São Paulo, terça-feira, 24 de setembro de 2002

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OPINIÃO ECONÔMICA

Small is Beautifull

BENJAMIN STEINBRUCH

Quantos empregos adicionais, afinal, são necessários para dar trabalho a toda a população brasileira economicamente ativa? Oito milhões? Dez milhões? Quinze milhões?
A discussão em torno dessas perguntas está na ordem do dia na campanha eleitoral. O candidato José Serra diz que vai criar 8 milhões de empregos em quatro anos de governo, se for eleito. Luiz Inácio Lula da Silva não quer fixar um número, mas garante que pode fazer muito mais nessa área porque tem a palavra "trabalhadores" até no nome do partido.
É muito bom que o debate avance para esse tema. Crescimento econômico e criação de empregos devem ser obsessões para qualquer candidato à Presidência da República. Mas, francamente, é desnecessária essa discussão sobre o número de empregos. O Brasil precisa de milhões e milhões de postos de trabalho, e isso os brasileiros sabem melhor do que qualquer economista, porque sentem o problema na carne há anos.
A discussão que importa, sobre como esses empregos serão criados, não está tendo prioridade. Pensei nisso ao ler nas últimas semanas exemplos de iniciativas tomadas pelo mundo e que seriam úteis para o Brasil neste momento.
Nem sempre precisamos de megainvestimentos para criar empregos. Muitas vezes pequenos negócios são até mais úteis, por ter efeito imediato.
O economista e filósofo inglês E.F. Schumacher escreveu, em 1973, o livro "Small is Beautifull", traduzido para o português com o título "O Negócio é ser Pequeno". Ele achava que os países, principalmente os pobres, deveriam caminhar para desenvolver projetos voltados para as reais necessidades do ser humano, o que implicaria nem sempre adotar as tecnologias mais avançadas e ter como objetivo básico o emprego de grande quantidade de mão-de-obra, e não o aumento da produção por homem-hora.
No mês passado, a revista "BusinessWeek" lembrou que, se Schumacher estivesse vivo, para escrever a sequência de seu trabalho, certamente o chamaria de "Small is Profitable" (o pequeno é lucrativo). Cerca de dois terços da população mundial tem hoje renda de US$ 1.500 ou menos. Nessas condições, as maiores oportunidades de sucesso empresarial concentram-se em focar a produção em itens de preços baixos, de tecnologia intermediária, simples de usar e adequados às tradições das populações dos variados países em desenvolvimento.
Na era da informática e da alta tecnologia, as pesquisas feitas em grandes multinacionais, segundo a revista americana, estão voltadas para desenvolver telefones baratos, computadores simples e uma parafernália de produtos demandados pelo Terceiro Mundo, porque essas empresas descobriram a importância dos mercados de baixa renda.
A reportagem da "BusinessWeek" conta histórias interessantes: uma grande empresa desenvolveu pequenos saquinhos de xampu que custam de US$ 0,02 a US$ 0,04 e com esse produto já fatura US$ 2,4 bilhões por ano na Índia. Outra criou um rádio cuja bateria é carregada por uma manivela e já vendeu 3 milhões de unidades em mercados africanos nos quais não há luz elétrica e a população não tem renda para trocar regularmente as baterias convencionais.
No Brasil, também há pelo menos um caso exemplar. A Facit descobriu que nesses mesmos mercados africanos há uma forte demanda de máquinas de escrever mecânicas, porque falta energia elétrica e a baixa renda da população não permite a compra de computadores. Segundo reportagem do jornal "Valor", a empresa brasileira, dona de uma prestigiosa marca no passado, está superando velhos problemas financeiros por conta das exportações dessas máquinas, que começaram em 1999, com receitas de US$ 50 mil, e neste ano devem atingir US$ 2 milhões.
Casos como esses mostram que a "tecnologia intermediária" de que falava Schumacher, que custa muito menos do que as de grande escala, pode ser colocada a serviço da produção, da exportação e da criação de empregos. Por isso, o debate genérico sobre números de emprego me parece secundário demais para o momento atual da crise brasileira. Muito mais útil é partir para a discussão de soluções práticas que possam abrir postos de trabalho sem exigir, principalmente do setor público, megainvestimentos em um país carente de recursos financeiros.


Benjamin Steinbruch, 49, empresário, é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br


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