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OPINIÃO ECONÔMICA
O euro forte e o Brasil
GESNER OLIVEIRA
Os brasileiros que viajaram
para o exterior nestas férias de
julho notaram que um sanduíche
e uma cerveja em Nova York podem facilmente custar R$ 50 reais.
A conta é muito mais salgada para quem viajou para os países europeus que adotaram o euro, em
função da apreciação dessa moeda em relação ao dólar.
Essa percepção do turista sugere
os efeitos mais gerais sobre a economia. Como o real tem o dólar
como referência, e o dólar se depreciou comparativamente ao euro, o real está ainda mais depreciado em relação ao euro.
No início da tarde de ontem um
euro estava cotado em algumas
corretoras de São Paulo a R$ 2,97.
Este valor está 29% mais alto que
nas férias de julho do ano passado, quando o mesmo euro custava
R$ 2,30.
Os preços dos bens na União Européia subiram apenas 2% desde
julho passado. No caso de alguém
que tenha obtido a correção de seu
salário pela inflação dos últimos
12 meses, seu rendimento cresceu
7,3% no mesmo período. Ao fazer
as contas, o turista brasileiro que
visitou a zona do euro nestas férias perceberá uma elevação real
de preços de cerca de 23% em
comparação com as férias do ano
passado. Para quem optou pelos
EUA, o aumento foi de 7,6%. Moral da história: é melhor viajar pelo Brasil.
A contrapartida do empobrecimento do turista brasileiro no exterior é o aumento da competitividade das exportações brasileiras.
Os itens da pauta brasileira se tornaram mais baratos comparativamente aos bens e serviços europeus e, em menor escala, aos dos
EUA.
O movimento da moeda nacional vis-à-vis os dinheiros nacionais vem se tornando cada vez
mais importante com a globalização e com o surgimento de múltiplas áreas monetárias com o dólar, iene e agora o euro, em contraste com a nítida hegemonia de
um padrão monetário na maior
parte dos últimos dois séculos (libra-ouro, dólar-ouro e dólar).
Em um país com vocação de comerciante mundial ("global trader"), isto é, com vendas diversificadas para a União Européia,
EUA e Ásia, a dança das principais moedas importa, e muito.
O ganho de competitividade relativamente à União Européia
tende a ser favorável ao Brasil
porque a corrente de comércio
com aquele bloco é ligeiramente
maior do que com os EUA.
Das exportações brasileiras,
26% são dirigidas à União Européia e 27% das importações provêm daquele bloco. 25% das vendas externas vão para os EUA e
24% das compras vêm daquele
país. Em 2001, Ásia e Argentina
pesavam 12% e 9% nas exportações, respectivamente.
A taxa de câmbio real efetiva
constitui indicador composto pelas taxas nominais de câmbio relativas às moedas dos principais
parceiros comerciais, deflacionadas pelo diferencial entre a inflação no Brasil e a inflação média
desses países.
Portanto, se a taxa de câmbio
real efetiva aumenta, os produtos
brasileiros estão mais baratos relativamente à média dos principais parceiros comercias e vice-versa. O gráfico nesta página mostra a evolução desta taxa desde a
implementação do Plano Real.
Como lembrou nesta última
quarta-feira o presidente do banco central dos EUA (Federal Reserve), Alan Greenspan, em pronunciamento no Congresso, taxas
de câmbio são difíceis de prever,
mesmo pelos modelos econômicos
mais sofisticados, principalmente
em momentos de turbulência na
economia mundial.
Se prever a cotação do dólar já é
difícil, imagine o movimento da
taxa de câmbio efetiva real que
depende de inúmeras variáveis
como as inflações nacionais e a
evolução da cotação de uma cesta
de moedas.
Mas uma coisa é certa. No curto
prazo, devem-se evitar a todo o
custo movimentos artificiais em
relação ao câmbio, como foi o período de sobrevalorização do real
no segundo semestre de 1994. Nesse sentido, os regimes de câmbio
flutuante, como o adotado pelo
Brasil a partir de 1999, têm se mostrado mais adequados.
No médio prazo, não há milagre. Para produzir melhor e mais
barato é necessário aumentar a
produtividade, o que requer investimento e inovação. Só assim o turista brasileiro vai se sentir mais
rico no exterior e certamente encontrar mais itens com a marca
Brasil durante o verão nova-iorquino ou europeu.
Gesner Oliveira, 46, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-Eaesp, consultor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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