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São Paulo, quarta-feira, 23 de julho de 2003

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RECALL DE EMPRESAS

Relator inclui no parecer 19 pontos que não foram negociados com o Planalto e projeto sai da pauta

Crise adia a votação da Lei de Falências

LEONARDO SOUZA
RANIER BRAGON

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Um desentendimento de última hora entre o relator da nova Lei de Falências, deputado Osvaldo Biolchi (PMDB-RS), e a liderança do governo na Câmara adiou mais uma vez a votação do projeto, que estava prevista para hoje. A Mesa diretora da Casa confirmou que o projeto foi retirado da pauta de votação.
Segundo o vice-líder do governo Beto Albuquerque (PSB-RS), Biolchi incluiu em seu parecer, lido ontem, 19 pontos que não haviam sido negociados com o Palácio do Planalto. Para Albuquerque, o incidente pode abrir uma crise entre o governo e o PMDB, um dos partidos da base governista. O vice-líder foi encarregado pelo Planalto de conduzir a tramitação da proposta.
"Fomos surpreendidos, constatamos que havia algumas coisas que não tinham sido acordadas. Vamos apurar isso amanhã [hoje] com o líder do PMDB [na Câmara, Eunício Oliveira, do Ceará]", disse ele à Folha.
Entre os pontos que teriam sido incluídos por Biolchi, está um artigo que impede que empresas áreas entrem em recuperação judicial -o novo nome para a concordata.
Albuquerque deu a entender que a finalidade desse artigo seria atrapalhar o processo de fusão entre a Varig e a TAM, que conta com o apoio do governo Lula. Biolchi é do Rio Grande do Sul, Estado de origem da Varig.
Os pontos conflitantes foram detectados por técnicos da Casa Civil no início da noite, quando já era dada como certa pelos governistas a votação do projeto na sessão de hoje da Câmara.
Procurado pela Folha, Biolchi disse desconhecer o desentendimento, afirmando que não havia sido questionado sobre os pontos supostamente divergentes. Ele disse que iria ligar para Albuquerque para esclarecer a situação, mas disse que não abriria mão do artigo sobre o uso da recuperação judicial pelas empresas aéreas.
A nova Lei de Falências é tida pelo governo como uma de suas reformas prioritárias. Com as mudanças previstas no projeto, entre as quais maiores garantias aos empréstimos bancários, a equipe econômica acredita que os juros cobrados dos clientes no sistema financeiro serão reduzidos.
Por isso, o governo tem se esforçado nos últimos meses para levar a proposta à votação na Câmara, mas tem tido que lidar com resistências impostas por Biolchi. Os avanços na votação da lei constam do acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional).

Reunião com Dirceu
Ontem, o próprio ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, entrou em cena para contornar a situação. Em café da manhã na casa do presidente da Câmara, deputado João Paulo Cunha (PT-SP), Dirceu e líderes dos partidos da base aliada pareciam ter chegado a um novo acordo com Biolchi, que manteria em seu parecer os pontos defendidos pela equipe econômica.
Os encontros e desencontros entre o deputado e o governo já haviam levado o Planalto a cogitar a substituição de Biolchi pelo deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), o que só não ocorreu devido à mediação de Eunício, que costurou o acordo que aparentemente estava de pé até o início da noite de ontem. Serraglio esteve, inclusive, no café da manhã de ontem.
Depois de meses de conflito com Biolchi, o governo achou por bem ter um projeto substitutivo ao do relator, como precaução. Na semana passada, o vice-líder Albuquerque protocolou a proposta alternativa na Câmara. A idéia era levá-la a votação ainda nesta semana caso não houvesse acordo com o deputado peemedebista.

Projeto
Apesar da confusão, os principais pontos do projeto foram preservados no parecer de Biolchi. Foi retirada, por exemplo, a limitação de valores ao pagamento de dívidas trabalhistas e mantida a preferência dos funcionários no recebimento de seus direitos, em detrimento dos demais credores.
Um dos aspectos mais importantes é a substituição da concordata (que será extinta) por planos de recuperação de empresas em dificuldades financeiras. Antes da decretação de falência, as empresas terão duas alternativas.
Na primeira, a empresa poderá reunir os credores e acordar um plano de recuperação extrajudicial. Nesse caso, no entanto, a empresa precisa estar em dia com a folha de pagamentos e com seus tributos -ou inscrita no Refis (programa de recuperação de tributos federais em atraso).
Na segunda opção, a empresa tem de recorrer à Justiça para que decrete uma recuperação judicial.
No entanto, ao contrário do que ocorre hoje na concordata, que pode se arrastar durante anos, a empresa teria de chegar a um concordo com os credores, sobre como as dívidas seriam quitadas, em até nove meses. Sem um entendimento nesse período, qualquer credor poderá pedir a falência da empresa.
Outro ponto de destaque da nova lei é a maior garantia para credores como bancos, investidores e factorings (compra de ativos).


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