São Paulo, terça-feira, 19 de fevereiro de 2002

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OPINIÃO ECONÔMICA

Eleição não é um piquenique

BENJAMIN STEINBRUCH

Com uma ou outra dúvida, estão praticamente desenhadas as candidaturas às eleições presidenciais de 3 de outubro. Aliás, já estava mesmo na hora, visto que faltam pouco mais de sete meses para a votação em primeiro turno.
Quem pretende participar da eleição como candidato precisa apresentar à sociedade seus compromissos, conseguir sustentação política para o futuro governo e mostrar ao país os quadros de apoio que o ajudarão a governar em caso de vitória.
Compromissos não são promessas vagas de aventureiros, mas programas concretos, com resultados que serão cobrados no futuro. Um documento divulgado em janeiro pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, sob o título "O Brasil de todos nós", dá um bom roteiro de lição de casa aos candidatos que pretendem ser levados a sério.
O discurso desenvolvimentista virou consenso entre os candidatos. Não há um só, de situação ou oposição, que não adote a idéia de que o crescimento da economia deve ser prioridade nš 1 do novo governo, preservada a estabilidade do Real. Já é um bom caminho, mas isso não basta.
O roteiro da Fiesp é uma lição porque sugere metas quantitativas que o novo governo deve adotar desde a campanha. Há quase três décadas o Brasil não tem planos de desenvolvimento. As únicas metas definidas e perseguidas são as decorrentes de acordos com o FMI, sobre dívida pública, déficit em relação ao PIB e outros parâmetros macroeconômicos.
Os compromissos do próximo governo precisam ir além tanto das metas macroeconômicas quanto dos genéricos discursos desenvolvimentistas. Por isso, os candidatos sérios terão de dizer, por exemplo, quantos milhões de empregos se comprometem a criar e qual a taxa de crescimento econômico que pretendem perseguir. A Fiesp dá uma boa pista: 4,8 milhões de novos postos de trabalho de 2003 a 2006 e expansão média do PIB de 4% ao ano.
Antes de assumir compromissos, os candidatos terão de acionar suas equipes de planejamento, para estudar propostas e dialogar com a sociedade. Já estão atrasados nessa tarefa, mas, de qualquer forma, ainda têm sete meses para isso, um tempo precioso que deve ser ocupado com campanhas afirmativas.
Promessas de candidatos só têm sentido se apoiadas em ações práticas e de viabilidade comprovada. Um exemplo: o candidato promete reduzir o índice de mortalidade infantil de 34 para 18 em quatro anos, como propõe a Fiesp. Então terá de dizer qual o volume de dinheiro a ser investido nessa tarefa e de onde virão os recursos.
Outro exemplo: o candidato promete alcançar um superávit comercial de US$ 17 bilhões em 2006, essencial para reduzir a dependência externa do país. Então deverá definir como vai estimular o aumento da competitividade da empresa brasileira para expandir as exportações e substituir importações, além de outras ações diplomáticas e comerciais que o ajudarão a alcançar o objetivo.
Claro que não é fácil fazer tudo isso. Preparar um plano, discuti-lo com a sociedade, fixar metas quantitativas e depois cumpri-las, tudo isso pressupõe competência, capacidade de organização, trabalho e obstinação. Mas isso é o mínimo que se exige de alguém que pretende ser presidente da República.
Eleição presidencial não é piquenique nem campo de experimentação para aventureiros. Experiências burocráticas, com pessoal que entra no governo, comete erros e sai sem que nada aconteça, devem ser coisa do passado. O novo governo, de situação ou oposição, precisa de gente que assuma compromissos com a nação, disposta a lutar para levar o país ao bem-estar.
Acabou o Carnaval. Quem quiser entrar no páreo terá de suar a camisa.


Benjamin Steinbruch, 47, empresário, é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.

E-mail - bvictoria@psi.com.br


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