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ANÁLISE / SIDERURGIA
Bush dá nova vida a dinossauros do aço
EDWARD ALDEN
CAROLINE DANIEL
DO "FINANCIAL TIMES"
Quando o presidente
George W. Bush impôs tarifas de até 30% sobre o aço importado pelos EUA, no ano passado, afirmou que o objetivo era
"facilitar um ajuste positivo à
competição contra o produto importado".
Com o anúncio, na semana passada, de que a US Steel compraria
a National Steel e com a oferta de
tomada de controle acionário da
Bethlehem pelo International
Steel Group, que está sendo examinada, a controvertida política
protecionista parece estar perto
de um sucesso surpreendente.
Os acordos criariam duas empresas que ficariam entre os dez
maiores produtores de aço do
mundo, consolidando um setor
que durante muito tempo operou
de maneira altamente fragmentada, se comparado aos concorrentes da Europa e da Ásia.
Charles Bradford, presidente da
Bradford Research, uma consultoria especializada em metais, diz
que "uma mudança monumental
está ocorrendo", o que ampliará a
competitividade das siderúrgicas,
que vinham sendo consideradas
dinossauros corporativos praticamente inúteis. Com três ou quatro
siderúrgicas fortes, diz Bradford,
a indústria será capaz de conduzir
melhor as negociações, ajudando
a estimular os preços do aço, que
estavam em baixa histórica antes
da imposição das tarifas.
Interferência política
Mas advogados especializados
em comércio internacional e analistas do mercado siderúrgico demostram menos otimismo quanto à perspectiva de que os acordos
tenham efeito em termos de aliviar as tensões internacionais
quanto ao comércio de aço. Em
curto prazo, alegam eles, os problemas podem ficar ainda piores.
Richard Cunningham, advogado do escritório Steptoe & Johnson, que representa a siderúrgica
britânica Corus, diz: "Trata-se de
um setor que sempre recorreu, e
continuará recorrendo, à interferência política em busca de proteção contra as importações quando a economia se desacelera e as
importações aumentam. Não se
deve esperar que o resultado das
medidas seja a paz no mercado
internacional de aço".
O governo Bush, ao decidir impor tarifas contra as importações
de aço em março passado, ofereceu uma defesa desgastada: a proteção ofereceria ao setor uma
"pausa para reorganização" e
ajuste aos produtos importados
de baixo custo. Mas as medidas
protecionistas anteriores, incluindo as restrições "voluntárias" de
importação da década de 80, não
conseguiram atingir esse objetivo.
A natureza abrangente do programa tarifário de Bush, no entanto, mudou a dinâmica do mercado. Além da proteção tarifária,
Bush exigiu uma reestruturação
do setor siderúrgico norte-americano como contrapartida e tomou providências objetivas para
cobrir parte dos dispendiosos planos de aposentadoria de antigos
operários siderúrgicos. Uma cláusula acrescentada discretamente
ao projeto de lei de comércio internacional do ano passado pode
ajudar a cobrir as despesas de saúde com aposentados.
Thomas Usher, presidente do
conselho da US Steel, diz que,
"sem o programa do presidente,
teria sido difícil chegar ao ponto
em que estamos hoje. Bush reconheceu a necessidade de empresas mais fortes e compreendeu
que temos companhias capazes
de competir mundialmente".
"100% essencial"
Wilbur Ross, presidente do conselho do International Steel
Group, que foi criado em fevereiro do ano passado com a aquisição da falida LTV, afirma, sobre
as tarifas: "Elas foram muito importantes. Assumimos o compromisso de comprar a LTV uma semana antes do anúncio das medidas de Bush. Fizemos porque nos
parecia que ele faria algo de significativo. Jamais teríamos feito a
oferta que fizemos sem isso".
Depois da imposição das tarifas,
em março do ano passado, os preços do aço laminado a quente subiram da marca de US$ 220 a tonelada, em janeiro de 2002, para
quase US$ 400 em julho.
Importante para as siderúrgicas
dos EUA, as tarifas perturbaram
as relações entre os compradores
de aço norte-americanos e as siderúrgicas estrangeiras, forçando
os consumidores a correr em busca de alternativas. As tarifas ajudaram a "criar um deslocamento
das importações que nos deu a
oportunidade de reencontrar
clientes", diz Ross. "Foi uma medida 100% essencial."
Acordo
As empresas e o sindicato dos
siderúrgicos usaram a oportunidade para adotar mudanças que
prometem ser radicais nas práticas de trabalho que governam a
indústria do aço.
Em suas negociações com o International Steel Group, o sindicato dos operários da indústria siderúrgica norte-americana concordou em abandonar um contrato coletivo de 750 páginas, eliminando uma série de regras restritivas que vinham prejudicando
a produtividade. A empresa, de
sua parte, aceitou eliminar diversos escalões hierárquicos de sua
burocracia, entregando a administração do dia-a-dia das usinas
aos operários.
Se um acordo como esse puder
ser negociado na US Steel e nas
demais siderúrgicas integradas,
os analistas concordam em que o
provável resultado seria uma redução no número de empresas e a
criação de companhias mais competitivas contra o aço importado
de baixo custo.
Produção maior
O governo Bush está esperando
que isso torne as siderúrgicas norte-americanas menos dependentes do protecionismo comercial.
Mas os especialistas em comércio
externo dizem que a chance de
que isso aconteça é pequena.
O efeito mais imediato, em contraste, provavelmente será um aumento na capacidade de produção de aço dos Estados Unidos,
resultando em maior competição
de preço entre as siderúrgicas integradas, as eficientes miniusinas
como a Nucor e os fornecedores
estrangeiros.
Os preços do aço já se deterioram diante de novos concorrentes, nos países em desenvolvimento, e da reabertura de unidades siderúrgicas norte-americanas como as usinas da LTV.
Sindicato aprova
Leo Gerard, presidente do sindicato dos operários siderúrgicos,
diz que um elemento-chave do
acordo entre sua organização e o
International Steel Group era o fato de que a empresa poderia empregar a produtividade aumentada para ampliar sua capacidade e
sua fatia de mercado, e não para
reduzi-las. "Fazia muito tempo
que uma empresa não dizia que
queria crescer, produzir mais aço
e reconquistar seus mercados."
Mas Cunningham, o advogado
da Corus, diz que a competição de
preços intensificada significará
mais pedidos de protecionismo.
Antes que as tarifas expirem, em
março de 2005, "a indústria siderúrgica norte-americana estará
pedindo que a proteção seja prorrogada", afirma.
Tradução de Paulo Migliacci
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