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OPINIÃO ECONÔMICA
Um recuo inesperado no Copom
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Confesso a meu leitor que o
ministro Palocci me surpreende com freqüência pelo seu
bom senso e pela capacidade de
lidar com as expectativas do mercado financeiro. A incrível mudança de atitude do Banco Central em relação à meta de inflação
para 2005, e que foi explicitada
na ata da última reunião do Copom, é um exemplo da forma de
agir do nosso ministro da Fazenda. Ele pegou o mercado de surpresa, tirou da frente um obstáculo importante para o sucesso da
política econômica em 2005 e corrigiu um erro incrível cometido
há alguns meses pela direção do
Banco Central.
Além disso, ao anunciar um dia
antes a decisão de buscar para
2004 um superávit fiscal maior do
que o previsto inicialmente, calou
a boca dos setores mais radicais,
que poderiam acusar o governo
de estar amolecendo no combate
à inflação. Uma combinação perfeita de bom senso econômico, coragem política e conhecimento da
psicologia dos operadores dos
mercados financeiros, aqui no
Brasil e no exterior. Como filigrana final dessa manobra, ousada e
correta, aponto a ocorrência de
algumas bravatas em relação ao
combate sem tréguas à inflação
que ele permitiu que os radicais
do BC inserissem no longo texto
produzido pelo Copom e, com isso, pudessem voltar para casa sem
perder a face, como dizem os chineses.
Na minha última coluna, escrita no dia 3, refleti sobre a inviabilidade técnica e operacional da
meta de inflação para o próximo
ano e chamei a atenção para os
custos gratuitos de uma tentativa
infantil de levar à frente esse compromisso. Como eu, a grande
maioria dos analistas de mercado
tinha essa mesma opinião, mas ficávamos sem jeito em externar,
publicamente, essa posição e de
parecer, com isso, complacentes
com a inflação. Agora que esse erro foi reconhecido pelo próprio
Banco Central, ficará mais solto e
racional o debate sobre o sistema
de metas de inflação no Brasil.
A ata do Copom mostra que
existem limites à ação da política
monetária no curto prazo e que o
sistema de metas precisa incorporar mecanismos de transição
quando ocorrerem choques de
preços externos em razão de uma
certa rigidez institucional (inércia) que ainda existe em nossa
economia. Tivemos em 2004 choques de preços importantes e que
devem fazer o IPCA terminar o
ano com um aumento da ordem
de 7,5%. Não foi uma inflação gerada por excesso de moeda na
economia ou provocada por desequilíbrios fiscais irresponsáveis,
mas sim fruto de aumentos localizados nos mercados ligados ao
nosso comércio exterior e pelo rebate inercial da inflação de 2003,
sobre uma cesta importante de
preços públicos e privados, que
são regulados por contratos indexados ao IGP-M.
Passar desse nível de inflação
para algo próximo de 4,5% -que
era o compromisso rasgado na última reunião do Copom-, em
apenas 12 meses e ainda sob o impacto da correção de mais de 11%
sobre os preços atrelados ao IGP-M, era coisa impossível de ser obtida neste mundo de Deus e dos
homens, e isso até as pedras sabiam. Mas só agora o Copom reconhece essa limitação e define
como centro da meta para o próximo ano o número mais viável
de 5,1%. Esse novo valor ainda está abaixo do que considero razoável, principalmente porque o arrasto inercial calculado pelo Banco Central entre 2004 e 2005 não
está corretamente calculado. Ele é
maior!
Mas vamos ser nobres e reconhecer que a nova posição do Copom já reflete uma mudança no
sentido correto e que deve ter custado muitas horas de sono e análise aos diretores do Banco Central. Afinal, não é fácil assumir
um erro dessa magnitude quando
se está no governo e as coisas estão dando certo. Continuo
achando que ao longo dos primeiros meses de 2005 o Copom vai
caminhar no sentido de perseguir
uma inflação da ordem de 6% ao
ano e que a Selic deve ficar próxima de 17% ao ano até o fim do
primeiro semestre.
Com esse nível de inflação, teremos uma redução de 20% em 12
meses, resultado que pode ser
considerado excelente. Isso sem
que se obrigue a economia a entrar em recessão novamente e
sem onerar o Tesouro com gastos
ainda maiores com o pagamento
dos juros.
Fica, entretanto, a lição de que,
apesar de as coisas estarem dando certo, é preciso uma reflexão
mais profunda sobre alguns dos
dogmas da política econômica
atual. O sistema de metas de inflação e a questão do arrasto inercial, que obrigou agora o Copom
a uma capitulação sem muita
glória, era um deles. Mas existem
outros.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 61,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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