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São Paulo, quinta-feira, 19 de junho de 2003

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LUÍS NASSIF

Preparando o segundo tempo

É bom começar a pensar em um novo presidente do Banco Central para o segundo semestre. Há várias razões para isso. A primeira é que dr. Henrique Meirelles perdeu o "timing" para a redução da taxa de juros. Além disso, ficou preso a uma armadilha retórica. Para se defender das críticas, radicalizou a retórica de tal maneira que qualquer tentativa de acelerar a queda de juros será interpretada como interferência política. E sem a queda rápida das taxas arrisca-se a jogar o país em uma recessão e aumentar dramaticamente a dívida interna.
A segunda razão é que o dr. Meirelles não tem conhecimento nem experiência técnica para conduzir a uma redução rápida das taxas sem incorrer em barbeiragens. Grande parte do imobilismo atual do BC em relação aos juros é a falta de segurança técnica de sua diretoria para ousar vôos maiores e necessários.
A terceira razão é que Meirelles representa, hoje em dia, uma ortodoxia vazia e sem resultados. Em caso de desgaste maior do governo Lula com a recessão, haverá a necessidade de retomar a política econômica em bases menos ortodoxas. Hoje em dia, o governo Lula está acuado à esquerda por defensores de uma ruptura com as regras do jogo e a geração de superávit. Meirelles e seu exército não demonstraram ter envergadura técnica para uma discussão mais aprofundada sobre o tema. Quando seu discurso se esvaziar, por ausência de resultados, ou o governo como um todo entra em crise ou se utiliza o expediente de praxe: substitui a parte central das críticas por pessoas que possam proceder à necessária mudança de rumo sem turbulências maiores.
É importante que o governo Lula se dê conta de que já possui credibilidade no mercado e que, a partir dessa base, o jogo não pode ser mais o de satisfazer a todas as demandas criadas diariamente, sob o risco de comprometer os fundamentos da economia, pelo crescimento da dívida interna e da vulnerabilidade externa.
O governo já conseguiu se cercar de interlocutores relevantes e com experiência. Por isso terá condições de proceder à mudança consolidando o papel do BC, reduzindo essa rigidez cega que está afundando a economia e, a médio prazo, comprometendo a governabilidade.

"Papers"
Todos os grandes bancos centrais do mundo fizeram de seu site uma prestação de contas à sociedade. Esmeram-se em disponibilizar dados, em abrir discussões, em explicar medidas. No site do Banco Central brasileiro, a maioria absoluta dos trabalhos é de "papers" em inglês. Inclusive o último trabalho do ex-presidente da instituição Armínio Fraga constatando tardiamente o que muitos analistas alertaram quando da implantação do sistema de "metas inflacionárias". A constatação é que economias emergentes possuem aberturas externas menores, sujeitando sua economia a uma grande volatilidade cambial, com implicações diretas sobre inflação -cenário não observado em economias desenvolvidas, onde essa teoria foi criada.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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