São Paulo, quarta-feira, 20 de junho de 2001

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COMENTÁRIO

"Novo câmbio é de alto risco"

DO "FINANCIAL TIMES"

A argentina está com problemas de novo. Depois de sua recente e bem-sucedida operação de troca de títulos, o país parecia reconquistar a confiança dos investidores, mas o plano de introduzir um câmbio duplo fez com que eles saíssem correndo em busca de abrigo, uma vez mais.
O plano tem lá sua lógica. A Argentina é um dos poucos países do mundo que tem sua moeda ainda atrelada ao dólar dos EUA e a economia do país sofreu muito devido à força do dólar.
Abandonar esse vínculo é praticamente impossível, a curto prazo, no entanto, já que a maioria das dívidas da Argentina são denominadas em dólares. O plano de Domingo Cavallo, o ministro da Economia, significa impor uma tarifa às importações e conceder um subsídio equivalente às exportações de seu país. O objetivo é melhorar a competitividade econômica sem causar problemas com relação à dívida do país.
Ao usar a média das taxas de câmbio do dólar e do euro, o sistema duplo de pagamentos também ofereceria a vantagem de manter o alinhamento com um plano de Cavallo para um futuro mais distante, o de vincular o peso a uma cesta cambial composto das duas moedas, assim que o euro e o dólar atingirem paridade.
Mas o mecanismo adotado apresenta dois sérios problemas. O primeiro é que qualquer sistema de câmbio diferencial encoraja distorções e corrupção. Os exportadores tentarão inflar o valor de seus produtos; os importadores, de sua parte, procurarão por maneiras de evitar o pagamento da tarifa.
O segundo problema é que os mercados financeiros odeiam o plano. Da mesma forma que as propostas anunciadas por Cavallo para uma possível cesta de equivalência cambial baseada no euro e no dólar causaram forte alta nas taxas de juros do país em abril, esta semana o fator de risco da Argentina parece ter disparado de novo. Juros mais altos farão com que ressurjam os temores quanto a uma possível moratória.
Dados esses problemas, talvez fosse melhor não mexer no câmbio e aceitar um novo período de estagnação. O problema de competitividade não é insuperável. A Argentina é uma economia relativamente fechada e as exportações ainda estão crescendo. Depois de um período de deflação de salários e preços, o retorno da confiança pode ter encorajado novos investimentos e crescimento.
Mas, à medida que o país enfrenta seu terceiro ano de recessão, é fácil ver por que Cavallo está explorando todos os meios possíveis para impulsionar o crescimento. Se o plano de câmbio for acoplado a uma política fiscal sensível e a mais reformas estruturais, pode ser que funcione.
Não há como negar que se trata de uma estratégia de alto risco. Se Cavallo fracassar em vender sua política mais recente aos mercados -e os primeiros sinais não são muito bons-, os danos causados pelos juros mais altos superarão com facilidade os benefícios gerados pelas condições de comércio externo melhoradas. O ministro argentino está apostando que sua credibilidade bastará para fazer com que esse plano nada ortodoxo funcione.



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