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São Paulo, segunda-feira, 21 de julho de 2003

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VIZINHO EM CRISE

Ministro das Relações Exteriores avisa à chanceler espanhola que haverá mudanças nas prestadoras de serviços

Argentina vai rever contrato de privatizadas

ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES

O ministro das Relações Exteriores da Argentina, Rafael Bielsa, disse durante um encontro com a chanceler da Espanha, Ana Palacio, que o governo argentino vai revisar os contratos de privatização de serviços públicos no país, como telefonia e energia -em sua maioria administrados por empresas estrangeiras.
A informação foi veiculada ontem pelos jornais espanhóis "El Pais", "5 dias" e pela agência de notícias Efe.
A Folha tentou contatar o ministro, que está na Europa, e a Casa Rosada, sede do governo argentino, para confirmar a informação, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.
"O governo argentino vai renegociar os contratos com as empresas que administram concessões públicas porque os acordos vigentes foram assinados em uma realidade macroeconômica que mudou muito [nos últimos anos]", afirmou Bielsa, segundo relato dos jornais.
O ministro não deu detalhes de como funcionaria essa renegociação. Como forma de amenizar o discurso, o chanceler disse ainda que os investidores espanhóis não precisam temer uma troca de controle das concessões. Essa possibilidade chegou a ser cogitada pelo próprio governo argentino recentemente, que alertou sobre a intenção de reprivatizar alguns serviços, começando pelos correios, aeroportos e rodovias.
O primeiro alvo seria o Grupo Macri, que administra os Correios. O governo teria a intenção de rescindir o contrato e informa que o grupo não realizou o pagamento semestral de 51,6 milhões de pesos (cerca de US$ 17 milhões) pela concessão, nem pagou indenizações de 6 mil empregados que foram afastados.
As privatizações na Argentina foram realizadas na década de 90, quando o país vivia a conversibilidade cambial entre peso e dólar. Esse sistema se manteve por 10 anos (entre 1991 e janeiro de 2002) e foi criado pelo ex-ministro da Economia Domingo Cavallo no governo do ex-presidente Carlos Menem (1989-1999).

Pulso firme
A fala de Bielsa veio a público após uma semana em que o presidente argentino, Néstor Kirchner, travou uma verdadeira batalha contra alguns setores do empresariado europeu.
Durante sua viagem pela Europa, na semana passada, Kirchner foi duro. "Há uma grande hipocrisia", disse, lembrando que as empresas que hoje reclamam dos prejuízos acumulados na Argentina pós-crise são as mesmas que, na década passada, remeteram lucros "exagerados" em dólares para suas matrizes no exterior.
Toda a polêmica gira em torno da pressão que as empresas estão fazendo para que o governo autorize um reajuste das tarifas dos serviços públicos, congeladas desde janeiro de 2002, quando acabou a paridade entre peso e dólar. Na época, o governo temia que a forte desvalorização cambial provocasse uma hiperinflação e optou pelo congelamento.

Discussão
As empresas alegam que suas dívidas -em grande parte contraídas em dólares- dobraram de tamanho após a depreciação. Algumas amargaram prejuízos nos últimos anos e afirmam que sem o reajuste ficará inviável fazer novos investimentos no país.
O governo rebate e diz que as companhias não cumpriram as metas de investimento e qualidade dos serviços conforme previam os contratos. Por isso, o governo fechou um acordo com a Flacso (Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais) para analisar cada um dos 61 contratos de concessão. Um recente estudo da instituição mostrou que as empresas tiveram privilégios na privatização. Tinham uma margem de rentabilidade 14 vezes superior às empresas argentina que não participaram do processo e de duas a quatro vezes maior que suas matrizes no exterior.

FMI
A revisão das tarifas também faz parte das exigências do FMI (Fundo Monetário Internacional) para conceder um novo financiamento ao país. A Argentina já começou a negociar o acordo, que deve ter prazo de três anos, e espera fechá-lo antes do dia 9 de setembro, quando vence uma parcela de US$ 3 bilhões de um dívida com o Fundo. O acordo é fundamental para que o país recupere a credibilidade e consiga reestruturar a sua dívida em moratória, avaliada em mais de US$ 70 bilhões.

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