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OPINIÃO ECONÔMICA
A BM&F e os riscos do dólar
RENATO JUNQUEIRA
A flutuação do câmbio e
um relatório do BIS (Bank for
International Settlements, na sigla
em inglês) sobre os mercados derivativos chamaram a atenção da
opinião pública para o papel da
BM&F nesse contexto. Segundo o
BIS, os valores em giro nos mercados derivativos atingiram, no último trimestre do ano passado, US$
279 trilhões. Isso equivale a mais
de 20 vezes o PIB dos EUA ou da
União Européia.
Pelo gigantismo dos números e
por se tratar de questão complexa,
passou despercebido o giro dos
derivativos fora de Bolsas, no balcão ("Over the Counter" ou OTC),
de US$ 220 trilhões. Cerca de 87%
do volume global de OTC é juro e
câmbio.
É natural que o câmbio provoque emoções, pois está em jogo o
valor de troca da moeda nacional.
A BM&F passou a ocupar um lugar de destaque nesse cenário por
três motivos: primeiro porque oferece ao mercado o único contrato
futuro regulado e auto-regulado
no Brasil para cobrir riscos cambiais. Segundo porque administra
uma "clearing" de câmbio que liquida diariamente cerca de 90%
das transações interbancárias.
Terceiro porque vem desenvolvendo em parceria com o BID mecanismos para compensar fluxos
financeiros no comércio da América Latina.
O Brasil terá, nesse contexto, de
optar pelo tamanho e mecanismos
de Bolsa que quer utilizar. A escala
operacional é fundamental. O giro
dos derivativos em Bolsa no Brasil
em comparação com o PIB é, ainda, menos da metade do que acontece nos EUA ou na Europa.
É visível o interesse dos bancos
centrais em trazer para mercados
regulados e transparentes de Bolsa
as operações com derivativos que
caibam em seus formatos contratuais clássicos. A migração para o
balcão global pode tornar irrelevante a atuação do órgão regulador local e dificultar o acesso das
empresas de menor porte aos derivativos de juros e câmbio.
A busca de transparência e o fortalecimento da auto-regulação por
meio das Bolsas podem aumentar
mais ainda os volumes negociados
na BM&F, o que, felizmente, parece estar acontecendo aqui. Há especulação nos mercados derivativos? Há, da mesma forma que há
busca permanente de hedge (cobertura/seguro de preço). Qual a
alternativa para esses mercados?
Se forem engessados em Bolsa, o
giro sem transparência aumenta.
A melhor indicação da vantagem do desenvolvimento dos
mercados futuros no Brasil está
nos balanços de algumas empresas que se cobriram adequadamente contra a volatilidade das
commodities e declararam aos
acionistas que essa foi uma das razões de sua lucratividade. Infelizmente, existem tesourarias competentes e empresas que preferem
transferir riscos para o Estado ou
para a contínua desvalorização da
moeda brasileira.
Quando se fala sobre o dólar,
muitas vezes assume-se, também,
apenas o lado do devedor, esquecendo o poupador. Se dois aplicadores tivessem entregue sua poupança a fundos de pensão no início do ano 2000 (quando foi lançado o euro), quem aplicou em
dólar teria hoje US$ 1 para cada
dólar e quem aplicou em euro teria US$ 1,32 para cada dólar. Essa
comparação não leva em conta as
taxas de juros, a inflação ou políticas públicas e outros fatores externos que podem influir no giro
em Bolsas. Não é apenas no Brasil
que a volatilidade do dólar aumentou o giro: cresceram substancialmente os volumes nas Bolsas internacionais. Precisamos
definir se queremos hedge aqui
ou lá fora.
Os derivativos servem para gerenciar a volatilidade. À medida
que se politiza o tema, os mercados futuros encurtam os prazos e
podem ficar mais caros. No passado, na ausência dos derivativos,
os mais bem situados e com
maior musculatura política rasparam o fundo do tacho dos recursos públicos, "mamando nas
tetas do governo", como se costuma dizer.
Renato Junqueira é presidente em
exercício do Conselho de Administração
da BM&F.
Excepcionalmente, hoje, a coluna de
Rubens Ricupero não será publicada.
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