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INVERNO ECONÔMICO
Lojas começaram liquidação antes do início da estação; faturamento do setor de vestuário caiu 9,6%
Em crise, varejo liquida produtos e empregos
DA REPORTAGEM LOCAL
A crise econômica que empobreceu o consumidor também
antecipou a temporada de descontos. Na semana passada, antes
mesmo do início do inverno -
que começou oficialmente ontem-, lojas já liquidavam suas
coleções de frio com descontos
que chegavam a 60%.
Tradicionalmente, a liquidação
de inverno ocorre após o Dia dos
Pais, em agosto. Nas ruas e shoppings de São Paulo, cartazes estampados nas vitrines anunciam
"sale", "liquidação" e "promoção" para atrair consumidores.
São sinais da grave crise enfrentada pelo comércio neste ano.
Além das lojas de roupas, comércio de eletroeletrônicos e concessionárias de carros sofrem com a
falta de consumidores.
Frustração
As vendas para o Dia da Mães e
para o Dia dos Namorados já haviam frustrado as expectativas
dos lojistas. "O salário não aumenta, e o preço médio da roupa
subiu. Como consequência, a
venda caiu", diz Ângelo Augusto
de Campos, sócio-diretor da Mobettah, rede de roupas femininas
com 12 lojas.
Ele conta que a Mobettah, que
também tem uma loja de atacado,
possui atualmente cerca de 75 mil
peças em estoque (quase quatro
meses de produção), ou 25 mil peças acima do esperado para a época. "O calor atrapalha as vendas.
Mas o pior é a queda de demanda.
O poder aquisitivo do consumidor caiu muito", afirma.
Só na Grande São Paulo, o rendimento médio caiu 9,5% de março de 2002 a março deste ano, informa o Dieese. Nos últimos cinco
anos, os salários acumulam queda de pouco mais de 30%.
A Federação do Comércio do
Estado de São Paulo (FCESP) informa que, de janeiro a abril, as
lojas paulistas de vestuário faturaram 9,6% menos do que em igual
período do ano passado; as de tecidos, 2,62% menos, e as de calçados, 21,68% menos. "O consumidor só compra bens de primeira
necessidade", diz Oiram Corrêa,
economista da federação.
Assim como a Mobettah, que
colocou peças com descontos de
até 50%, a Le Lis Blanc já anuncia,
em alguns artigos, descontos de
até 60%. A Gregory, de 20% a
30%. A rede Crawford começa a
sua promoção -redução de até
40% nos preços- no dia 21 deste
mês. Mas promete descontos de
até 60% mais para a frente. "O estoque está alto", diz Renato Marinho, coordenador de comunicação da Crawford.
O comércio tem saudades do inverno do início do final dos anos
80, período no qual vendia quase
500 milhões de peças. A Abravest,
associação que reúne as confecções, informa que, em 1990, o país
consumiu 450 milhões de peças.
Em 1995, 350 milhões. Em 2000,
250 milhões. Em 2002, 130 milhões. "Neste ano, esse número
caiu para 100 milhões de peças e
ainda está sobrando roupa", afirma Roberto Chadad, presidente
da associação.
Mico
Guilherme Afif Domingos, presidente da Associação Comercial
de São Paulo (ACSP), diz que o lojista prefere vender as peças com
margem mínima de lucro a ficar
com estoque "micado", pois precisa de capital de giro.
"Mas o fato é que muitas lojas
estão reduzindo a operação neste
ano porque o consumidor desapareceu. O comércio vive um dos
seus piores anos", diz.
A combinação da queda no rendimento do trabalhador, do aumento do desemprego e da falta
de crédito -ou o encarecimento
dele- vai continuar pressionando o comércio, na análise do consultor Alberto Serrentino, economista e sócio-diretor da Gouvêa
de Souza & MD. "Além disso, os
lojistas têm de enfrentar a pressão
de custos dos aluguéis, das tarifas
de telefone, água e luz", afirma.
Fé nos juros
Serrentino acredita que o último trimestre possa trazer uma leve recuperação nas vendas, se as
taxas de juros tiverem quedas
mais expressivas. "Não haverá explosão de consumo, mas o comércio pode ganhar fôlego."
Enquanto isso não acontece, o
comércio paulista é forçado a encolher. Só entre fevereiro e abril
deste ano 74 mil vagas foram fechadas no setor na Grande São
Paulo, de acordo com o Dieese.
No ano passado, o comércio havia
cortado 37 mil vagas nesse mesmo período.
"O comércio, mais do que outros setores, é imediatista. O lojista depende da venda de hoje para
pagar o salário amanhã. Se o estoque está alto e a venda está fraca,
ele faz liquidação. Se a estratégia
não der certo, ele encolhe e demite", diz Ricardo Patah, vice-presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio de São Paulo.
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