São Paulo, segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

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LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA

Triste 2007


Não há razão para otimismo no Brasil: triste será 2007, tristes provavelmente serão os próximos quatro anos

EM MEIO às perspectivas sombrias que se abriram para o país com a reeleição de um presidente popular, mas sem o apoio da sociedade civil, havia ainda uma esperança no plano econômico. O presidente, ao qual não falta intuição, deu-se conta da quase estagnação do país e definiu uma meta de crescimento de 5% para 2007. Nas semanas seguintes, ficou patente que nem ele nem seus assessores sabiam como "destravar" o país; atribuiu-se a responsabilidade pelos maus resultados econômicos aos ambientalistas, à falta de segurança dos empresários de que não haverá outro "apagão" e a outros disparates do gênero. Na última quinta-feira, esta Folha desmanchou as esperanças que ainda poderiam existir: "Lula já admite que o país não cresce 5%", informa o jornal, e, em seguida, vem a explicação: "Ele ouviu de conselheiros econômicos com os quais se reuniu em segredo que deveria desembarcar especialmente dos 5%, pois sinalizaria um afrouxamento fiscal que produziria turbulências".
Ai do presidente que conta com tais conselheiros; ai do país cujo presidente os ouve! Desde 2003, a Argentina cresce a 9% ao ano. Eu imagino o que aconteceria se o presidente Néstor Kirchner contasse com conselhos tão sábios. Foram conselheiros dessa natureza -identificados com a ortodoxia convencional- que levaram Menem e Cavallo a seguir as políticas do desastre. O governo pós-crise só evitou a quase estagnação, à qual a ortodoxia convencional condena aqueles que a seguem, por haver posto de lado tais conselheiros. Em vez do tripé juro alto, câmbio baixo e ajuste fiscal frouxo, a Argentina optou por juro baixo, câmbio alto e ajuste fiscal duro e está crescendo extraordinariamente, tendo há muito superado o nível de renda pré-crise.
Os incríveis conselheiros ortodoxos do presidente Lula argumentaram que os 5% sinalizavam um "afrouxamento fiscal". Mas quem disse a eles que a forma de o Brasil crescer é gastando mais? São eles próprios que definiram metas fiscais frouxas, atingiram-nas e não resolveram o problema fiscal. Foram frouxos nos primeiros três anos do governo e, neste último ano de eleições, frouxíssimos: os gastos correm soltos.
Para o Brasil crescer 5% em 2005, as duas coisas que precisam ser feitas ao mesmo tempo reduzem os gastos públicos, não os aumentam: é necessário cortar o gasto corrente no limite e reduzir a taxa de juros real para abaixo dos 9%, que o Banco Central entende como sendo a "taxa de juros de equilíbrio". Se fizer isso e aumentar o investimento público, o setor privado também aumentará seus investimentos, e o país crescerá.
O problema central da economia brasileira está nos juros escandalosos e no câmbio sobrevalorizado, não na falta de gastos correntes.
Ao que tudo indica, porém, a ortodoxia convencional e seus inefáveis conselheiros já ganharam mais essa parada. Na medida em que ela é constituída pelos diagnósticos, conselhos e pressões que os países ricos fazem a seus competidores países em desenvolvimento, essa ortodoxia está cumprindo sua missão: reduzir a capacidade competitiva do Brasil. Não consegue mais fazer isso na Argentina ou na Rússia, nunca conseguiu na China ou na Índia, mas, no Brasil, onde a idéia de nação está quase perdida, ela é bem-sucedida. Para a coalizão política que controla o país desde os anos 1990, o que interessa são taxas de juro altas e câmbio baixo.
Terá o presidente Lula condições de se antepor a essa coalizão e a essa ortodoxia? Não há nenhuma indicação nesse sentido. É verdade que ele foi eleito pelo povão que é prejudicado, mas esse povão pode ser compensado pela Bolsa Família e pelo aumento do salário mínimo.
Já a classe média está imobilizada porque continua refém ou do distributivismo ou do monetarismo e não sabe mais o que sejam nação e desenvolvimento econômico. O quadro é mais positivo em relação aos empresários industriais, mas eles ainda não recuperaram a força perdida no final dos anos 1980.
Não há razão para otimismo no Brasil: triste será 2007, tristes provavelmente serão os próximos quatro anos.


LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 72, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda, da Reforma do Estado, e da Ciência e Tecnologia, é autor de "As Revoluções Utópicas dos Anos 60".

Internet: www.bresserpereira.org.br

lcbresser@uol.com.br

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