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Só FMI se beneficiou, afirma Cavallo
ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES
Na visão do ex-ministro da Economia argentino Domingo Cavallo, o acordo assinado entre o país
vizinho e o FMI (Fundo Monetário Internacional) beneficiou apenas ao Fundo: "Argentina e credores saíram perdendo". Segundo ele, o acordo deveria prever a
liberação de dinheiro "novo" ao
país, além de conceder descontos
no valor total da dívida e maiores
prazo de pagamento. No ano passado, o FMI já havia prorrogado
os prazos por um ano, o máximo
permitido nas regras do Fundo.
Cavallo, 57, foi criador da conversibilidade cambial que atrelou
o peso ao dólar por dez anos entre
1991 e janeiro de 2002. O câmbio
valorizado controlou a hiperinflação, mas criou gargalos para as
exportações, resultando na quebradeira de diversas empresas.
Foi ministro da Economia duas
vezes: no primeiro mandato de
Carlos Menem (1989-1995) e no
governo de Fernando de la Rúa.
Assumiu em março de 2001 e saiu
uma semana antes da renúncia do
presidente, em dezembro. Cavallo
conversou com a Folha por telefone do seu escritório no Departamento de Economia da Universidade Harvard, onde trabalha como professor visitante.
Folha - O sr. acha que a Argentina
teve uma vitória nas negociações
do novo acordo com o FMI?
Domingo Cavallo - Não. O acordo foi bom para o Fundo. Nem a
Argentina, nem os correntistas
argentinos, nem os credores saíram beneficiados.
Folha - Por que a Argentina saiu
perdendo?
Cavallo - Porque o Fundo tem
responsabilidade na crise vivida
na Argentina, foi o FMI que levou
o país à desvalorização e à moratória. O acordo teria sido bom se o
Fundo tivesse concedido dinheiro
"fresco" à Argentina, além de desconto na dívida. O fim da conversibilidade foi o que provocou a
crise e a sua extinção foi estimulada pelo FMI.
Folha - A conversibilidade acabou porque o governo não tinha
mais como sustentar a paridade
por conta da queda contínua das
reservas...
Cavallo - Havia reserva. A mesma quantidade de dólares para os
pesos que estavam em circulação.
Folha - A moeda circulante não
atendia à demanda e o governo e
as Províncias emitiram então bônus que funcionavam como moedas paralelas, as quase-moedas...
Cavallo - As quase-moedas não
violavam nenhuma lei, nem contrato. Era dinheiro que poderia se
desvalorizar. O erro foi desvalorizar o peso.
Folha - Alguns analistas apontam
a conversibilidade como a principal responsável pela crise. O que o
sr. pensa disso?
Cavallo - A conversibilidade não
foi responsável pela crise. A culpa
é do excesso de gastos do governo
e das Províncias, que se endividaram mais do que deveriam e a atitude do Fundo ante a Argentina.
É óbvio que não haveria crise se se
tivesse evitado um endividamento tão elevado.
Folha - Quanto ao programa de
reestruturação da dívida argentina
lançado hoje [ontem] pelo governo, o sr. acha viável?
Cavallo - Eu não quero comentar
porque não tive acesso aos detalhes. Não estou aqui para comentar medidas dos governos.
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