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São Paulo, terça-feira, 23 de setembro de 2003

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Só FMI se beneficiou, afirma Cavallo

ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES

Na visão do ex-ministro da Economia argentino Domingo Cavallo, o acordo assinado entre o país vizinho e o FMI (Fundo Monetário Internacional) beneficiou apenas ao Fundo: "Argentina e credores saíram perdendo". Segundo ele, o acordo deveria prever a liberação de dinheiro "novo" ao país, além de conceder descontos no valor total da dívida e maiores prazo de pagamento. No ano passado, o FMI já havia prorrogado os prazos por um ano, o máximo permitido nas regras do Fundo.
Cavallo, 57, foi criador da conversibilidade cambial que atrelou o peso ao dólar por dez anos entre 1991 e janeiro de 2002. O câmbio valorizado controlou a hiperinflação, mas criou gargalos para as exportações, resultando na quebradeira de diversas empresas. Foi ministro da Economia duas vezes: no primeiro mandato de Carlos Menem (1989-1995) e no governo de Fernando de la Rúa. Assumiu em março de 2001 e saiu uma semana antes da renúncia do presidente, em dezembro. Cavallo conversou com a Folha por telefone do seu escritório no Departamento de Economia da Universidade Harvard, onde trabalha como professor visitante.
 

Folha - O sr. acha que a Argentina teve uma vitória nas negociações do novo acordo com o FMI?
Domingo Cavallo -
Não. O acordo foi bom para o Fundo. Nem a Argentina, nem os correntistas argentinos, nem os credores saíram beneficiados.

Folha - Por que a Argentina saiu perdendo?
Cavallo -
Porque o Fundo tem responsabilidade na crise vivida na Argentina, foi o FMI que levou o país à desvalorização e à moratória. O acordo teria sido bom se o Fundo tivesse concedido dinheiro "fresco" à Argentina, além de desconto na dívida. O fim da conversibilidade foi o que provocou a crise e a sua extinção foi estimulada pelo FMI.

Folha - A conversibilidade acabou porque o governo não tinha mais como sustentar a paridade por conta da queda contínua das reservas...
Cavallo -
Havia reserva. A mesma quantidade de dólares para os pesos que estavam em circulação.

Folha - A moeda circulante não atendia à demanda e o governo e as Províncias emitiram então bônus que funcionavam como moedas paralelas, as quase-moedas...
Cavallo -
As quase-moedas não violavam nenhuma lei, nem contrato. Era dinheiro que poderia se desvalorizar. O erro foi desvalorizar o peso.

Folha - Alguns analistas apontam a conversibilidade como a principal responsável pela crise. O que o sr. pensa disso?
Cavallo -
A conversibilidade não foi responsável pela crise. A culpa é do excesso de gastos do governo e das Províncias, que se endividaram mais do que deveriam e a atitude do Fundo ante a Argentina. É óbvio que não haveria crise se se tivesse evitado um endividamento tão elevado.

Folha - Quanto ao programa de reestruturação da dívida argentina lançado hoje [ontem] pelo governo, o sr. acha viável?
Cavallo -
Eu não quero comentar porque não tive acesso aos detalhes. Não estou aqui para comentar medidas dos governos.


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