São Paulo, quarta-feira, 25 de abril de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

"Harmonia"

Popular com a economia e com distributivismo social, governo Lula faz campanha a fim de pacificar oposição

"HARMONIA" E variantes do velho clichê "oposição responsável" (isto é, sem alternativas) são as expressões políticas da hora. Emanam dos discursos do presidente, dos cafezinhos da oposição no Planalto e são o efeito prático das conversas ainda obscuras entre governo e PSDB a respeito de mudanças nas regras da eleição para presidente em 2010.
É evidente a origem da "distensão", para recorrer a outro velho lugar-comum político. Para o que restou da oposição, está difícil sangrar o governo e oferecê-lo às piranhas.
No que diz respeito à paz social dos cemitérios floridos por uma gorjeta de distribuição de renda, a aliança na prática dos programas de fato de PSDB e PT por ora pacificou o povaréu. Abertura econômica, inflação baixa, iniciativas tucanas adotadas pelo lulismo, e o distributivismo de Lula são alguns dos principais esteios do prestígio do presidente.
A ruína moral do PT e o blocão governista no Congresso permitiram ao presidente exilar seu partido na periferia do governo. Como de resto o blocão lulista no Congresso ora não tem candidatos, há um vácuo de perspectivas políticas no governismo. O fato de Lula não ser candidato em 2010 permite às candidaturas precoces do PSDB se aproximarem do presidente tanto quanto for do interesse particular mútuo -os partidos são legenda de conveniência.
Em início de governo, interessa mais a governadores, prefeitos e suas bancadas no Congresso negociar bocados de fundos públicos. Isto é, financiar seus projetos políticos. Foi o que se viu na marcha dos prefeitos, quando Lula ofereceu um naco da receita federal às cidades.
Os governadores tratam de federalismo eleitoral. Reivindicam, na base do "se rolar, rolou", parte da CPMF e da Cide. Do dinheiro que perderam com isenção fiscal de exportações (Lei Kandir). Dos recursos do fundo da educação (Fundeb), que tendem a perder para os municípios ou para o governo federal. Querem desviar-se de obrigações constitucionais e legais que engessam parte de seu orçamento, como o faz o governo federal.
Mas pelo jeito se contentariam mesmo em modificar (ou dar um jeito) nas leis e normas da renegociação fernandina das dívidas estaduais, a fim de aumentar seu nível de investimento e endividamento.
Mesmo isso é problema grande, pois implica, de maneira indireta, perda de arrecadação federal e fornece bala demais para os governadores, o paulista em particular.
A "distensão" parece tratar-se, pois, de uma redisposição das tropas no terreno, de acumulação de recursos para a batalha que viria daqui a dois anos, mais ou menos, quando recomeçariam as campanhas presidenciais. A dúvida maior fica ainda na política: como dar-se-á a campanha das prefeituras, dado o presente ambiente "harmônico"?
Parece que os jogadores políticos fazem um pacto calculado e provisório. Mas o cálculo das probabilidades é uma pilhéria, na política ou na tuberculose, como diria Manuel Bandeira. Pode ser tolo acreditar que a reignição da atividade política, de oposição ou da campanha governista de 2010, vai se dar sem mais em 2009, como se então não tivesse sido assentada a predominância política de Lula.


vinit@uol.com.br

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