São Paulo, quinta, 20 de agosto de 1998

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Firmeza para exterminar empresas e empregos

ALOYSIO BIONDI

Industriais e agricultores continuam a sofrer golpes devastadores, desferidos pela equipe FHC. No final da semana, o governo divulgou imensa relação de máquinas e equipamentos produzidos no país, mas que agora poderão ser importados com impostos reduzidos, de 20% para 5%.
Nada menos de 32 setores serão beneficiados com as importações mais baratas. Entre eles, lógico, os maiores privilegiados são setores "privatizados", como siderurgia, papel e celulose e alumínio.
As indústrias nacionais de máquinas, já prejudicadas por importações nos últimos anos, vêem-se roubadas, assim, nas encomendas que esperavam ter, com os investimentos tão falados nas áreas de infra-estrutura e produtos básicos.
E a equipe FHC rouba, do país, mais uma oportunidade de criar empregos, renda, consumo, isto é, de criar um foco de recuperação da economia. De quebra, "torra" dólares com as importações, agravando o "rombo" com o interior e a dependência em relação ao exterior.
Nada muda no governo FHC. Ele age com firmeza para exterminar indústrias nacionais, empregos, renda -e criar recessão.

Cartas marcadas
Apesar de sua gravidade, a decisão do governo, mais uma vez, passou em "brancas nuvens" nos chamados meios de comunicação, que negaram ou deram espaço mínimo aos protestos da entidade empresarial do setor, a Abimaq (depois a sociedade se "surpreende" com o aumento do "rombo" comercial, o avanço do desemprego, a quebra de empresas tradicionais do país).
No entanto alguns aspectos dessa autorização mereceriam investigação. Diz o Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo que, "nos próximos dois meses", o imposto de importação poderá voltar a ser aumentado, para cerca de 300 itens.
E mais: que as importações poderão "ter impacto imediato sobre o déficit comercial de agosto, quando grande volume de máquinas e equipamentos importados será internado no país" ("Gazeta Mercantil", 13/08/98).
Isto é, para bom entendedor: se a redução vai ser revista daqui a dois meses, e se os equipamentos já estão a caminho do país, devendo ser desembarcados já em agosto, então a "autorização" é um jogo de cartas marcadas, isto é, fez-se uma "lei" para beneficiar grupos determinados. Quais?

Só os amigos?
Marcadas pelo autoritarismo, são frequentes as decisões do governo FHC capazes de favorecer grupos, em prejuízo dos concorrentes. Veja-se por exemplo a polêmica em torno da privatização das telefônicas, surgida na semana passada entre o BNDES e a Anatel, agência que deverá controlar o setor.
Segundo o BNDES, um mesmo grupo "comprador" não poderá participar do controle de mais de uma estatal privatizada, pois essa proibição constava dos editais dos leilões. Já a Anatel, em tom até debochado, diz que, "depois da privatização", quem passa a mandar é ela, Anatel, que não concorda com a proibição.
Polêmicas à parte, é preciso perguntar: e os outros concorrentes do leilão, eles sabiam que a proibição não era para valer? E quem garante que os "vencedores" não receberam promessas nesse sentido e por isso se dispuseram a pagar um ágio maior para a "compra" das estatais?
É claro que se tratam de meras hipóteses. Mas o fato é que as "regras" do jogo estão sendo alteradas depois que ele foi encerrado, em benefício dos "compradores". Aliás, na própria privatização das teles já houve, anteriormente, alterações de regras, depois dos leilões, totalmente discutíveis.
Exemplo: depois das licitações para a banda B da telefonia celular, o governo determinou que as estatais do setor (só privatizadas agora) "aceitassem" chamadas, inclusive para outros Estados, das novas empresas privadas, aumentando assim sua atratividade para conquistar clientes.
Essa interligação (chamada "roam"), se anunciada previamente, não teria aumentado o valor a ser pago pelas concessões? E não poderia ter levado outros concorrentes a fazer um lance maior?

E a agricultura?
Prevê-se que La Niña vá provocar secas no Centro-Sul, no final do ano. Por isso seria importante os produtores fazerem mais cedo o plantio de algumas culturas. Além disso, seria uma questão de inteligência fornecer crédito para aumentar o plantio e compensar perdas provocadas pelo clima.
No começo de julho, o governo prometeu liberar os empréstimos "imediatamente". Mas ele vai ser discutido pelo Conselho Monetário Nacional somente dia 28. Depois, quando faltam arroz e feijão, é fácil jogar a culpa no clima.


Aloysio Biondi, 62, é jornalista econômico. Foi editor de Economia da Folha. Escreve às quintas-feiras no caderno Dinheiro.



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