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CAMINHO INVERSO
De tradicional importador do grão, país decide vender parte da safra ao exterior, o que preocupa a indústria
Brasil deverá exportar 600 mil t de trigo
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
No ano em que o país produz a
maior safra de trigo da história, os
moinhos resolveram pregar uma
peça nos produtores. Saíram do
mercado em plena safra, quando
a oferta do produto é grande.
Pior ainda, segundo o governo,
fizeram importações de agosto a
setembro, descumprindo um
acordo acertado com a cadeia
produtiva para a elevação da produção interna de trigo, produto
que o país sempre foi dependente.
As compras externas favorecem
os moinhos, que têm prazo maior
para pagar o produto.
Para os produtores, a intenção
dos moinhos foi provocar queda
nos preços. Já os moinhos dizem
que não têm capital de giro para
fazer estoques. A consequência
foi uma forte queda nos preços.
Negociada a R$ 33 no final do ano
passado, o que incentivou muitos
a optar pelo produto, a saca de trigo caiu para até R$ 19 nesta safra
no Sul, valor que não cobre os
custos de produção, segundo os
produtores.
Agora foi a vez de os produtores
colocarem os moinhos de orelha
em pé. Sem opção para venda do
trigo no mercado interno, o Brasil
está fazendo o que jamais se poderia imaginar: exportando trigo.
O volume das exportações começa a preocupar as indústrias, que
aumentaram a procura pelo produto interno na semana passada.
Na trilha do milho
O trigo repete a história do milho. Há três anos, o Brasil produziu uma supersafra de milho, produto que tradicionalmente era
destinado ao mercado interno. As
indústrias e as granjas também
saíram do mercado, e os preços
despencaram.
Pressionada pelo excesso de
produto e preços baixos, a Coamo
(uma das maiores cooperativas
do Paraná) começou a exportar
milho. Os preços internos passaram a ter relação com os externos.
Agora a Coamo abriu o mercado externo para o trigo. Esse início não está sendo fácil, diz Antônio Garcia, assessor comercial da
cooperativa. "Como fazer outros
países importadores entenderem
que o maior comprador mundial
de trigo agora está exportando o
produto?", pergunta ele.
"Mandamos amostras para vários países e fechamos o primeiro
contrato de 25 mil toneladas."
Garcia diz que os preços obtidos
são um pouco inferiores aos do
mercado externo, mas que as exportações são necessárias para
dar liquidez internamente.
O produto brasileiro é de boa
qualidade e, aos poucos, as exportações nacionais deverão atingir
os preços do mercado externo, diz
Garcia. "Foi assim com o milho."
Após a descoberta dos caminhos externos pela Coamo, as exportações estão crescendo. A própria Coamo está liderando um
pool de cooperativas paranaenses
e deverá colocar mais 50 mil toneladas do produto no mercado externo a partir de dezembro. A safra paranaense ficou próxima de 3
milhões de toneladas neste ano.
As exportações também foram
a saída no Rio Grande do Sul, o segundo maior produtor nacional,
com 2,1 milhões de toneladas. Os
gaúchos já acertaram a venda externa de 280 mil toneladas. Ao todo, paranaenses e gaúchos deverão exportar 600 mil toneladas de
trigo desta safra.
Se as exportações se confirmarem nesse volume, serão uma
marca ousada, já que o país importava de 7 milhões a 8 milhões
de toneladas há três anos. Em
2003, as importações devem ficar
abaixo de 50% do consumo nacional, que é de 9 milhões a 10 milhões de toneladas.
Vamos até a Lua
Bastante realista, Lawrence Pih,
do Moinho Pacífico diz que "os
moinhos querem trigo de qualidade e bons preços. Onde tiver esse produto, mesmo que seja na
Lua, vamos atrás". Mas reconhece
que o produtor também tem o direito de procurar o melhor preço
para o trigo, seja no mercado interno ou no externo.
Pih admite que as exportações
nacionais deixaram o mercado
um pouco nervoso na semana
passada, e muitas indústrias saíram às compras.
A tendência do mercado internacional é de alta nos preços no
momento. Se o produto exportado vai ser importado com preços
maiores ou nos mesmos patamares atuais nos próximos meses é o
mercado quem vai determinar,
diz Pih.
A lista de interessados no trigo
brasileiro é ampla e vai de tradicionais países importadores do
norte da África até europeus, como a Itália, que teve a agricultura
prejudicada neste ano por problemas climáticos.
Ataídes Jacobsen, assistente técnico da Emater/RS, diz que as exportações são um bom regulador
do mercado, que já está um pouco
mais tranquilo. As medidas do
governo para facilitar a comercialização, a elevação do dólar -que
onera as importações- e uma
produção mundial menor do que
o consumo ajudaram na recuperação dos preços.
Jacobsen diz que os produtores
gaúchos terminaram 2002 com a
saca de trigo a R$ 33. A saca recuou para R$ 19, mas as medidas
internas, como os contratos de
opção e as exportações, já fizeram
o trigo subir para R$ 21 no Sul.
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