São Paulo, sábado, 22 de junho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MERCADO EM TRANSE

Indicador sobe 7,1% e passa dos 1.700 pontos

EUA se opõem a aumentar ajuda, e risco-país dispara

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

Depois das agências de risco, ontem foi a vez de o secretário do Tesouro dos EUA, Paul O'Neill, contribuir para a deterioração dos mercados brasileiros. O'Neill usou seu estilo trivial para dizer que se opõe a um aumento do atual pacote de ajuda do FMI ao Brasil. "Jogar dinheiro dos contribuintes norte-americanos em cima das incertezas políticas no Brasil não parece ser [uma medida" muito brilhante", disse, em entrevista à agência de notícias Bloomberg. "A situação lá é guiada por política, não por condições econômicas."
O'Neill referia-se a rumores de que o Brasil poderia pedir mais recursos para desfazer dúvidas quanto à capacidade de o governo e de empresas privadas do país pagarem suas dívidas.
Para alguns investidores, a declaração de O'Neill, tido como admirador da equipe econômica brasileira, sugere uma mudança no tratamento dispensado pelo Tesouro dos EUA para o país.
Suas palavras assemelham-se às que usou em agosto de 2001 para fechar os cofres do FMI à administração De La Rúa enquanto a economia argentina se dissolvia.
Na época, ele disse: "Estamos trabalhando para encontrar uma Argentina sustentável, não uma Argentina que continue a consumir dinheiro dos carpinteiros e encanadores norte-americanos que ganham US$ 50 mil por ano e se perguntam que diabos estamos fazendo com seu dinheiro".
A única -e substancial- diferença entre as duas situações é que o governo brasileiro não está buscando mais recursos no Fundo, segundo informou ontem o presidente do BC, Armínio Fraga.
Indagado pela Folha se a frase de O'Neill representa uma mudança de tratamento dos EUA para o Brasil, Bob Nichols, porta-voz do Tesouro, disse: "Não estou autorizado a ampliar nem a reduzir o significado das palavras do secretário". Embora os recursos do FMI não venham somente de encanadores norte-americanos -mas também de juros pagos por países emergentes em programas de ajuste-, os EUA são de fato os maiores acionistas da instituição e orientam suas políticas.
Horas depois das declarações de O'Neill (e também por outras razões), o dólar comercial batia seu recorde histórico desde a implantação do Plano Real (1994), fechando a R$ 2,84 para venda.
O risco-país do Brasil fechou a 1.706 pontos, com alta de 7,1%. Os juros pagos pelos C-Bonds superaram ontem o recorde de alta atingido em janeiro de 1999, depois da adoção do câmbio flutuante. Os títulos da dívida externa encerraram o dia pagando mais de 17 pontos percentuais de juros (ou 1.700 pontos básicos) acima da taxa de remuneração dos títulos do Tesouro dos EUA. O valor do C-Bond ao fim do dia era de 57% de seu valor de face.

Rebaixamento
Os mercados continuavam a reagir ao rebaixamento da nota do Brasil feito por algumas agências de risco na quinta-feira.
Na terça-feira passada, o FMI autorizou a liberação de mais US$ 5 bilhões ao Brasil, ao aprovar a terceira revisão de seu acordo com o país. Além disso, o Fundo autorizou a redução do piso das reservas, o que aumenta o poder de fogo do BC para intervir no câmbio. Em troca, exigiu um aumento do rigor fiscal, que acabou sendo concretizado para a elevação à 3,75% da meta de superávit primário. O Fundo e o governo dos EUA queriam algo em torno de 4% a 4,5%, mas aceitaram os argumentos do governo brasileiro de que seria politicamente impossível atingi-lo ainda em 2002, último ano do governo FHC.


Colaborou Érica Fraga, da Reportagem Local


Texto Anterior: Mercado em transe: Dólar só sobe e tem o maior preço do real
Próximo Texto: FHC reage mal a declarações de Paul O'Neill
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.