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LUÍS NASSIF
O MEC e os softwares
O Ministério da Educação está jogando no mínimo R$ 100
milhões pela janela, em sua política de compra de softwares.
O episódio da compra de softwares para aparelhar a rede
pública de ensino básico
-dentro do programa Proinfo- é a prova mais contundente da importância de que
seja criada rapidamente uma
política de software para a
área pública, para impedir a
queima de dinheiro.
Em 1998, o MEC assinou com
a TBA -representante da Microsoft em Brasília e politicamente muito influente- contrato para a aquisição de 100
mil licenças de Office da empresa para colocar nos computadores da rede pública. Não
houve licitação, sob a alegação
de "falta de similar" -quando
existem programas similares
da Sun (StarOffice), da Lotus
(SmartSuite) e da Corel. Houve
murmúrios na imprensa e o
processo foi interrompido. Mas
30 mil cópias já tinham sido
adquiridas pela Secretaria de
Educação à Distância do MEC
quando, no ano passado, houve um conjunto de ações simultâneas na área de ensino. Numa ponta, uma fortíssima
ofensiva da Microsoft, por
meio da Abes (Associação Brasileira de Empresas de Software), visando a legalização de
softwares. Foi um jogo pesado,
beirando o terrorismo, com
ameaças de prisão para quem
utilizasse softwares piratas. O
alvo prioritário da campanha
foram as Ifes (Instituições Federais de Ensino Superior)
-tanto as universidades
quanto os Centros Tecnológicos Federais (Cefets).
Aproveitando a brecha, a Lotus e a Sun procuraram universidades com uma proposta: o
StarOffice e o Linux (sistema
operacional rival do Windows
e do NT) eram oferecidos de
graça pela Sun; já a Lotus oferecia a plataforma Lotus completa, mais o SmartSuite, por
R$ 15 o aluno. Em setembro de
1999 a proposta da Lotus foi
apresentada ao Conselho Nacional dos Centros Tecnológicos, aprovada pelos diretores
técnicos. Foi marcada uma
reunião em Brasília, para a
formalização do contrato.
Na reunião, contudo, as negociações foram interrompidas
pelo secretário-geral do MEC,
Luciano Oliva Patrício, que diz
que o caso já estaria resolvido
com a TBA. Bastaria cada Cefet apresentar nos dias seguintes uma relação de todos os
softwares ilegais para imediatamente o MEC providenciar a
legalização, dentro do contrato
firmado com a TBA, para o
Proinfo -que dispunha de 70
mil softwares encalhados. Não
havia sequer a atualização de
softwares nem a entrega de
CDs com o Office. A TBA oferecia apenas um documento legalizando o software e imediatamente receberia o pagamento do MEC.
No mesmo movimento, o
MEC abriu para as universidades a possibilidade de entrar
embaixo do guarda-chuva do
contrato com a TBA, mas aí
pagando com seus próprios recursos. Cada cópia do Office
sairia por R$ 150 -quase a
mesma quantia cobrada de
professores que adquirem unidades do Office.
Em outubro de 1999, a Universidade Federal de Minas
Gerais promoveu um evento
para estudar as alternativas de
compras de software. A TBA
ofereceu o preço de R$ 150 por
programa. A Lotus contra-atacou, oferecendo o SmartSuite a
R$ 1 por aluno e toda a plataforma Lotus por US$ 5,00 o
aluno.
A plataforma incluía o Lotus
Notes (programa de automação de escritório e de controle
de fluxo de documentos, adotado pela maioria das grandes
organizações), o Domino (servidor de Web que permite colocar as informações do Notes
automaticamente na Internet),
o Domino.doc (sistema de gestão eletrônica de documentos e
teses), o QuickPlace (software
para trabalhos compartilhados
entre grupos de pessoas), o
SmartSuite, o Sametime (software para conversas em tempo
real) e o LearninSpace (software de educação à distância).
A UFMG adquiriu o sistema,
mas o MEC continuou amarrado ao contrato com a TBA.
Até hoje, não houve resposta às
propostas da Lotus e da Sun.
Duas providências se fazem
necessárias, para resolver esse
imbróglio:
1) intervenção pessoal do ministro Paulo Renato, chamando a si a análise do caso e apreciando não apenas a proposta
da Lotus, mas a da Sun -o sistema Linux-StarOffice, de graça. E também analisando as
razões que levaram o MEC a
proporcionar o monopólio das
vendas de software ao sistema
TBA-Microsoft;
2) aceleração dos estudos visando a padronização de uma
política de aquisição de softwares, para impedir essas excrescências de, num país pobre,
gastar tal volume de dinheiro
na compra de sistemas, quando existem similares muito
mais baratos.
Os aplicativos
O Office é um conjunto de
softwares, representado pela
planilha eletrônica Excel, processador de texto Word, banco
de dados Acess, software de
apresentação PowerPoint, específico para automação de escritórios. O sistema, adquirido
para alunos da rede pública, é
o mesmo utilizado por altos
executivos financeiros. Os alunos provavelmente não utilizarão 5% desse potencial. O
SmartSuite, da Lotus, e o StarOffice, da Sun (este, software
aberto e gratuito), têm as mesmas ferramentas. Em geral
conseguem trabalhar com arquivos da Microsoft, permitindo a quem escreve em Word,
por exemplo, continuar o trabalho em WordPro (o Word
da Lotus) ou no StarOffice.
Por baixo desses aplicativos,
tem o sistema operacional, o
coração dos microcomputadores. O da Microsoft é o Windows NT (próprio para redes)
ou o Windows -para computadores pessoais. O sistema
concorrente é o Linux, aberto e
gratuito, que está sendo adotado pela maioria das instituições superiores.
Já aplicativos como o Notes
servem para automatizar escritórios. São líderes da área. O
concorrente da Microsoft é o
Exchange.
A proposta de compra não
passou pelo ministro Paulo Renato, que não sabia do acordo
geral firmado com a TBA. O
ministro incumbiu o secretário
Patrício de esclarecer a Folha.
Segundo suas explicações, para conseguir as vantagens proporcionadas pela TBA, o MEC
teve que assegurar a ela exclusividade nas compras do Office. Ora, além de não ter havido
licitação, o preço obtido pelo
MEC (e oferecido às universidades) é de R$ 150 por unidade, quase o mesmo valor oferecido aos professores para compras individuais. E seria caro
mesmo se tivesse pago os R$ 60
por Office, que Valente assegura constar do contrato com a
TBA.
Licença
O colunista Luís Nassif solicitou licença da coluna por 45
dias, mas continuará escrevendo eventualmente no período,
sempre que tiver um tema relevante.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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