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OPINIÃO ECONÔMICA
Infelizmente, nem Keynes, nem China, nem Índia
ANTONIO BARROS DE CASTRO
Duas novas críticas à situação em que se encontra a
economia brasileira foram recentemente incorporadas ao debate.
A primeira aponta o fato de que
desde os anos 1930 se sabe que o
desemprego e a não-utilização de
capacidade produtiva podem ser
combatidos (ou "compensados")
mediante políticas de estímulo às
atividades econômicas. Costuma-se até agregar que isso vem sendo
feito em países que dispõem de sólidas redes de proteção social.
Com mais razão, acrescenta-se,
políticas de natureza compensatória (monetárias e, possivelmente fiscais) deveriam ser usadas
num país como o Brasil, no qual a
proteção social é no mínimo precária.
A segunda crítica aponta o fato
de que os países que melhor desempenho apresentam nos mais
recentes anos são aqueles que não
aceitaram passivamente as reformas pró-mercado. A China e a Índia costumam ser apontadas a esse propósito. Em ambos os países
as reformas pró-mercado foram
dosificadas e condicionadas por
instituições e estruturas altamente peculiares.
Trata-se de argumentos respeitáveis. O problema é que não parecem ter em conta a especificidade da situação em que nos encontramos. Senão vejamos.
O Brasil, como outras economias da América Latina, passou,
nos anos 1990, por um processo de
endividamento externo, em
maior ou menor medida frustrado. Concretamente: ao endividamento não corresponderam investimentos em escala comparável (a poupança doméstica proporcionalmente se retraiu); e o
processo foi interrompido antes
que amadurecessem as suas consequências positivas. Em outras
palavras, caiu a entrada de financiamento, sem que tenha devidamente aumentado a capacidade
de gerar recursos externos.
A economia fica então sujeita a
um "stop and go". A cada retomada se segue prontamente a
(re)descoberta de que a demanda
doméstica não pode crescer.
Um novo estágio, possivelmente
terminal, começa então a delinear-se. Ele surge quando, na percepção dos credores, o país se encontra fadado à quebra. O Brasil
e a Argentina ingressaram nesse
estágio, por ocasião da crise russa
(meados de 1998).
Significa então que o Brasil está
de fato condenado ao "default" e
à crise que a ele invariavelmente
se segue? Não necessariamente.
O Brasil reúne três trunfos de
que a Argentina carecia. O primeiro é que o ajuste externo está
se fazendo de forma espetacularmente rápida, sem quebra e colapso do nível de atividades. O segundo é que mesmo os títulos denominados em dólar são pagos
em reais -e há incomparavelmente menos contratos dolarizados. O terceiro é que o país realizou, recentemente, sensível ajuste
fiscal.
Mas e a Índia e a China?
O ponto relevante aqui é que
aqueles países se caracterizam
por instituições diferentes. Heterodoxas, sim, sem dúvida -exóticas, mesmo, aos nosso olhos.
Mas certamente não se trata de
modas ou improvisos. São o resultado (mutável, claro) de um processo de experimentação. Deram
certo, deram errado, e o que resultou, em muitos casos, está presentemente funcionando bastante
bem. Cansei de ver referências pejorativas àquelas "baleias" -por
contraste com os míticos "tigres
asiáticos". A propósito, o que não
deu certo (não resistiu à experimentação) foi o New Deal norte-americano.
Ignorar as características do
contexto é um vício compartilhado tanto pelos proponentes das
reformas pró-mercado quanto,
frequentemente, pelos que querem copiar soluções. Como já disse um arguto observador, instituições viajam mal -é preciso tempo para readaptá-las.
Antonio Barros de Castro, 58, professor titular da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e ex-presidente do
BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), escreve às
quartas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.
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