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OPINIÃO ECONÔMICA
Primavera
BENJAMIN STEINBRUCH
Nós, brasileiros, não damos muita bola para as estações do ano, até porque temos
sol em todas elas. Nos países mais
frios não é bem assim. Durante o
inverno, os dias são escuros, tristes, às vezes tenebrosos, propícios
apenas à reclusão e à introspecção. Quando chega a primavera,
o astral muda totalmente. O sol
volta, os dias ficam mais longos e
tudo leva à idéia do recomeço.
Aprendemos no colégio que em
23 de setembro dá-se o equinócio.
É quando o sol corta exatamente
o equador celeste e que, por isso, o
dia e a noite têm a mesma duração, 12 horas.
Hoje é o dia do equinócio e do
início da primavera. É bom lembrar que a primavera sugere a
idéia do recomeço, porque estamos precisando muito disso no
país.
O governo Lula tem sido criticado por adotar uma política pouco
ativa para estimular o crescimento econômico. Preocupado em
mostrar sua seriedade ao mercado, Lula teve um início de mandato marcado por gestão muito
mais ortodoxa do que imaginava
a maioria de seus eleitores. Por isso, decepcionou a esquerda radical e surpreendeu favoravelmente
até os mais conservadores.
Agora, passados quase nove
meses desde a posse, é justo reconhecer que o novo governo já acumula um pacote razoável de medidas para estimular a recuperação da atividade econômica.
A principal medida é o corte dos
juros. Desde maio, quando a taxa
estava em 26,5% ao ano, o Banco
Central promoveu quatro reduções seguidas, até chegar aos 20%
na última quarta-feira. O corte
poderia ter sido maior, porque os
juros reais estão ainda elevadíssimos, entre 12% e 14%, dependendo da expectativa que se tem da
inflação futura. Mas a diminuição acumulada já é de 6,5 pontos.
À redução dos juros, medida
fundamental, juntam-se outras
auxiliares. Em agosto, o compulsório dos bancos foi cortado de
60% para 45%, o que teoricamente colocaria R$ 8 bilhões em circulação na economia. Medidas de
incentivo ao microcrédito liberaram mais R$ 4 bilhões em junho.
Outros R$ 7 bilhões saíram via
FGTS, por conta de acordo firmado no governo passado. A Caixa
Econômica Federal abriu crédito
para a baixa renda. O IPI dos automóveis até 2.000 cc foi reduzido.
Na semana passada, a Caixa e o
Banco do Brasil passaram a oferecer recursos do FAT para financiar eletrodomésticos com juros
de 2,5% ao mês. E saiu a regulamentação que permite aos bancos
descontar da folha de pagamentos empréstimos concedidos a empregados de empresas, uma novidade que pode movimentar R$ 20
bilhões em financiamentos, segundo estimativa do Ministério
da Fazenda.
A observação de estatísticas sugere que, apesar de tudo isso, não
deu resultado. Até onde se sabe, o
consumo continua muito retraído, os estoques, elevados, e a produção da indústria e o emprego,
em queda.
É indiscutível. Pela dose insuficiente ou pela administração recente, os remédios anti-recessão
ainda não surtiram efeito. Mas
não se pode negar que a postura
do governo evoluiu bastante em
relação à atitude tímida e retranqueira do início de mandato em
matéria de estímulo ao crescimento.
Se o governo persistir nesse caminho, certamente acabará colocando a economia no rumo do
crescimento. Há várias medidas
ainda necessárias, como um acordo menos restritivo com o FMI, a
conclusão das reformas, o destravamento do crédito imobiliário, a
nova lei de falências e as políticas
favoráveis aos grandes investimentos dos setores competitivos.
Não se pode voltar atrás, nem
na sequência de cortes de juros
nem nas medidas auxiliares de
apoio ao crédito e estímulo ao
consumo. O tenebroso inverno,
que começou nas incertezas eleitorais do ano passado e se prolongou nos meses de afirmação da
nova gestão econômica, já foi deixado para trás. Que venha, então,
a primavera.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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