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São Paulo, quinta-feira, 24 de abril de 2003

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LUÍS NASSIF

O tiro da Conceição

Em sua coluna de ontem, Clóvis Rossi entendeu corretamente que os ataques da economista Maria da Conceição Tavares a Marcos Lisboa, assessor de Antonio Palocci Filho, no fundo disfarçavam a gana da professora contra o próprio cerne da política econômica.
O discurso da Fazenda, da manutenção dos dois objetivos únicos -obtenção de superávits fiscais cada vez maiores e combate à inflação-, só tem uma diferença em relação ao governo Fernando Henrique Cardoso. Como as consequências de decisões econômicas levam tempo para aparecer, no início do jogo era a palavra de um lado contra o outro, com a discussão sendo arbitrada por uma mídia incapaz de diferenciar o peso intelectual de um Delfim Netto ou José Serra do de um Mailson da Nóbrega ou Gustavo Franco.
Agora já se tem a resposta para a polêmica: o desastre consumado que estagnou a economia brasileira e quase a levou para o fundo no ano passado. A chamada "herança FHC" que os líderes petistas vêm apregoando, corretamente.
Por tudo isso, a maneira como está sendo tratada a questão cambial -permitindo a apreciação do real e a volta do fluxo dos capitais de curto prazo- pelo ministro Palocci e pelo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles -alegando que o nível do câmbio não interessa ao governo-, equivale à sapiência do pensamento de Pedro Malan elevada ao quadrado. Malan tinha a característica de não prever adequadamente o futuro; Palocci e Meirelles, a incapacidade de ler o passado.

Indicadores sociais
Quanto ao tema dos indicadores sociais, a professora exorbitou nas críticas, especialmente nos deploráveis ataques pessoais. Mas seus receios têm razão de ser. Critica-se muito a vinculação orçamentária. Se não houvesse, nos últimos anos a maior parte dos recursos para saúde e educação teria sido utilizada para ampliar a margem de endividamento irresponsável do governo. Mas o país tem que dispor de indicadores e de foco nas ações sociais.
Marcos Lisboa é um pesquisador sério. Pertence à geração dos novos especialistas em políticas sociais, que tem no funcionário do Ipea Ricardo Paes de Barros seu guru maior. Essa geração aprendeu a trabalhar com indicadores de avaliação de programas sociais, ponto fundamental para a definição de políticas sociais.
Há que estabelecer critérios de aferição para definir qual a mais eficaz. E também escolher os grupos a serem trabalhados, para evitar a sobreposição de ajuda de diversos planos, assim como a dispersão de recursos.
O estudo produzido pelo Ministério da Fazenda não explicitou, mas os trabalhos de Paes de Barros e Lisboa concluem que programas tipo Bolsa Escola são muito mais eficazes na erradicação da miséria do que programas tipo Fome Zero.
A preocupação da professora -além de poder desabafar contra a política econômica- é que por trás dessa tentativa de focalizar as ações sociais possa se esconder a intenção de desmontar a rede de proteção social que o país armou nos últimos anos -parte relevante, aliás, no governo FHC, não mencionada explicitamente pela professora.
Tem razão nos seus receios? Pelo histórico das políticas públicas, tem. Mas, sem indicador, como trabalhar com eficiência?

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Luisnassif@uol.com.br


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