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No fim, todos saem cantando vitória
DO ENVIADO ESPECIAL A MIAMI
Neil King, especialista em negociações comerciais do jornal norte-americano "The Wall Street
Journal", vozeirão de locutor de
futebol, fez jornalistas e autoridades rirem muito quando perguntou se não havia uma certa "mistificação" da parte das autoridades,
ao tentarem vender a idéia de que
a reunião de Miami havia sido um
convescote de grandes amigos.
Foi durante a entrevista coletiva
que marcou o enceramento da
reunião ministerial.
De fato, tanto Celso Amorim, o
chanceler brasileiro, como Robert
Zoellick, o responsável pelo comércio exterior norte-americano,
referiram-se à boa "química" entre eles, quando todos na sala de
entrevistas do Hotel Intercontinental sabiam que os dois passaram os dois últimos meses trocando caneladas pela mídia.
"Teria sido o jantar de ontem?",
ironizou King.
Zoellick não perdeu o bom humor e aproveitou para fazer um
carinho nos organizadores da
campanha para que Miami seja a
sede permanente da Alca, presentes à entrevista coletiva: "Miami é
um ponto de encontro".
Risos e "químicas" à parte, o fato é que, primeiro, a reunião não
foi tão cordial quanto dá a entender o seu final antecipado, com
um documento consensual.
Tiroteio adiado
Segundo, nem o ponto de encontro que Miami basta para explicar como se chegou ao entendimento entre Brasil e EUA, depois
do tiroteio ocorrido desde o fracasso da reunião da OMC (Organização Mundial do Comércio,
em Cancún, no México.
Uma melhor explicação está no
fato de que os EUA deram uma
"enorme guinada", diz Lori Wallach, diretora do Observatório de
Comércio Global da poderosa
ONG "Public Citizen". Refere-se
ao fato de que os EUA aceitaram o
que se está chamando de "Alca
light", conforme queria o Brasil.
Mas aceitaram apenas para salvar a conferência de Miami de um
fracasso como o de Cancún. "Como a conferência simplesmente
adiou todos os problemas impossíveis de solucionar, está longe de
ser certo que haverá até uma Alca
light", completa Wallach. Detalhe: ela aposta em que a reação
dos movimentos sociais à Alca
acabará por matar a área de livre
comércio de uma vez.
Os adversários de Lori Wallach
no empresariado concordam
com a primeira parte de sua avaliação (a Alca light "era a única estrada possível", diz Frank Vargo,
da NAM, a associação da manufatureiras americanas). Mas discordam frontalmente da sentença de
morte proferida por Wallach:
"A decisão de hoje (quinta-feira) nos dá a chance de ainda alcançar um acordo de alta qualidade", completa Vargo.
Nova realidade
Por que mudou a posição norte-americana? Porque, entre outras
razões, o mundo mudou desde
1994, quando foi lançada a idéia
de uma Alca ambiciosa. "As coisas mudaram. A situação econômica tem sido difícil", diz a ministra chilena do Exterior, Soledad
Alvear, partidária da ambição no
livre comércio hemisférico.
Situação econômica difícil é sinônimo de má vontade em abrir
mercados.
Em todo caso, em nome da
"química" ou do "ponto de encontro" que Miami é, os ministros
do Canadá e do México, que resistiram até a penúltima hora ao
acordo Brasil-EUA sobre a Alca
desidratada, concordaram em se
dizer satisfeitos, na entrevista coletiva de encerramento.
O secretário (ministro) mexicano de Economia, Fernando Canales, rendeu-se em nome "da coexistência organizada", mas volta à
luta no ano que vem, para "dar
conteúdo material e uma estrutura objetiva à Alca".
O ministro canadense do Comércio, Pierre Pettigrew, admitiu
que seu país, México, Costa Rica e
Chile queriam mais do que a visão
de Alca contida no documento
proposto por Brasil e EUA. Afirmou que que, agora, trata-se de
"trabalhar passo a passo", para
uma visão mais abrangente do
bloco comercial.
O próximo passo é a reunião
técnica de Puebla, que não tem, ao
contrário de Miami, a fama, merecida ou não, de ser "ponto de
encontro". A nova rodada de negociações deverá ocorrer em fevereiro do ano que vem.
(CR)
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