UOL


São Paulo, quinta-feira, 19 de junho de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OPINIÃO ECONÔMICA

Taxa de juro e metas de inflação

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

O copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) deu ontem, finalmente, um pequeno passo na direção certa. A diminuição da taxa básica de juro foi modesta. Uma queda de 0,5% não vai modificar o quadro econômico. Teria sido possível anunciar uma diminuição um pouco maior, talvez de 1%. Ou indicar um viés de baixa ou, ainda, combinar a redução da taxa de juro com alguma redução dos compulsórios sobre depósitos bancários.
Em todo o caso, já é alguma coisa. Pode-se interpretar a decisão de ontem como o início de uma flexibilização da política monetária a ser executada ao longo dos próximos meses. Ainda que não tenha, por si só, grandes efeitos práticos, a queda da taxa básica pode injetar algum ânimo na economia, desde que seja considerada como o começo de um movimento gradual na direção de juros mais civilizados, isto é, mais compatíveis com o que se observa no resto do mundo e com alguma reativação da atividade econômica no Brasil.
Por que o gradualismo? O que impediu o Banco Central de ser mais agressivo e reduzir a taxa, digamos, em dois ou três pontos percentuais?
Parte do problema está na forma como a Fazenda e o Banco Central se posicionaram no passado recente. O Banco Central caiu em uma armadilha que é, em parte, obra sua. Prevaleceu a idéia de que, para apagar o estigma "petista" e conquistar a confiança dos mercados financeiros, o governo Lula teria que ser, pelo menos no início, mais realista do que o rei. Em outras palavras, entendeu-se que seria preciso aderir à agenda ortodoxa de forma mais rigorosa do que vinha fazendo o governo FHC. Isso significou gerar superávits fiscais primários ainda maiores, propor uma reforma previdenciária mais dura e praticar uma política monetária rígida e intransigente.
Desde a reunião de maio do Copom, quando se decidiu manter os juros básicos inalterados em 26,5%, cresceram as reações contra a política econômica e, em especial, contra os juros altos. Fora dos meios bancários, poucos se animavam a defender a política monetária. Foi ficando evidente que a Fazenda e o Banco Central estavam indo longe demais. Se o Copom não tivesse reduzido a taxa de juro ontem, haveria um escândalo de proporções nacionais.
Tudo isso tem sido debatido à exaustão. Taxa Selic, viés de baixa, Copom foram incorporados à linguagem popular. Menos atenção tem sido dada a um outro aspecto, não menos importante, da política monetária: a definição das metas de inflação. As metas estabelecidas no início do ano (8,5% para 2003 e 5,5% para 2004) são excessivamente ambiciosas.
Ao tomar essa decisão, o governo agravou o dilema, que existiria de qualquer maneira, entre combate à inflação e crescimento econômico. Repetiu-se um erro que já vinha sendo cometido no governo FHC.
Até o final deste mês, o Conselho Monetário Nacional definirá a meta de inflação para 2005. É o momento para retificar o erro. Deve-se considerar a possibilidade de aumentar a meta de inflação para 2004 e, simultaneamente, ser modesto na definição da meta para 2005. Além disso, conviria ampliar um pouco a margem de tolerância.
Não acredito que a reputação do governo vá ficar prejudicada se o Conselho Monetário Nacional estabelecer metas de inflação de, por exemplo, 7% para 2004, com um teto de 10% e um piso de 4%, e de 5% para 2005, com um teto de 8% e um piso de 2%.
Um pouco mais de realismo e de flexibilidade na implementação do regime de metas para a inflação pode ampliar o raio de manobra do Banco Central e facilitar a diminuição dos juros ao longo dos próximos meses.


Paulo Nogueira Batista Jr., 48, economista, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP e professor da FGV- EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).

E-mail - pnbjr@attglobal.net


Texto Anterior: Medidas desesperadas: "Coração do crédito" ignora Copom
Próximo Texto: No vermelho: Dívida pública sobe R$ 16 bi em maio
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.