São Paulo, domingo, 22 de novembro de 1998

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DIAGNÓSTICO & RECEITA
Macunaíma tributário

OSIRIS LOPES FILHO

Diz o poeta popular que "não há pecado do lado de baixo do Equador".
Essa afirmação tem empolgado a turma que domina o Palácio do Planalto. A sua ação é desenvolta, em persistente superação dos limites socialmente aceitos da decência e da moralidade.
Na área tributária, o governo Fernando Henrique Cardoso segue literalmente a afirmativa. Não há obstáculos, constitucionais ou éticos, à volúpia insaciável de capturar o dinheiro dos bolsos dos cidadãos e dos caixas das empresas.
É a prática do pecado, sem culpa ou remorso. Tem-se alterado de tal forma os tributos desse país que, entre a clássica classificação de sistemas tributários históricos (os que são produto da tradição) e os lógicos ou racionais (os que são produto da reforma), surgiu, por obra governamental, uma nova modalidade "sui generis".
Trata-se do sistema tributário Macunaíma, o que não tem nenhum caráter.
Anárquico e sacana, tem por finalidade extorquir recursos do contribuinte da forma mais fácil e, portanto, menos trabalhosa.
A ação governamental na área tributária tem a influência marcante da preguiça e da malandragem do personagem traçado pelo escritor Mario de Andrade.
Os exemplos recentes são numerosos: elevação em 50% da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social); aumento em 90% da alíquota da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), de 0,20% para 0,38% sobre débitos em conta corrente; acréscimo em 90% da contribuição previdenciária dos servidores ativos da União; criação do imposto confiscatório sobre os aposentados do serviço público federal e a badalada instituição do cínico "imposto verde", a alcançar os combustíveis, já submetidos à incidência na importação do imposto de importação e, no mercado interno, do ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços).
A poluição do nosso sistema tributário tem acrescido, sob a influência de doses maciças de Viagra, para facilitar o estupro tributário da população.
O bonapartismo governamental alimentado por medidas provisórias vai encontrar o seu Waterloo. É que a carga tributária está tão indecorosa e indecente e a evasão adquirirá tal volume que, em breve, o país será hipercampeão da evasão, que também vai aumentar, para garantir a sobrevivência da gente e das empresas do país. Será a luta selvagem de resistência à opressão tributária.


Osiris de Azevedo Lopes Filho, 59, advogado, é professor de Direito Tributário da Universidade de Brasília (UnB) e ex-secretário da Receita Federal.



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