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A tirania dos interesses escusos
MARTIN WOLF
DO "FINANCIAL TIMES"
Por que alguns países são ricos e tantos outros são pobres? Por que vem se provando
tão difícil para as nações estagnadas recuperar o terreno que as separa das mais prósperas? São as
questões mais importantes no ramo da economia. Adam Smith
tentou respondê-las. E William
Lewis, diretor fundador do
McKinsey Global Institute, foi um
dos estudiosos que, ao seguir seus
passos, o fez de maneira mais perceptiva, em "The Power of Productivity: Wealth, Poverty and the
Threat to Global Stability" [o poder da produtividade: riqueza,
pobreza e a ameaça à estabilidade
mundial]. A resposta dele daria
orgulho ao autor de "A Riqueza
das Nações": competição impiedosa, abrangente, justa e aberta.
O conhecimento quanto às maneiras de gerir produtivamente
uma atividade econômica não é
mistério. As mais bem-sucedidas
empresas do mundo sabem como
fazê-lo em todos os setores. Os investidores estão à procura de investimento lucrativo em todo o
mundo. Mas não conseguem
achá-lo em muitos países em que
os produtores são ineficientes.
Como isso aconteceu? A resposta é que as pessoas que estão no
poder, as empresas líderes, os políticos e burocratas corruptos, os
trabalhadores protegidos por arranjos formais de emprego e os
beneficiários de subsídios governamentais se combinam para
criar oposição à competição aberta, que os forçaria a adotar mudanças econômicas pouco confortáveis. Os intelectuais inimigos
do mercado também elogiam essa recalcitrância. O resultado é
uma oposição perene e generalizada à competição.
Lewis e seus colegas conseguiram demonstrar a importância da
competição e de sua ausência ao
dedicar seus recursos ao estudo
detalhado de setores e empresas
individuais. Combinando assim
microeconomia e desfechos macroeconômicos, eles enriqueceram nossa compreensão quanto
às raízes da produtividade.
Assim, quais são as mais importantes conclusões que tiraram?
Primeiro, mais de 5 bilhões de
seres humanos vivem em economias improdutivas. Cerca de 800
milhões de pessoas vivem em economias altamente produtivas, e
não mais de 340 milhões de pessoas vivem naquilo que Lewis
classifica como "o sopé da colina". Tomados como um todo, os
esforços de desenvolvimento do
último meio século fracassaram.
Segundo, foram descobertas
apenas duas rotas eficientes para
o desenvolvimento: o caminho da
alta produtividade e dos insumos
de baixa intensidade tomado pelos EUA e o caminho da baixa
produtividade e dos insumos de
alta intensidade tomado pelo Japão e Coréia do Sul. A Europa
Ocidental segue o caminho norte-americano, mas com mais distorções, especialmente quanto ao
uso da mão-de-obra.
Terceiro, números imensos de
trabalhadores se dedicam ao setor
de construção, mesmo nos países
em desenvolvimento. Assim, a
produtividade desses setores e
seus derivados desempenha papel
importante no cômputo da produção geral per capita. A excepcional produtividade desses ramos da economia americana, especialmente a distribuição varejista, exerce efeitos positivos sobre
toda a economia. Na maioria dos
países, porém, esses serviços são
geradores de empregos de baixa
especialização, com efeitos adversos sobre a produtividade geral.
Quarto, nem os níveis de educação nem a falta de capital são obstáculos intransponíveis à produtividade. Trabalhadores mexicanos
analfabetos atingem níveis de
produtividade elevados na construção de casas em Houston. A
Toyota conseguiu sucesso em elevar seus níveis de produtividade
para perto dos padrões japoneses,
em fábricas de todo o mundo. O
investimento direto de empresas
internacionais de primeira linha é
capaz de superar obstáculos se
puder ser feito sem interferência.
Por fim, a competição sem distorções nos mercados de produtos é o determinante de longo prazo mais influente em produtividade. A competição é a maneira pela
qual as empresas mais produtivas
se destacam. No Reino Unido, porém, a competição no varejo é distorcida pelos controles de planejamento, e no Japão é protegida
pelas medidas de proteção ao varejo de pequena escala.
Mas é nos países em desenvolvimento que a competição sofre os
obstáculos mais sistemáticos. Os
casos de Brasil, Rússia e Índia são
de chorar. Em muitos países em
desenvolvimento, empresas legítimas competem contra companhias que não pagam impostos,
ignoram a regulamentação e roubam propriedade intelectual. No
Brasil, onde o governo gasta 39%
do PIB, o ônus da tributação sobre as empresas legítimas se torna
paralisante, e a proporção do emprego urbano pela qual elas respondem vem caindo. Mas é na Índia que os esforços de distorção
da competição se transformaram
em verdadeira arte.
Para os países ricos da Europa
Ocidental e para o Japão, as lições
são duas: a competição é importante, e distorcê-la com proteções
a pequenas empresas uma rota
prejudicial para os objetivos de
distribuição de renda.
Mas é para os países em desenvolvimento que as implicações
são mais valiosas e menos palatáveis. Uma das revoluções de que
precisam é intelectual. Os líderes
nacionais precisam compreender
que os objetivos da política não
devem ser promover crescimento
de produtores específicos, mas
defender os interesses dos consumidores e, com eles, a competição. A abertura para a economia
mundial importa por isso. A competição internacional explica por
que os setores exportadores do Japão e da Coréia do Sul são tão
produtivos e o restante das economias desses países não o é.
Infelizmente, o necessário envolve também uma revolta contra
a conspiração de interesses escusos predatórios. Quase todo mundo estaria em melhor situação se
fosse possível desarmar esses interesses de maneira simultânea.
Mas isso sempre foi difícil de fazer. Numa democracia com grupos de interesses políticos bem
posicionados, é quase impossível.
O resultado não é desarmamento,
mas destruição econômica mutuamente assegurada.
Competição livre e justa parece
simples de obter. Mas nada está
mais longe da verdade: a competição incomoda os intelectuais que
se deslumbram com Estado benevolente, os burocratas que administram programas do governo,
as empresas que recebem favores
do Estado e, em resumo, todos
aqueles que se beneficiam das distorções. A competição beneficia
as pessoas que ficam de fora, muitas vezes desprezadas, em detrimento dos bem relacionados e
bem posicionados. A surpresa talvez seja o fato de que alguns países tenham enriquecido, e não
que tantas nações sejam pobres.
Traduções nesta página de
Paulo Migliacci
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