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ERA FHC
Tarifas públicas e preços administrados, os vilões da inflação, sofreram reajustes para turbinar programa de privatizações
Inflação "do governo" dispara no Plano Real
PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO
Alvo recente de críticas de presidenciáveis tanto do governo como da oposição, os aumentos das
tarifas públicas e dos preços administrados lideraram a inflação
nos oito anos do Plano Real e foram os que tiveram o maior impacto no IPCA (Índice de Preços
ao Consumidor Amplo) acumulado no período, de 117,66%.
No ranking dos produtos que
mais subiram, o gás de cozinha foi
o campeão: disparou 472,16% de
julho de 1994 a junho de 2002, segundo levantamento inédito feito
pelo IBGE (Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística) a pedido
da Folha. O peso do gás em relação ao salário mínimo mais do
que dobrou no período do Real.
Todos os maiores reajustes desde a estabilidade da moeda, sem
exceção, foram de tarifas ou preços controlados. Depois do gás,
aparecem as altas do aluguel
(382%), telefone fixo (381,07%),
energia elétrica (227,26%) e ônibus urbano (250,22%). A gasolina, um dos itens de maior peso na
inflação oficial, subiu 211,23%.
Para Eulina Nunes dos Santos,
economista do IBGE, as tarifas e
preços controlados ficaram, antes
do Real, muito comprimidos. Tiveram reajustes tímidos durante
os planos econômicos anteriores,
diz ela, cujo objetivo era conter o
impacto na inflação.
"Havia controle do governo nos
preços das tarifas. Os aumentos
até o Real ficavam muito abaixo
da média da inflação, justamente
para impedir que ela subisse
mais", concorda o economista
Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio.
"Esse instrumento, de conter reajustes, foi usado por todos: (José)
Sarney, (Fernando) Collor e Itamar (Franco), diz o economista
da LCA, Luís Suzigan.
Privatização
Tanto Suzigan como Cunha
destacam outro motivo para o aumento explosivo dos preços administrados: as privatizações. Para atrair investidores e facilitar a
venda das então estatais, dizem,
as tarifas foram ajustadas para cima, principalmente nos setores
de energia elétrica e telefonia.
Para comprovar a tese, economistas verificaram os aumentos
nos anos anteriores à desestatização. Em 1995, quando começou a
venda das estatais de energia,
houve um reajuste de 65,12% na
tarifa -a maior do Real. No anos
seguintes, as correções foram
substancialmente menores. A
mais expressiva ocorreu em 1999:
19,89%.
Na telefonia, não foi diferente:
houve uma correção no valor dos
serviços de 69,19% e 89,64% nos
dois anos anteriores (1996 e 1997,
respectivamente) à privatização.
"No começo do Real, essa lógica, de não pressionar ainda mais a
inflação com aumentos de tarifas,
foi mantida. Mas com o advento
da privatização houve um realinhamento tarifário para deixar as
empresas (ex-estatais) mais atrativas (à venda), afirma o economista da LCA.
"A tarifas eram um instrumento
do governo para segurar a inflação. Com a privatização, isso deixou de existir. Era preciso dar um
retorno ao capital investido [pelos
compradores"", afirma Hamilton
Kay, do Ipea (Instituto de Política
Econômica Aplicada), órgão do
governo federal.
Kay tem ainda mais uma justificativa para a disparada dos preços
administrados. Diz que a maior
parte dos setores (telefonia, energia, aluguéis e outros) foram indexados pelos IGPs (Índice Geral de
Preços).
Esses índices, afirma, sobem
sempre acima do IPCA, pois incorporam também os preços no
atacado (ao produtor), que sofrem uma maior influência do
câmbio. Isso porque muitos insumos são importados e essa pressão do dólar, de certa forma, não
chega ao consumidor por causa
da renda em queda e pela falta de
demanda.
"Os preços administrados são
os únicos que permaneceram indexados na economia", diz Wilson Ramião, economista do banco Lloyds TSB.
Preços livres
Ao contrário das tarifas, os preços de mercado -não sujeitos a
controle- subiram abaixo do IPCA (177,66%) durante o Plano
Real. O vestuário teve alta de
47,3%, e, os alimentos, de 73,34%.
Os preços dos eletrodomésticos
cresceram 68,11%. Os dos cigarros, 69,04%.
No caso dos preços livres, cujos
reajustes foram os menores do
Real, as explicações dadas pelos
economistas ouvidos pela Folha
incluem a ampliação da competição na economia brasileira, desde
a abertura às importações, e a retração da renda do trabalhador.
Isso impede o aumento do consumo e, consequentemente, da inflação.
Além desses fatores, os especialistas apontam a maior taxa de desemprego e o juro alto como pontos inibidores. As altas taxas de juros praticadas no varejo, por
exemplo, reduzem a demanda
principalmente por bens duráveis. E isso ajuda no controle da
inflação.
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