São Paulo, domingo, 25 de janeiro de 2004

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COPOM

Presidente do BC, Henrique Meirelles, opta por não mexer nos juros após empresários pleitearem aumento de preços

Pressão por reajuste pesa na decisão do BC

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A surpreendente decisão do Banco Central, na semana que passou, de manter a taxa básica de juros em 16,5% ao ano foi uma retaliação do governo à pressão dos empresários por reajuste de preços. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu o aval, numa demonstração do cacife do presidente do BC, Henrique Meirelles, perante a cúpula do governo.
Lula não discutiu a retaliação em detalhes com Meirelles. Tampouco o fez o ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, que já admitiu dialogar com Meirelles sobre politica monetária.
A decisão de não mudar uma vírgula na Selic, não a reduzindo pela primeira vez desde junho do ano passado, foi do Copom (Comitê de Política Monetária).
A Folha apurou que Lula, Palocci e Meirelles ficaram contrariados ao saber de um levantamento da FGV (Fundação Getúlio Vargas) apontando que diversos setores da indústria, como o de aço, de embalagens plásticas e de papelão, pleiteavam aumento de preço de até 18% em janeiro.
Imediatamente, Lula lembrou de uma previsão que Meirelles fizera em 4 de outubro, na casa de Palocci, que fazia aniversário de 43 anos. Numa conversa informal, quando Lula, Palocci e Meirelles discutiam qual deveria ser o ritmo da queda dos juros, o presidente do Banco Central manifestou um temor. Meirelles afirmou que essa trajetória devia ser cautelosa para evitar um repique inflacionário com reajuste de preços na virada de 2003 para 2004.
Meirelles chegou a dizer que os empresários poderiam olhar a inflação passada, remarcar preços e atrapalhar o esforço do governo para baixar os juros e reaquecer a economia. Na hora, Lula sugeriu que Palocci fizesse um pronunciamento em cadeia de rádio e TV repetindo um apelo para que os empresários não aumentassem preços na virada de ano, mas o vazamento da informação levou Palocci a desistir do pronunciamento público e a optar por encontros reservados, nos quais fez o apelo.
Ao saber do levantamento da FGV neste início de ano, Lula se julgou traído pelos empresários e, segundo disse à Folha um auxiliar direto de Lula, o presidente avaliou que Meirelles tinha razão.
O presidente afirmou a interlocutores, segundo a Folha apurou, que os empresários eram os primeiros a pressionar por queda dos juros e os primeiros a aproveitar ocasiões para remarcar preços e pressionar a inflação.
Foi nesse contexto que Meirelles, após discutir com o presidente e Palocci os riscos de um repique inflacionário, articulou a manutenção da Selic. Um auxiliar de Lula, ao ouvir essa notícia na quarta-feira, avaliou que a decisão daria o que falar, mas que, com esses empresários, não haveria outro jeito.
Apesar da decisão conservadora da semana passada, Meirelles passou a ser visto pelo presidente Lula como alguém à esquerda da equipe de Palocci na Fazenda. Em todas as reuniões recentes nas quais justificou o rigor fiscal e monetário de seu primeiro ano de governo, Lula fez questão de dizer que julgava "consistentes" os argumentos de Meirelles para manter a cautela no ritmo da queda de juros. Mais: Lula está incomodado com dois auxiliares de Palocci, que considera, segundo expressão ouvida pela Folha no Palácio do Planalto, "um freio de mão" para a retomada do crescimento.
São esses auxiliares o secretário do Tesouro, Joaquim Levy, e o secretário de Política Econômica da Fazenda, Marcos Lisboa. Petistas ligados ao ministro José Dirceu (Casa Civil) jogam nos bastidores para tentar minar Levy e Lisboa. Palocci, porém, mantém firme apoio a eles. O ministro da Fazenda, que freqüentemente é elogiado por Lula, tem conseguido protegê-los desse "fogo amigo".



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