São Paulo, segunda-feira, 23 de outubro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA

Candidatos se definem


Lula quer manter a atual política econômica estagnacionista; Alckmin propõe-se a mudá-la
NOS ÚLTIMOS dias, as declarações dos candidatos tornaram claras as diferenças em relação à política econômica: Lula quer manter a atual política econômica estagnacionista; Alckmin propõe-se a mudá-la.
A crítica aos juros altos e sua identificação como a causa fundamental da quase estagnação da economia brasileira nos últimos 12 anos só começou em 2002, no último ano do governo Fernando Henrique Cardoso. Lula, nesse ano, criticou insistentemente essa política. Entretanto, no seu governo, nada fez para mudá-la. Pelo contrário, aumentou a taxa de juros e deixou que a taxa de câmbio, que havia se depreciado durante a crise ocorrida na campanha, voltasse a se apreciar. Dessa forma, não cumpriu minimamente seus compromissos de campanha: manteve o país subordinado a uma coalizão política formada por rentistas e por nossos competidores no exterior, à qual interessam os juros altos e o câmbio baixo.
Nestes últimos dias, Lula tem enfatizado duas coisas em relação à política econômica: ela será mantida, "porque é uma política muito bem-sucedida"; e o ajuste fiscal adicional não será tentado, "porque não há nada mais a cortar". Ou seja, pretende manter a economia quase estagnada, como a manteve nestes últimos quatro anos, apesar das condições extraordinariamente favoráveis da economia mundial.
Alckmin, até recentemente, só se distinguia por um rigor fiscal muito maior. Comprometia-se sempre a cortar gastos e tornar a máquina do Estado mais eficiente. Em entrevista à CBN no último dia 20, porém, ele foi mais explícito em relação ao corte de gastos e o relacionou com a taxa de juros. Afirmou que o principal gasto que procuraria cortar são os R$ 156 bilhões que o Estado brasileiro paga de juros. E que manteria o regime de câmbio flutuante, mas procuraria ativamente administrar a taxa de câmbio, como fazem todas as economias que crescem.
Como baixaria a taxa de juros? Essencialmente por meio do corte de despesas correntes, do choque de gestão e de uma série de outras medidas que não detalhou. O principal terá que ser a desvinculação dos títulos públicos da Selic, de forma a haver uma distinção clara entre a taxa de juros de longo prazo, que é definida pelo mercado e que acompanha o risco Brasil, e a taxa de juros de curto prazo, a Selic, que é determinada pelo Banco Central. Desvinculadas as duas, o Banco Central poderá mais facilmente baixar a taxa de juros básica para níveis civilizados, enquanto o mercado se encarrega de levar a taxa de juros de longo prazo para o nível do atual risco Brasil -menos da metade da taxa de juros real hoje paga pelos títulos públicos. Alckmin afirmou que a política de metas de inflação será mantida, mas sua administração mudará de forma sensível para que possa dar conta, de forma mais sensata, da depreciação cambial necessária.
Um dos candidatos nos oferece, assim, uma perspectiva de mudança; o outro, não. Terá Alckmin condições de realizar essa mudança caso eleito? Estou seguro de que sim. Ele demorou em definir sua posição em relação à política econômica, mas agora o fez com clareza; a campanha foi um processo de aprendizado para ele. Todos nós aprendemos, mas nem todos adicionamos o que aprendemos a nossas convicções. Há muitos que continuam oportunistas a vida toda: para eles, as convicções não existem: só as conveniências. Geraldo Alckmin não pertence a essa raça de gente. Conheço-o o suficiente para afirmar isso. Caso seja eleito, portanto, existe uma possibilidade concreta de o Brasil, afinal, alcançar a verdadeira estabilidade macroeconômica e retomar o desenvolvimento.
As perspectivas eleitorais não são boas. A vitória de Lula continua mais provável. Já sabíamos que, a se confirmar, faltarão ao novo governo condições de governabilidade, dados os escândalos recentes, e a falta de apoio na sociedade civil; sabemos agora que, no plano fundamental da política econômica, estaremos perdendo uma oportunidade concreta de superar a quase estagnação da economia brasileira.


LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 72, professor da emérito Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda, da Reforma do Estado, e da Ciência e Tecnologia, é autor de " As Revoluções Utópicas dos Anos 60". Internet: www.bresserpereira.org.br

lcbresser@uol.com.br

Texto Anterior: Acusados negam atuação criminosa
Próximo Texto: SP autua empresas por uso de precatórios
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.