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São Paulo, domingo, 22 de junho de 2003

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INVERNO ECONÔMICO

Lojas começaram liquidação antes do início da estação; faturamento do setor de vestuário caiu 9,6%

Em crise, varejo liquida produtos e empregos

DA REPORTAGEM LOCAL

A crise econômica que empobreceu o consumidor também antecipou a temporada de descontos. Na semana passada, antes mesmo do início do inverno - que começou oficialmente ontem-, lojas já liquidavam suas coleções de frio com descontos que chegavam a 60%.
Tradicionalmente, a liquidação de inverno ocorre após o Dia dos Pais, em agosto. Nas ruas e shoppings de São Paulo, cartazes estampados nas vitrines anunciam "sale", "liquidação" e "promoção" para atrair consumidores.
São sinais da grave crise enfrentada pelo comércio neste ano. Além das lojas de roupas, comércio de eletroeletrônicos e concessionárias de carros sofrem com a falta de consumidores.

Frustração
As vendas para o Dia da Mães e para o Dia dos Namorados já haviam frustrado as expectativas dos lojistas. "O salário não aumenta, e o preço médio da roupa subiu. Como consequência, a venda caiu", diz Ângelo Augusto de Campos, sócio-diretor da Mobettah, rede de roupas femininas com 12 lojas.
Ele conta que a Mobettah, que também tem uma loja de atacado, possui atualmente cerca de 75 mil peças em estoque (quase quatro meses de produção), ou 25 mil peças acima do esperado para a época. "O calor atrapalha as vendas. Mas o pior é a queda de demanda. O poder aquisitivo do consumidor caiu muito", afirma.
Só na Grande São Paulo, o rendimento médio caiu 9,5% de março de 2002 a março deste ano, informa o Dieese. Nos últimos cinco anos, os salários acumulam queda de pouco mais de 30%.
A Federação do Comércio do Estado de São Paulo (FCESP) informa que, de janeiro a abril, as lojas paulistas de vestuário faturaram 9,6% menos do que em igual período do ano passado; as de tecidos, 2,62% menos, e as de calçados, 21,68% menos. "O consumidor só compra bens de primeira necessidade", diz Oiram Corrêa, economista da federação.
Assim como a Mobettah, que colocou peças com descontos de até 50%, a Le Lis Blanc já anuncia, em alguns artigos, descontos de até 60%. A Gregory, de 20% a 30%. A rede Crawford começa a sua promoção -redução de até 40% nos preços- no dia 21 deste mês. Mas promete descontos de até 60% mais para a frente. "O estoque está alto", diz Renato Marinho, coordenador de comunicação da Crawford.
O comércio tem saudades do inverno do início do final dos anos 80, período no qual vendia quase 500 milhões de peças. A Abravest, associação que reúne as confecções, informa que, em 1990, o país consumiu 450 milhões de peças. Em 1995, 350 milhões. Em 2000, 250 milhões. Em 2002, 130 milhões. "Neste ano, esse número caiu para 100 milhões de peças e ainda está sobrando roupa", afirma Roberto Chadad, presidente da associação.

Mico
Guilherme Afif Domingos, presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), diz que o lojista prefere vender as peças com margem mínima de lucro a ficar com estoque "micado", pois precisa de capital de giro.
"Mas o fato é que muitas lojas estão reduzindo a operação neste ano porque o consumidor desapareceu. O comércio vive um dos seus piores anos", diz.
A combinação da queda no rendimento do trabalhador, do aumento do desemprego e da falta de crédito -ou o encarecimento dele- vai continuar pressionando o comércio, na análise do consultor Alberto Serrentino, economista e sócio-diretor da Gouvêa de Souza & MD. "Além disso, os lojistas têm de enfrentar a pressão de custos dos aluguéis, das tarifas de telefone, água e luz", afirma.

Fé nos juros
Serrentino acredita que o último trimestre possa trazer uma leve recuperação nas vendas, se as taxas de juros tiverem quedas mais expressivas. "Não haverá explosão de consumo, mas o comércio pode ganhar fôlego."
Enquanto isso não acontece, o comércio paulista é forçado a encolher. Só entre fevereiro e abril deste ano 74 mil vagas foram fechadas no setor na Grande São Paulo, de acordo com o Dieese. No ano passado, o comércio havia cortado 37 mil vagas nesse mesmo período.
"O comércio, mais do que outros setores, é imediatista. O lojista depende da venda de hoje para pagar o salário amanhã. Se o estoque está alto e a venda está fraca, ele faz liquidação. Se a estratégia não der certo, ele encolhe e demite", diz Ricardo Patah, vice-presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio de São Paulo.


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