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São Paulo, sexta-feira, 17 de outubro de 2003

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LUÍS NASSIF

Saúde e desenvolvimento

O país corre dois tipos de risco se for aberto o precedente de incluir no orçamento da Saúde despesas de outras áreas -como o Fome Zero.
O primeiro é colocar em risco a própria saúde brasileira. As despesas com pessoal, Aids, vacinas e medicamentos estratégicos são elevadas e rígidas. Os investimentos são baixos em relação ao custeio do SUS. Os hospitais filantrópicos e Santas Casas -os que mais dependem do SUS- já estão em crise aberta.
Ao incluir o combate à pobreza no orçamento da Saúde, na prática tiram-se R$ 4 bilhões, que significarão cortes dramáticos nas despesas do setor. O conceito de que combater a fome é melhorar a saúde, no limite, poderá ser estendido até a Polícia Federal, que, ao combater as drogas, está indiretamente melhorando a saúde.
A emenda constitucional aprovada há três anos -definindo limites de gastos com saúde- prevê que as despesas deveriam acompanhar o PIB nominal. Ou seja, apenas compensar a inflação. A idéia era que Estados e municípios comprometessem 15% das receitas disponíveis até 2004. A maioria dos municípios está próxima ou ultrapassou esse percentual. Para depois de 2004, quando conclui a "escadinha", a emenda remeteu a regulamentação para uma lei complementar, capaz de dar mais flexibilidade às vinculações.
O segundo risco é em relação ao próprio desenvolvimento brasileiro. Os únicos indicadores que melhoraram na década foram os sociais, educação e saúde, e isso graças à vinculação de receitas. A crítica à vinculação é praticada por pessoas que vêem o país por meio da visão financeira de curtíssi- mo prazo, essa mescla de populismo de obras com visão primária de mercado.
Ph.D. pelo Departamento de Economia da Universidade Columbia, em Nova York, Paulo Tenani lançou recentemente o livro "Human Capital and Growth" ("Capital Humano e Crescimento"), pela editora M.Books.
Nele, analisa o papel do capital humano no processo de desenvolvimento sustentado, questão formulada pela primeira vez por Hirofumi Uzawa, em 1961. Em 1988, Robert Lucas, da Universidade de Chicago, publicou estudo relevante sobre o tema, que, desde então, passou a ser analisado sob diversos prismas.
O estudo de Tenani visa comprovar que o acúmulo de capital humano talvez seja tão importante quanto o de capital físico como forma de gerar crescimento. Com isso, tenta desmistificar a idéia de que capital humano -e investimentos em educação e saúde- esteja ligado apenas ao campo social, e não também ao campo econômico.
Desde meados da década de 50, o Brasil vem tentando crescer por meio da utilização de um único insumo de produção -capital físico- e direcionando suas políticas econômicas exclusivamente para o maior acúmulo, a melhor alocação e a maior produtividade desse insumo. Investimentos em capital humano -educação, treinamento ou cursos profissionalizantes- são tão essenciais quanto investimentos em capital fixo. E talvez, por esse motivo, educação (e saúde) tenha sido sempre o foco de políticas sociais -e nunca de políticas econômicas.

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