São Paulo, sexta-feira, 21 de junho de 2002

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MERCADO EM TRANSE

País é o principal prejudicado pelo contágio argentino; empresas têm muitas dívidas em dólares

Uruguai libera câmbio; dólar dispara 12,4%

JOÃO SANDRINI
DE BUENOS AIRES

De forma surpreendente, o governo uruguaio anunciou ontem a substituição do sistema de bandas cambiais vigente desde 1990 por um regime de câmbio totalmente flutuante.
No dia da estréia do novo sistema, o dólar subiu 12,4%. Sua cotação flutuou de 17,35 pesos uruguaios na quarta-feira para 19,5 pesos ontem, após chegar a ser vendido por quase 24 pesos durante os momentos de maior nervosismo do dia.
Prevendo o fracasso inicial, o ministro da Economia, Alberto Bensión, disse que o país não tinha outra alternativa para enfrentar o câmbio desvalorizado de Brasil e Argentina. "Somos um país pequeno em meio a dois países em que o câmbio é flutuante, o que conspirava contra a credibilidade de nosso sistema cambial."
O Uruguai foi o país mais prejudicado pelo contágio da crise argentina e sofre há vários meses com a fuga de capitais para o exterior e a queda do turismo.
Há dois meses, o ministro Bensión havia dito que o sistema de bandas funcionaria até o final do ano. Por esse regime, o Banco Central fixava diariamente um piso e um teto que compreendia uma variação de até 12% para a cotação do peso. A cada mês, essa banda poderia sofrer uma alteração máxima de 2,4%.

Reservas
No entanto, o mercado se antecipou a uma possível desvalorização cambial e elevou a remessa de recursos ao exterior. Entre janeiro e maio, as reservas do país em moeda estrangeira caíram de US$ 3 bilhões para US$ 1,6 bilhão.
Em meio a essa situação, o governo uruguaio buscou apoio externo para desvalorizar o câmbio em um ambiente mais tranquilo. Nesta semana, o FMI (Fundo Monetário Internacional) confirmou a liberação de um novo empréstimo ao país, de US$ 1,5 bilhão. Esses recursos somaram-se a uma linha de crédito acertada em março com o Fundo, de US$ 743 milhões.
Com isso, Bensión acredita que o país terá reservas suficientes para impedir que o câmbio flutuante uruguaio não experimente o mesmo fracasso obtido na Argentina. Ele admitiu que poderá haver uma alta inicial "aguda" na cotação do dólar, mas, depois, o peso uruguaio voltaria a patamares semelhantes aos atuais.
Além disso, o presidente do Banco Central, César Rodríguez Batlle, disse que o "BC vai intervir para assegurar uma transição ordenada para a flutuação", com o objetivo de segurar a inflação.
O mercado, no entanto, recebeu as medidas com mais cautela. O economista Pablo Rosselli, da consultoria Tea, Deloitte & Touche, prevê uma forte alta da moeda norte-americana, que vai gerar inflação e provocar a queda do consumo interno.
Para ele, a economia do país deve agora completar o quarto ano em recessão, fechando 2002 com uma retração do PIB de pelo menos 7%.

Dívidas
Outro ponto fraco do plano, segundo analistas, está no fato de que a esmagadora maioria das dívidas dos empresários está atrelada ao dólar, o que dificultará o pagamento dos débitos e pode comprometer o setor financeiro.
No entanto, analistas concordam com o governo de que a desvalorização cambial era a única medida possível a ser tomada para reativar a produção das empresas exportadoras -concentradas nos setores de carne, lácteos e lã- e reaquecer o turismo do país.



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