São Paulo, domingo, 17 de maio de 1998

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DIAGNÓSTICO & RECEITA
Topa-tudo

OSIRIS LOPES FILHO
A Federação, como valor fundamental à estruturação do Estado brasileiro, tem sido negligenciada por nossas autoridades. Embora todas as nossas Constituições republicanas a tenham consagrado, em realidade a prática federativa não tem sido observada.
A mais federativa das nossas Constituições é a atual. Todavia, as emendas constitucionais que criaram inicialmente o Fundo Social de Emergência, rebatizado de Fundo de Estabilização Fiscal, constituem duro golpe à desconcentração de poder, típico da Federação, no que ela tem de essencial -recursos.
A nossa ordem constitucional federativa, do ponto de vista tributário, caracteriza-se pela atribuição razoavelmente equilibrada de competência aos entes federados para constituírem impostos e pela instituição de mecanismo de partilha da arrecadação, de caráter redistributivo.
As várias emendas que disciplinaram o FEF, se a Constituição fosse cumprida na integralidade, não poderiam sequer ter sido apreciadas pelo Congresso (art. 60, parágrafo 4º, I da CF).
Lá predomina a família Carneiro, organização patriarcal, oligárquica e clientelística, que constitui a maioria governista no Congresso e parece a Joaquina, da zona meretrícia, topa-tudo.
As duas emendas que aprovaram o FEF tiveram efeito retroativo (EC nº 10/96 e nº 17/97), vulnerando o direito adquirido, consagrado no art. 5º, XXXVI da CF.
O FEF abocanha 20% da arrecadação dos impostos e contribuições federais. Assim, deprime os recursos do IPI e do IR destinados a municípios, Estados e Distrito Federal.
A maior perda é no IR, pois a emenda do FEF estabelece que o IR incidente nos pagamentos feitos a terceiros, pela União, suas autarquias e fundações, contrariando a orientação básica da Constituição, constituem receita apenas da União, não compondo o montante a ser distribuído.
Mas o vexame reside em se tirar mais 5,6% da arrecadação do IR, a título de alterações feitas em leis de 1994, cujos efeitos já ficaram superados por outros diplomas legais editados em avalanche.
Segue-se a tradição. Governadores e prefeitos devem vir a Brasília como pedintes de pires e chapéu na mão.
O que a Constituição garante vale apenas quando interessa ao Imperador. Infelizmente, a relação entre a União e entes federados é a de senhor e servos. Sem dignidade, com subserviência.


Osiris de Azevedo Lopes Filho, 58, advogado, é professor de Direito Tributário da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.



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