São Paulo, domingo, 19 de agosto de 2001

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DESACELERAÇÃO

Após boom de quase um ano, setor vende menos, suspende lançamentos que já estavam programados e demite

Construção civil sente a freada do PIB

FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL

A indústria da construção civil, dona de 9% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional, já sente nos canteiros de obra o impacto da desaceleração da economia do país revelada pelo IBGE na semana passada.
Depois de viver um boom por pelo menos um ano, o setor começa a vender menos, a suspender lançamentos de empreendimentos que já estavam programados e, consequência final dos momentos de aperto, a demitir.
Foi no segundo trimestre deste ano que veio a surpresa ruim. De abril a julho, o PIB do setor cresceu 0,3% em relação a igual período do ano passado. Bem menos do que os 4,2% registrados no primeiro trimestre deste ano em relação a igual período de 2000.
As demissões são um sinal de alerta. O nível de emprego na construção civil, que vinha crescendo até abril, caiu 0,57% de maio a julho deste ano no Estado de São Paulo.
Isso significou a demissão de 2.232 trabalhadores no Estado, segundo o Sinduscon (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo). O setor emprega no Estado de São Paulo cerca de 390 mil pessoas e cerca de 1,3 milhão em todo o país.
As dispensas, que começaram há três meses, estão se acentuando. Em maio, o nível de emprego do setor caiu 0,26% sobre abril (1.043 demissões). Em junho, houve nova queda, de 0,26% sobre maio (1.013 demissões). Em julho, o nível de emprego caiu mais ainda -0,31% (1.217 demissões) sobre junho.
"Estamos preocupados. É cada vez mais frequente ver demissões assim que as obras são concluídas", afirma Antonio de Sousa Ramalho, presidente do sindicato dos trabalhadores na indústria da construção civil em São Paulo.
O sindicato, diz ele, está efetuando 360 homologações de trabalhadores por semana, em média, desde o mês passado. Até então, a média era de 50 homologações por semana. Não estão incluídas nesse número as homologações feitas na DRT (Delegacia Regional do Trabalho).
Os investidores em imóveis estão mais cautelosos. Segundo o Sinduscon, o número de lançamentos de prédios caiu 19,6% de janeiro a julho deste ano em relação a igual período do ano passado, de 15.678 empreendimentos para 12.601 edifícios.
"Os últimos meses estão muito tumultuados para o setor. Crise na Argentina, dólar mais caro e juros altos deixaram os investidores mais cautelosos", diz Gerson Luiz Bendilati, diretor da Inpar, construtora e incorporadora.
A Inpar, diz, estava preparada para lançar 11 empreendimentos neste ano, mas optou por segurar quatro. "Não adianta. As vendas dos imóveis não deslancham com os juros assim tão altos."

Lançamento suspenso
A construtora decidiu suspender o lançamento de quatro edifícios residenciais. São apartamentos de três dormitórios, que custam cerca de R$ 150 mil, em média, e de quatro dormitórios, que custam até R$ 350 mil.
Se o mercado se mostrar mais ativo, a Inpar pode mudar de idéia, diz Bendilati. A construtora, que previa faturar R$ 350 milhões neste ano, já se conformou em repetir a receita do ano passado, de R$ 260 milhões.
"O mercado está em banho-maria. O investidor perdeu a confiança, ainda mais agora que o próprio governo se assustou com a queda da atividade econômica", afirma Artur Quaresma Filho, presidente do Sinduscon.
O sindicato dos trabalhadores tem uma previsão pessimista. Trabalha com a estimativa de 45 mil demissões até o final do ano no Estado de São Paulo. Se esse cálculo estiver certo, o setor vai perder mais trabalhadores do que chegou a contratar no último ano no Estado de São Paulo.
Em julho do ano passado, a indústria da construção paulista empregava 374.437 pessoas. Em julho deste ano, 391.942. Significa que, nos últimos 12 meses, o setor admitiu 17.505 trabalhadores.
Os empresários do setor ainda têm dúvidas sobre a intensidade da queda da atividade do setor. "Mas não há dúvida de que o setor vai continuar desacelerando", afirma Ana Maria Castelo, coordenadora do departamento de economia do Sinduscon.
Segundo ela, além de os juros estarem elevados, o que também desestimula tanto quem pretende construir como quem pretende comprar um imóvel é a contração da massa salarial. No primeiro semestre deste ano, a massa salarial ficou estagnada, depois de crescer 3,7% em 2000 e 5,2% em 99. "Agora vamos sentir mais ainda os efeitos disso", diz Ana Maria.
O Secovi (Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais do Estado de São Paulo) já vê o mercado retraído. Em junho, informa, a velocidade de vendas de imóveis (unidades vendidas sobre as unidades ofertadas) foi de 8,8%. Dados preliminares do sindicato mostram que esse percentual não deve passar de 8% em julho.
Em maio, a velocidade de vendas de imóveis foi de 9,5%, a maior deste ano. No ano passado, os melhores meses foram julho e agosto que registraram, respectivamente, 12,1% e 12,4%.


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