São Paulo, Sábado, 17 de Julho de 1999
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LUíS NASSIF
Um símbolo da modernidade

Governador de São Paulo, Franco Montoro não foi apenas das vozes mais relevantes da abertura, mas a esperança abortada de que seria possível a travessia democrática sem desequilibrar as contas públicas -como ocorreu em todos os demais processos de redemocratização, da Proclamação da República ao período pós-Estado Novo.
Montoro não tinha o brilho de fogo-fátuo de intelectuais que, como adolescentes, sonham em mudar o mundo, mas não dão passos em nenhuma direção. Nem agia como políticos vaidosos, que julgam que o supremo exercício da autoridade é ter a palavra final sobre cada ato de governo, ou disputar o mérito com cada auxiliar.
Montoro tinha a sabedoria dos grandes empreendedores. Sabia como formar uma equipe, casando a capacidade de pensar com a de agir. Ao contrário de FHC, sabia que há um lugar para o coordenador, um para o formulador e outro para o executivo -o membro da equipe incumbido de realizar o que foi idealizado.
No seu governo, o gerenciamento foi conduzido pelo então secretário do Planejamento, José Serra. Em nenhum momento se duvidou de que o governador, de fato e de direito, era o próprio Montoro.
Vinha-se de um final de ditadura, quando toda a racionalidade do regime militar tinha ido por água abaixo. Para manter o poder, as contas públicas haviam sido arrebentadas, tanto no plano federal quanto no estadual.
Em pleno processo de redemocratização, com a velha ordem política se esboroando, com uma geração de políticos populistas surgindo, e sem novos pactos de procedimento político, Montoro foi um exemplo de responsabilidade política. Ajudou a revelar uma brilhante equipe de auxiliares, que até hoje enriquece o serviço público. E trouxe para a incipiente democracia brasileira valores públicos fundamentais, como o respeito ao equilíbrio orçamentário, a ojeriza a práticas populistas.
Sem manobrar a retórica da modernização, sem grandes vôos retóricos, com sua bandeira de descentralização e de hortas comunitárias, conseguiu entender os novos valores da modernização, e os valores públicos eternos, muito mais amplamente do que presumíveis arautos dos novos tempos.
Montoro nunca se apequenou.

Reforma
No plano estritamente operacional, o novo ministério é um pouco melhor do que o anterior. Na Casa Civil, Pedro Parente conhece melhor os procedimentos administrativos, políticos e operacionais do que Clóvis Carvalho.
Apesar das inúmeras críticas que vem sofrendo, Clóvis é pessoa aberta a novos instrumentos gerenciais. Coube a ele o mérito de abrir espaço, dentro do governo -juntamente com Parente-, para programas de qualidade e para a revolução ocorrida no Orçamento, sob a batuta de José Silveira. Sua ida para o Ministério do Desenvolvimento interrompe um trabalho de construção que vinha sendo empreendido nos últimos meses. E seguramente ele não é o bate-bumbo que a bandeira desenvolvimentista deveria ter.
A saída de Celso Lafer e de Luiz Carlos Bresser Pereira é a prova máxima de que é preferível ter FHC como adversário do que como amigo.
A transferência de Andrea Calabi para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não faz sentido. Calabi é especialista em análise setorial e tem visão institucional apurada. Depois da grande revolução gerencial do Banco do Brasil, levada a efeito por Paulo César Ximenes, Calabi vinha procedendo a um "upgrade" importante, procurando redefinir o papel institucional do banco dentro da nova ordem econômica. Ou seja, o desafio BB era muito maior do que o desafio BNDES.
De qualquer modo, foram mudanças tópicas, cosméticas, que matam a esperança de que se pudesse produzir um fato político capaz de reverter o profundo processo de corrosão política do governo.
As verbas estaduais eram distribuídas sem solenidade, sem a característica comum aos governantes de tratar toda doação de dinheiro público como se fosse um presente pessoal.

E-mail: lnassif@uol.com.br


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