|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Falência pessoal deve superar recorde
CÍNTIA CARDOSO
DE NOVA YORK
O número de pedidos de falências pessoais deve superar neste
ano o recorde de 1,64 milhão de
2003. Esses indicadores parecem
mostrar que os benefícios da recuperação da economia americana ainda não atingiram a classe
média e os assalariados com rendimentos mais baixos. A projeção
do número de falências parte da
consultoria Global Insight e encontra respaldo em outros centros de estudos, como o Instituto
Americano de Falência.
Hoje, estima-se que 90% das
pessoas que entram com um pedido de falência pessoal tenham
um rendimento anual médio entre US$ 25 mil e US$ 99 mil. Esse
contingente de americanos falidos se expande desde 2001, ano da
recessão iniciada após o estouro
da bolha do mercado de ações nos
EUA. O que preocupa os economistas, porém, é o fato de a massa
de endividados aumentar num
momento em que o cenário econômico americano apresenta elevadas taxas de crescimento do
PIB e uma taxa básica de juros
baixa (1%). Caso o Fed decida elevar esse índice, o número de endividados pode crescer ainda mais.
"É evidente que a economia não
cresce num ritmo rápido o suficiente para atingir essas pessoas.
O nível de geração de empregos é
muito baixo", disse Mark Lauritano, economista da Global Insight.
Em dezembro, foram abertos
apenas mil postos de emprego
nos EUA ante um total de 8,4 milhões de desempregados no país.
Muleta de crédito
O vilão do endividamento americano é o cartão de crédito. Analistas afirmam que o instrumento
tem sido usado como uma muleta
para completar a renda ou para
substituir o salário em caso de desemprego.
O resultado é que o valor médio
das faturas supera US$ 6.000, segundo o Fed. Por ano, a taxa média de juros cobrada pelas administradoras de cartão beira 15%.
A armadilha do cartão de crédito levou o ex-bancário Donald
Marshall, 60, a pedir falência pessoal baseado no capítulo 7 do Código de Falências dos EUA.
Com uma dívida acumulada de
US$ 50 mil, Marshall se viu obrigado a recorrer à Justiça. "Eu pagava o aluguel, a hipoteca de uma
outra casa e comecei a atrasar o
pagamento dos cartões. Foi uma
bola de neve", conta.
O processo já foi encerrado e a
dívida total de Marshall, perdoada. Hoje, o ex-bancário afirma ter
dois cartões de crédito, mas usa
apenas um.
Armadilha
A explicação mais óbvia para o
aumento de falências e de endividamento seria acreditar que os
americanos estão gastando com
supérfluos. A co-autora do livro
"Two-Income Trap" (algo em
português como "a armadilha dos
dois salários"), Elizabeth Warren,
argumenta que ocorre o contrário. Atualmente, diz, uma família
americana com quatro pessoas
gasta 21% a menos com roupas e
22% a menos com alimentação do
que há uma geração.
Warren, que também é professora de Direito da Universidade
Harvard, diz ainda no seu trabalho que duas fontes de renda
-do marido e da mulher- não
têm sido suficientes para um padrão de vida "folgado".
A autora afirma que, na maioria
dos casos estudados, o salário inteiro de um dos membros do casal
cobre o pagamento da moradia e
o outro, todas as demais despesas.
Alexandre Bort, da Consolidated Credit Counseling, empresa
de aconselhamento financeiro,
aponta uma outra razão. "Falta
educação financeira", afirmou.
Os percalços financeiros dos
americanos têm preocupado os
economistas. O motivo é que o
consumo representa dois terços
da atividade econômica do país. A
cifra chega a US$ 7,5 trilhões por
ano. "Por enquanto, essa situação
[número crescente de falências e
endividamento alto] não vai atrapalhar a recuperação da economia. Esperamos o aumento dos
investimentos das empresas neste
ano, o que deve gerar mais empregos", diz Lauritano.
Texto Anterior: Muito além do PIB: Dívida de americanos atinge US$ 2 trilhões Próximo Texto: Solução pode ser perdão ou plano de pagamento Índice
|