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ARTIGO
Os Estados Unidos não vão esperar
ROBERT ZOELLICK
Os últimos minutos da sessão da Organização Mundial
do Comércio em Cancún foram
sintomáticos: chegamos a um impasse depois que representantes
dos países menos desenvolvidos
da África e do Caribe relataram
que seus colegas haviam rejeitado
qualquer negociação para modernizar as regras de 1947 sobre procedimentos alfandegários.
A ruptura ocorreu em relação a
medidas que simplesmente teriam facilitado o comércio e ajudado países isolados, garantindo
a pronta liberação de bens, publicação de procedimentos e regras
oportunas e justas sobre questões
alfandegárias. Essas medidas sensatas são do interesse de todos;
sua rejeição foi uma declaração
política. Infelizmente, essa decisão foi emblemática de uma cultura maior de protesto que definiu a vitória em termos de atos
políticos, em vez de resultados
econômicos.
Enquanto o ministro das Relações Exteriores do México, Luis
Ernesto Derbez, que presidiu a
reunião, encerrava a sessão, representantes de influentes países
em desenvolvimento finalmente
se apressaram a dizer que queriam continuar negociando. Eles
reconheceram corretamente que
o rascunho oferecia uma excelente oportunidade para pressionar a
União Européia a eliminar os subsídios às exportações agrícolas;
para obter grandes cortes em subsídios agrícolas nos Estados Unidos, na União Européia e em outros países; impor um teto às tarifas incrivelmente altas do Japão; e
abrir os mercados agrícolas igualmente para países desenvolvidos
e em desenvolvimento. Mas eles
chegaram tarde demais.
Na noite anterior, um país após
o outro haviam desprezado o rascunho, o processo de negociação
e outros países. A Assembléia Geral da ONU tem o seu papel, mas
não oferece um modelo eficaz para as negociações comerciais. Alguns ministros apontaram que
uma retórica cada vez mais radical dificultaria para todos -especialmente para os grupos de países em desenvolvimento com
muitos membros pequenos-
considerar compromissos realistas. Países que se sentem vítimas
provavelmente não concordarão
com nada.
Cancún poderia ter seguido um
curso diferente. Algumas semanas antes, tínhamos trabalhado
juntos para resolver a difícil questão de garantir que os países pobres em desenvolvimento tivessem acesso a remédios vitais a
baixo custo, ao mesmo tempo
protegendo a propriedade intelectual. Mas, em Cancún, as táticas do grupo do "não" frustraram
aqueles que teriam cortado os
subsídios agrícolas e as tarifas, desencadeando reformas na política
agrícola nos Estados Unidos, na
União Européia, no Japão, no Canadá e em outros países. Eles perderam a oportunidade de abrir
gradativamente os mercados dos
países em desenvolvimento a outros países na mesma situação.
Eles bloquearam as redes globais de terceirização e produção,
que integram empresas de países
desenvolvidos e em desenvolvimento em benefício mútuo. E evitaram as regras de abertura e
transparência que combatem o
favoritismo e a corrupção.
Resistência como tática
Importantes países em desenvolvimento de nível médio empregaram a retórica da resistência
como tática para pressionar os
países desenvolvidos e, ao mesmo
tempo, desviar a atenção de suas
próprias barreiras comerciais. A
tarifa agrícola média na Índia é de
112%, no Egito, de 62%, e, no Brasil, de 37% -a média americana é
de 12%. Suas tarifas médias sobre
bens manufaturados são pelo menos dez vezes maiores que a média americana, de 3%. Deveríamos ser capazes de reduzir essas
barreiras, protegendo os países
mais pobres e fornecendo flexibilidade para sensibilidades especiais nos países maiores.
Depois que os Estados Unidos
pressionaram a União Européia a
desenvolver um sistema agrícola
capaz de efetuar cortes de subsídios agrícolas e tarifas muito superiores aos alcançados na última
negociação do comércio global,
pedimos que o Brasil e outras potências agrícolas trabalhassem conosco. O Brasil se recusou, voltando-se em vez disso para a Índia,
que nunca apoiou a abertura de
mercados, como que para enfatizar a divisão norte-sul, e não a reforma agrícola global.
Os países em desenvolvimento
menores resistiram à redução das
tarifas americanas e européias
porque calcularam que perderiam as vantagens oferecidas por
programas especiais dos EUA e
da UE que eliminam tarifas apenas para suas exportações. Infelizmente, esses bem-intencionados
programas de preferência comercial minaram o impulso em direção a aberturas de mão dupla,
perpetuando a dependência.
Quatro países africanos insistiram em uma "indenização" de
US$ 250 milhões a US$ 1 bilhão
anuais e na eliminação unilateral
dos subsídios ao algodão. Em 50
anos as negociações do comércio
global progrediram porque os
países conseguiram negociar cortes em diversos produtos (até em
setores) para alcançar um equilíbrio. Os EUA não têm subsídios à
exportação de algodão e propuseram a eliminação de todos os subsídios à exportação. Nós nos comprometemos a cortar os subsídios
internos ao algodão como parte
de um pacote total que também
teria reduzido os subsídios ao
produto na Europa e na China,
juntamente com todos os subsídios agrícolas. Em vez de transformar o algodão em símbolo,
queríamos fazer do desenvolvimento uma realidade, por meio
de resultados concretos para os
produtores, exportadores e fabricantes desse produto, juntamente
com todos os agricultores.
Sem negociação
As táticas de confronto incluíram ataque a um dos poucos dispositivos que a OMC pode usar
para incentivar seus 148 membros
a avançar para consenso: apresentar o texto de um dos presidentes da assembléia para discussão e negociação. O Brasil, a Índia
e outros se recusaram até a discutir um texto sobre agricultura esboçado pelo presidente da OMC
do Uruguai e enviado pelo diretor-geral da entidade na Tailândia. Mesmo depois de o incansável ministro de Cingapura ter trabalhado com todas as partes para
preparar um novo esboço agrícola refletindo um compromisso
equilibrado, o Brasil e seus colegas levaram uma lista maciça de
exigências de reformas. Se eles
pretendiam negociar compromisso para 148 países, perderam a
chance de indicar essa intenção.
Voltaram para casa sem nenhum
corte de subsídios e tarifas.
Ao encerrar a reunião de Cancún, o presidente Derbez pediu
que os países reavaliassem as
perspectivas até 15 de dezembro.
Sabemos muito bem o que os países em desenvolvimento pedem,
mas não ouvimos se essas economias mais competitivas cortarão
suas elevadas barreiras. Não sabemos se outros países em desenvolvimento que bloquearam a
ação em Cancún agora aceitarão
pacotes que pedem pouco ou nada deles. Os Estados Unidos continuam prontos a trabalhar com o
rascunho em toda a agenda. Enquanto as negociações de Doha se
estendem para o próximo ano,
porém, reconhecemos que uma
nova Comissão Européia poderá
refletir perspectivas diferentes.
Muitos países ficaram decepcionados com a transformação da
OMC em um fórum para políticas
de protesto. Alguns suportaram a
pressão de vizinhos maiores em
desenvolvimento para se unir à
luta. É claro que as posições de negociação diferem. Mas a principal
divisão em Cancún foi entre os
que querem negociar e os que não
querem. Durante dois anos os Estados Unidos se esforçaram para
abrir os mercados de modo global, em nosso hemisfério e com
sub-regiões ou países individuais.
Enquanto os membros da OMC
avaliam o futuro, os EUA não vão
esperar: vamos avançar para o livre comércio com os que querem.
Robert Zoellick é representante
comercial dos EUA.
Tradução de Luiz Roberto Gonçalves
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