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VIZINHO EM CRISE
Ministro das Relações Exteriores avisa à chanceler espanhola que haverá mudanças nas prestadoras de serviços
Argentina vai rever contrato de privatizadas
ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES
O ministro das Relações Exteriores da Argentina, Rafael Bielsa,
disse durante um encontro com a
chanceler da Espanha, Ana Palacio, que o governo argentino vai
revisar os contratos de privatização de serviços públicos no país,
como telefonia e energia -em
sua maioria administrados por
empresas estrangeiras.
A informação foi veiculada ontem pelos jornais espanhóis "El
Pais", "5 dias" e pela agência de
notícias Efe.
A Folha tentou contatar o ministro, que está na Europa, e a Casa Rosada, sede do governo argentino, para confirmar a informação, mas não obteve resposta
até o fechamento desta edição.
"O governo argentino vai renegociar os contratos com as empresas que administram concessões públicas porque os acordos
vigentes foram assinados em uma
realidade macroeconômica que
mudou muito [nos últimos
anos]", afirmou Bielsa, segundo
relato dos jornais.
O ministro não deu detalhes de
como funcionaria essa renegociação. Como forma de amenizar o
discurso, o chanceler disse ainda
que os investidores espanhóis não
precisam temer uma troca de
controle das concessões. Essa
possibilidade chegou a ser cogitada pelo próprio governo argentino recentemente, que alertou sobre a intenção de reprivatizar alguns serviços, começando pelos
correios, aeroportos e rodovias.
O primeiro alvo seria o Grupo
Macri, que administra os Correios. O governo teria a intenção
de rescindir o contrato e informa
que o grupo não realizou o pagamento semestral de 51,6 milhões
de pesos (cerca de US$ 17 milhões) pela concessão, nem pagou
indenizações de 6 mil empregados que foram afastados.
As privatizações na Argentina
foram realizadas na década de 90,
quando o país vivia a conversibilidade cambial entre peso e dólar.
Esse sistema se manteve por 10
anos (entre 1991 e janeiro de 2002)
e foi criado pelo ex-ministro da
Economia Domingo Cavallo no
governo do ex-presidente Carlos
Menem (1989-1999).
Pulso firme
A fala de Bielsa veio a público
após uma semana em que o presidente argentino, Néstor Kirchner,
travou uma verdadeira batalha
contra alguns setores do empresariado europeu.
Durante sua viagem pela Europa, na semana passada, Kirchner
foi duro. "Há uma grande hipocrisia", disse, lembrando que as
empresas que hoje reclamam dos
prejuízos acumulados na Argentina pós-crise são as mesmas que,
na década passada, remeteram lucros "exagerados" em dólares para suas matrizes no exterior.
Toda a polêmica gira em torno
da pressão que as empresas estão
fazendo para que o governo autorize um reajuste das tarifas dos
serviços públicos, congeladas desde janeiro de 2002, quando acabou a paridade entre peso e dólar.
Na época, o governo temia que a
forte desvalorização cambial provocasse uma hiperinflação e optou pelo congelamento.
Discussão
As empresas alegam que suas
dívidas -em grande parte contraídas em dólares- dobraram
de tamanho após a depreciação.
Algumas amargaram prejuízos
nos últimos anos e afirmam que
sem o reajuste ficará inviável fazer
novos investimentos no país.
O governo rebate e diz que as
companhias não cumpriram as
metas de investimento e qualidade dos serviços conforme previam os contratos. Por isso, o governo fechou um acordo com a
Flacso (Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais) para
analisar cada um dos 61 contratos
de concessão. Um recente estudo
da instituição mostrou que as empresas tiveram privilégios na privatização. Tinham uma margem
de rentabilidade 14 vezes superior
às empresas argentina que não
participaram do processo e de
duas a quatro vezes maior que
suas matrizes no exterior.
FMI
A revisão das tarifas também faz
parte das exigências do FMI (Fundo Monetário Internacional) para
conceder um novo financiamento
ao país. A Argentina já começou a
negociar o acordo, que deve ter
prazo de três anos, e espera fechá-lo antes do dia 9 de setembro,
quando vence uma parcela de
US$ 3 bilhões de um dívida com o
Fundo. O acordo é fundamental
para que o país recupere a credibilidade e consiga reestruturar a
sua dívida em moratória, avaliada
em mais de US$ 70 bilhões.
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