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São Paulo, segunda-feira, 20 de janeiro de 2003

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COMBUSTÍVEIS

Pesquisa da agência revela quem compra e vende abaixo do custo, mas setor de fiscalização não leva dados em conta

ANP ignora "mapa" da gasolina fraudada

FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL

Na lista de preços publicada mensalmente no site da ANP (Agência Nacional de Petróleo) para orientar o mercado de combustíveis aparecem postos que compram e vendem gasolina a preços abaixo de custo.
O que aparentemente é uma boa notícia para o consumidor revela, na realidade, falta de rigor da agência na fiscalização, pois a prática de comercialização de combustíveis a preços muito baixos é forte indício de adulteração de produto e sonegação de impostos, além de concorrência desleal.
Segundo distribuidoras e postos ouvidos pela Folha, a principal falha da ANP -que tem como principal função regular e fiscalizar o setor- é não cruzar as informações de dois dos seus departamentos: o que faz o levantamento de preços nos postos de gasolina e o que sai a campo para monitorar a qualidade de combustíveis. A combinação dos dados facilitaria a identificação de estabelecimentos irregulares.
A ANP levanta preços, mensalmente, em cerca de 16 mil postos em 411 municípios de todo o país. Também monitora a qualidade de combustíveis em cerca de 26 mil postos brasileiros.
Do grupo de 257 postos consultados pela própria ANP no Rio de Janeiro no período de 5 a 11 deste mês, como informa o site da ANP (www.anp.gov.br), 202 adquiriram gasolina de distribuidoras a preços abaixo do custo das próprias distribuidoras, pelos cálculos do Sindicom (sindicato das companhias de combustíveis), feitos a pedido da Folha.
No período pesquisado, segundo informa o sindicato, o custo da gasolina para as distribuidoras no Rio, sem acréscimo de impostos e margens, era de R$ 1,84 por litro (atualmente está em R$ 1,89). O site da ANP mostra que há postos que adquiriram o litro da distribuidora a R$ 1,55 para vendê-lo ao consumidor a R$ 1,85. Em outras capitais do país a situação se repete, segundo as distribuidoras.
A inclusão na lista da ANP de estabelecimentos que comercializam gasolina a preço abaixo do custo mostra, para distribuidoras e postos ouvidos pela Folha, que a agência não está cumprindo, pelo menos no ritmo em que deveria, sua função de fiscalização.
O Sincopetro, sindicato que reúne os postos paulistas, vai encaminhar hoje à ANP notificação para pedir fiscalização e eventual punição dos postos listados no site da agência que comercializam gasolina a preços abaixo de custo ou inferiores aos que garantem a margem de lucro média de mercado para postos (entre R$ 0,15 e R$ 0,25 por litro) e distribuidoras (entre R$ 0,05 e R$ 0,10 por litro).
"A ANP tem de estar mais ativa", afirma José Alberto Paiva Gouveia, presidente do Sincopetro. Para ele, a agência também falha porque não despreza os preços abaixo de custo para calcular o preço médio da gasolina. Esse preço serve como orientador do mercado para o consumidor.
A Shell, uma das maiores distribuidoras de combustíveis do país, informa que encaminhou à ANP no ano passado 49 denúncias de postos que estariam operando de forma irregular. Teve resposta da agência sobre nove denúncias, que geraram três autuações.
A manutenção de preços excessivamente baixos na lista publicada pela ANP, na análise de alguns donos de postos, poderia ser também um instrumento para "segurar" a inflação. Pelos cálculos do Sindicom, se todas as distribuidoras e postos trabalhassem com preços e margens adequados à realidade do mercado, o preço da gasolina na bomba estaria hoje entre R$ 2,09 e R$ 2,24 no Rio e entre R$ 2,01 e R$ 2,16 em São Paulo. O preço médio do litro comercializado na cidade do Rio de Janeiro no período, pelo site da ANP, era R$ 2,07.
Enquanto isso, o Posto Taquara, localizado no bairro da Taquara (Rio), que aparece no site da ANP, na quinta-feira passada vendia o litro da gasolina a R$ 1,86. O custo do produto, segundo o Sindicom, já está em R$ 1,89 para as distribuidoras. Sobre esse preço as distribuidoras normalmente acrescentam entre R$ 0,05 e R$ 0,10 por litro, e os postos, entre R$ 0,15 e R$ 0,25. "Vendo barato porque compro direto da distribuidora e tenho frota de caminhões", diz Fábio Souza, dono do Taquara.


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