artigo: Investidor aceita risco maior em busca de ganho mais elevado
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.