São Paulo, domingo, 17 de maio de 1998

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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Crise asiática torna-se questão de segurança

GILSON SCHWARTZ
da Equipe de Articulistas

Nas últimas duas semanas a crise asiática entrou numa terceira fase. Com os testes nucleares na Índia e a onda de violência na Indonésia, a dimensão estratégica e militar vem para primeiro plano.
Índia e Indonésia têm relações problemáticas com a potência emergente da região: a China.
Emergente, mas também afetada pela crise financeira. Os chineses vinham mantendo uma posição de frieza e até soberba com relação aos problemas financeiros da região. Mas a fragilidade chinesa também começou a se tornar evidente. As exportações da China já começaram a perder dinamismo. Entre janeiro e abril, as suas vendas externas cresceram 11,6% . No mesmo período do ano passado, as exportações cresciam a 26,9%.
Como se não bastasse, há duas semanas veio a público um estudo preocupante elaborado por Yi Gang, economista-chefe do banco central chinês (em co-autoria com um acadêmico, Song Ligang).
Segundo a versão publicada pelo "Australia Financial Review" (http://www.afr.com.au), o técnico do BC chinês admite que o seu governo tem "razões muito boas para se preocupar", entre as quais listou "o perigo real de uma deflação com efeitos negativos sobre o processo de reformas". O texto foi apresentado em seminário na Universidade Nacional da Austrália no início de maio.
Gang e Ligang concluem: "Há um amplo consenso de que atrasos significativos ao processo de reforma aumentam os riscos de um colapso financeiro generalizado". Eles confirmam as estimativas que apontam para o comprometimento de 20% a 30% do sistema bancário chinês com empréstimos problemáticos. Na Tailândia, antes da crise, a proporção equivalente era de 15%. E até agora nenhuma autoridade chinesa admitiu esse nível de risco financeiro.
Os economistas chineses mencionam um efeito de "pressão dupla". Internamente, o governo puxou o freio para evitar o aquecimento e conter a inflação. Externamente, a crise asiática reduziu o mercado para exportações.
Como a crise externa não será superada no curto ou mesmo no médio prazo, a única alternativa seria relaxar a política de juros e estimular a economia doméstica.
Entretanto, reduzir juros, no mundo das finanças globalizadas, significa deixar a taxa de câmbio ao relento. E uma desvalorização cambial levaria a uma nova rodada de desvalorizações na Ásia, aprofundando a crise. Os economistas chineses chegaram até a prognosticar uma forte pressão contra o câmbio no final do ano.
O Japão seria a única fonte alternativa de dinamismo para as economias da região. Pesquisas recentes, entretanto, começam a revelar a extensão do estrago causado pela crise na Indonésia e na Tailândia sobre as multinacionais japonesas. As notícias de fechamento de fábricas naqueles países começam a se multiplicar.
O teste nuclear indiano não é apenas uma questão militar. Japão e China, as duas potências regionais, estão fragilizadas. A Indonésia, outra potência emergente, está paralisada e talvez às vésperas de uma ruptura política crucial.
Mas uma Índia nacionalista nunca esteve nos planos das potências ocidentais para o futuro da "Ásia-Pacífico". A questão econômica, portanto, projeta agora sombras crescentes no tabuleiro da segurança regional.



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