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Brasil tem entraves para fundo soberano, dizem economistas
Com excesso de dinheiro em caixa, países criaram fundos para investir em ações, títulos e participação em empresas
Governo discute destinar parcela de recursos das reservas internacionais para investimentos de maior risco e maior rentabilidade
DA REPORTAGEM LOCAL
Motivo de debate dentro do
governo, a proposta de criação
de um fundo soberano -aplicação de parte das reservas internacionais em investimentos de
maior risco e retorno- deve requerer mais tempo para que o
país esteja menos vulnerável,
afirmam economistas.
Com US$ 165,099 bilhões em
caixa, o país é dono hoje da oitava maior reserva internacional
do mundo. As reservas são um
recurso utilizado como espécie
de seguro contra crises externas, mas que tem como efeito
colateral o baixo rendimento, já
que a maior parte está aplicada
em títulos dos EUA, que rendem por volta de 4,5% ao ano.
Como China, Cingapura,
Emirados Árabes e Arábia Saudita, o Brasil também discute a
melhor forma de usar esse dinheiro. A solução adotada por
esses países foi criar um fundo
de investimento (chamado soberano) com parte do dinheiro
que iria para as reservas. A China, por exemplo, aplica US$
300 bilhões em ações, além de
ter participações em bancos e
em empresas pelo mundo.
O governo brasileiro debate
quanto de dinheiro levar para
um fundo de risco, em quais
empresas e papéis aplicar, como e quem vai gerenciar os investimentos e quando aplicar
parte dessas reservas.
A proposta divide economistas dentro e fora do governo.
Mas há um ponto com o qual a
maioria dos especialistas concorda: a implementação de um
fundo soberano não deve acontecer tão rápido, pelo menos
não antes de o país receber o
chamado grau de investimento,
selo de bom pagador, quando
em tese o Brasil estaria menos
vulnerável a turbulências. A
previsão do governo é que essa
nova "nota", dada por agências
de classificação, saia em 2008.
Para Vitoria Saddi, economista-sênior para a América
Latina da consultoria americana RGE Monitor, o Brasil teria
pouco a ganhar com essa proposta de fundo soberano. Para
ela, os maiores beneficiados são
países dependentes de uma
commodity em particular, como Chile e Noruega, que produzem principalmente cobre e
petróleo, respectivamente.
Ela explica que esses países
utilizam fundos soberanos para
receber fora do país recursos
obtidos com a exportação, para
evitar a entrada de capital e impedir a apreciação de suas moedas. "Mas, se você colocar uma
parte das reservas em fundos
no exterior e houver uma diminuição das exportações, o país
terá de usá-las [rapidamente], e
o fundo inviabiliza isso", disse.
Infra-estrutura
O ministro Guido Mantega
(Fazenda) chegou a aventar a
possibilidade de parte dos recursos do fundo soberano ser
aplicada em infra-estrutura
-idéia rechaçada por setores
mais conservadores da área
econômica do governo, que só
aceitam a criação de um fundo
de risco maior para elevar a
rentabilidade das reservas.
Alexandre Schwartsman, ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, afirma que a discussão caminha com "foco desviado e para o lado errado". "Para que servem
as reservas? É um seguro. Seria
útil no Brasil contra um colapso no preço das commodities,
uma desaceleração na economia mundial. Qual a proteção
se esse dinheiro for parar em
empresas brasileiras que serão
prejudicadas em caso de crise?"
Para o economista Fernando
Cardim, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro),
no entanto, a proposta de Mantega de destinar cerca de 5%
das reservas para infra-estrutura preserva a função de blindar o país contra crises. "Se o
dinheiro vai ficar parado, que
financie o desenvolvimento. Os
países que adotam esses fundos
já fazem isso e assumem riscos
maiores. Se fosse um percentual maior, seria uma loucura."
O ex-diretor do BC diz que a
criação de um fundo soberano
seria justificada para dar mais
rentabilidade às reservas. Para
ele, um modelo seria admitir
uma porcentagem das reservas
em ativos de maior risco. "Hoje
as reservas estão restritas a títulos AAA [classificação para
papéis de risco próximo de zero]. Teria de se admitir uma
parcela, talvez de 15%, para AA
e A [ainda de baixíssimo risco,
mas inferiores ao AAA]."
Transparência
Outra discussão apontada
por analistas é a regulamentação desses fundos soberanos.
Caso um deles decida vender
parte de seus ativos, pode levar
a queda de preços, afirmam. "Se
a China vender títulos dos
EUA, pode aumentar significativamente o déficit público
americano. Os EUA têm medo
dos fundos soberanos porque
falta transparência a eles", afirma Saddi, da RGE.
Para o economista José Luiz
Rossi, professor de finanças internacionais do Ibmec-SP, é cedo para o Brasil discutir a criação de seu fundo soberano. "Há
uma pressão para se buscar um
nível melhor de rentabilidade,
mas temos inúmeras perguntas
sem resposta", diz.
Rossi afirma que uma opção
de gestão para um fundo soberano seria abrir uma concorrência internacional em que
vencesse o banco que garantisse melhor rendimento, com o
menor risco e a taxa mais baixa
de administração.
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