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Para José Senna, Selic sobe 1,5 ponto
agora e deverá se elevar em março
Carol Carquejeiro - 21.out.02/"Valor"
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O economista José Júlio Senna, da MCM Consultores Associados, que prevê mais alta dos juros |
DO PAINEL S.A.
Na última reunião do Copom, o
economista José Júlio Senna, 56,
sócio-diretor da MCM Consultores Associados, acertou em cheio.
Ele foi um dos poucos que previu
um aumento de 0,5 ponto percentual dos juros. Agora, às vésperas
de nova reunião do Copom, Senna prevê novo aumento. Desta
vez, o sinal será mais duro. Para
ele, pode ser até de 150 pontos
-ou seja, 1,5 ponto percentual.
Senna, cujo nome chegou a ser
cogitado para a presidência do
Banco Central do governo Lula,
acha que, dificilmente, no primeiro semestre, haverá uma queda
dos juros. "Nesta e na próxima
reunião, deverá haver aumento
dos juros", afirma o economista.
(GUILHERME BARROS)
Folha - Qual é sua previsão para a
reunião do Copom?
José Júlio Senna - Desde janeiro
do ano passado, na primeira carta
aberta do presidente do Banco
Central para o ministro da Fazenda explicando por que a meta de
inflação não foi atingida, ficou
muito claro que o BC define os juros ao comparar a projeção de inflação com a meta definida para o
ano. Na última reunião, por
exemplo, ficou claro que o modelo do BC projetava uma inflação
mais alta do que a meta. Muito
provavelmente isso vai acontecer
de novo. A meta ajustada a gente
conhece, que é de 8,5 %, e é muito
provável que a inflação projetada
para este ano seja de superior a
10%, e isso fatalmente irá exigir
um aumento de taxa de juros.
Folha - Em que proporção?
Senna - Entre os dois últimos
Copons, a expectativa de inflação
subiu de 11,2% para 12%. Subiu,
portanto, 80 pontos. Na fase em
que estamos, precisamos de um
aumento de juro real. Ou seja, o
juro nominal tem de subir pelo
menos cem pontos, ou seja, um
ponto percentual. Acho que o aumento será alguma coisa como
100, 150 pontos. O sinal, agora,
precisa ser mais forte. As chances
de uma redução da taxa de juros
neste semestre são muito baixas.
Eu não consigo ver espaço para
uma queda no primeiro semestre.
Nós devemos ter aumentos de juros nesta e provavelmente na reunião seguinte do Copom.
Folha - Isso, independentemente
de ter ou não guerra?
Senna - Eu diria que independentemente de ter ou não guerra.
Folha - Se houver guerra, então,
os juros vão dobrar?
Senna - É muito difícil prever o
que acontecerá no caso de uma
guerra. Grande parte desse fenômeno já está incorporado nos
preços de alguma maneira. Se
houver guerra, as pessoas não vão
poder dizer que não sabiam dessa
possibilidade. Guerra é algo trágico, que se sabe como entra, mas
não como sai. Eu não arriscaria
fazer uma previsão. O cenário que
estou traçando independe de haver guerra ou não. A chave no
nosso regime chama-se expectativa de inflação. E é essa variável
que precisa ser controlada. A
guerra pode complicar muito.
Folha - O Brasil talvez seja o único
país do mundo que nos últimos
dois anos tenha subido os juros. O
mundo todo está errado?
Senna - É verdade. A Europa
baixou juros, os Estados Unidos...
O problema é que a gente tem de
trabalhar dentro do arcabouço
que está disponível. E o arcabouço disponível é o modelo de "inflation targeting" [metas de inflação", que tem seus critérios. Se o
modelo aponta que a inflação está
acima da meta, não tem jeito. O
juro tem de subir. E o que está fazendo o modelo apontar inflações
mais altas? É o fato de as expectativas de inflação não estarem ainda controladas. Essas expectativas
vêm subindo seguidamente.
Houve até um período em que estacionaram, em janeiro, mas voltaram a subir novamente. Desde
setembro do ano passado, as expectativas de inflação são crescentes. Em setembro, a pesquisa revelava inflação de 5,5% projetada
para 2003. Hoje, já está em 12%.
Por isso, essa política ortodoxa
que está sendo posta em prática
está correta. Só não foi ainda suficiente para convencer as pessoas
de que a inflação vai ser de fato
domada. Isso é até compreensível.
Numa nova administração, leva
tempo mesmo para os BCs construírem sua reputação. E é esse o
fenômeno que está sendo criado.
O que o Banco Central tem de fazer é insistir nessa política.
Folha - Mas a recessão não é suficiente para segurar os preços?
Senna - A atividade econômica
está mais fraca agora. Os sinais do
início do ano são de que voltou a
arrefecer o ritmo de crescimento,
e isso já está sendo levado em conta no modelo do Banco Central na
escolha da meta ajustada. Se o BC
tivesse sido fiel à meta que já estava estipulada e não tivesse feito a
correção, nós estaríamos perseguindo uma política muito mais
austera, que provocaria uma desaceleração econômica ainda
maior. A inflação projetada continua lamentavelmente superior à
meta ajustada. Se o BC decidir
manter os juros, o que vai acontecer é que, provavelmente, as expectativas de inflação piorem
mais ainda e nós vamos acabar
tendo que conviver com níveis de
inflação muito mais altos do que
estamos dispostos a suportar. Isso
seria ainda muito mais prejudicial
para a economia brasileira.
Folha - Foi um erro adotar o regime de metas de inflação?
Senna - Não, eu acho que não. O
Brasil, apesar de toda essa sequência de choques, só conseguiu
manter taxas de inflação relativamente baixas por causa do regime
de metas de inflação. Se não tivéssemos implementado o regime de
metas de inflação, eu acredito que
a situação seria muito pior.
Folha - Não foram muito rigorosas as metas? Outros países que
adotaram a meta de inflação não
foram tão rigorosos como o Brasil.
Senna - Eu diria que elas foram
ambiciosas talvez até por um erro
de, no passado, o Banco Central
ter esticado demais a corda do regime de câmbio fixo, o que acabou gerando uma inflação zero,
mas que depois se viu que se tratava de um movimento artificial,
calcado numa política cambial irrealista. O Brasil não deveria ter
mirado zero de inflação.
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